Movimento revolucionário também chamado Coluna Miguel Costa-Prestes, que, sob a liderança dos “tenentes” Miguel Costa e Luís Carlos Prestes, empreendeu longa marcha por vários estados do país entre abril de 1925 e fevereiro de 1927.

 

ANTECEDENTES

O ano de 1922 foi marcado por alguns acontecimentos cujas consequências determinaram mudanças significativas na história política brasileira. As eleições para a sucessão do presidente da República, Epitácio Pessoa, marcadas para março, provocaram a abertura de uma crise política, na medida em que desencadearam uma acirrada disputa entre dois grupos e aguçaram as divergências internas das oligarquias. De um lado, colocou-se o candidato da situação, Artur Bernardes, presidente de Minas Gerais, que tinha o apoio de São Paulo. De outro, formou-se a Reação Republicana, que lançou a candidatura do fluminense Nilo Peçanha e foi integrada, além do estado do Rio de Janeiro, por Rio Grande do Sul, Bahia e Pernambuco, estados não produtores de café.

O episódio das “cartas falsas” publicadas pelo Correio da Manhã em 1921, insultuosas ao Exército e atribuídas a Bernardes, foi importante para incompatibilizar o candidato mineiro com as forças armadas. Após a vitória de Bernardes na eleição presidencial, abriu-se um período de contestação que culminou, em julho de 1922, com os levantes do forte de Copacabana, da Escola Militar de Realengo, de algumas guarnições de Niterói e de Mato Grosso. Foram os primeiros movimentos armados desencadeados pelos “tenentes”, nome com que ficaram conhecidos os oficiais revolucionários da época, nem todos verdadeiros tenentes, mas em sua grande maioria oficiais de baixa patente.

Já no governo Bernardes (1922-1926), em 5 de julho de 1924, para comemorar os levantes de 1922, teve início em São Paulo nova revolta tenentista, que funcionou como foco irradiador de outros levantes: os de Mato Grosso (12/7/1924), de Sergipe (13/7/19024), do Amazonas (23/7/1924), do Pará (26/7/1924), e a revolução do Rio Grande do Sul (29/10/1924). O objetivo do movimento tenentista era a derrubada de Bernardes. Os revoltosos falavam em nome dos “interesses nacionais” e tinham como programa político o voto secreto, o combate à corrupção administrativa e à fraude eleitoral, a verdadeira representação política, a liberdade de imprensa e de pensamento, a limitação das atribuições do Poder Executivo e o restabelecimento do equilíbrio dos poderes.

Em São Paulo, sob o comando do general Isidoro Dias Lopes e do major da Força Pública Miguel Costa, os rebeldes ocuparam a capital por três semanas no mês de julho até que, pressionados pela ação conjunta das forças policiais de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, foram obrigados a deixar a cidade. Conseguiram chegar a Mato Grosso e daí, perseguidos pelas forças legalistas, foram obrigados a atravessar o alto Paraná. Ocuparam Guaíra (PR), depois de sofrer várias perdas nos combates travados com as tropas governistas, e no início de outubro chegaram a Foz do Iguaçu, que se tornou a sede do estado-maior revolucionário.

No Rio Grande do Sul, além do Batalhão Ferroviário comandado por Luís Carlos Prestes em Santo Ângelo, sublevaram-se o batalhão de São Borja, liderado pelo tenente Siqueira Campos, o 3º Grupo de Artilharia a Cavalo (3º GAC), de Alegrete, sob a liderança dos tenentes João Alberto Lins de Barros e Renato da Cunha Melo, e o 3º Batalhão de Engenharia, de Cachoeira do Sul, tendo à frente o capitão Fernando Távora. Levantaram-se ainda o 3º Regimento de Cavalaria Independente (3º RCI) de São Luís Gonzaga, sob o comando do tenente João Pedro Gay, e o 5º RCI de Uruguaina, sob o comando do capitão Juarez Távora. Os revoltosos contaram também com o apoio das forças irregulares de velhos caudilhos, como Honório Lemes, Zeca Neto, Leonel Rocha e Júlio Barrios.

Com o prosseguimento da luta, Prestes assumiu o comando da coluna constituída pelo 2º e 3º regimentos de Cavalaria, o 1º Batalhão Ferroviário e revolucionários civis. Permaneceu na região missionária durante dois meses, enfrentando as tropas legalistas compostas, segundo Hélio Silva, por cerca de dez mil homens, e marchou em seguida para a colônia militar do rio Uruguai com cerca de dois mil homens mal armados e deficientemente municiados. Por seu lado, as colunas de Honório Lemes e Zeca Neto, que se reuniram após uma série de combates, internaram-se no Uruguai, o mesmo fazendo Júlio Barrios em dezembro.

 

A FORMAÇÃO DA COLUNA

Os revolucionários que lutavam no Sul foram-se reunindo em São Luís Gonzaga (RS) em torno de Prestes, considerado por Cordeiro de Farias, Juarez Távora, Siqueira Campos, João Alberto e Ari Salgado Freire como o mais apto a liderar a revolução. Em São Luís, esse grupo analisou as opções que se lhe apresentavam para continuar a luta. Deveriam de início tentar receber armas e munições de Isidoro Dias Lopes, que continuava controlando a situação na região de Foz do Iguaçu. Caso isso fosse possível, os revolucionários prosseguiriam os combates no Rio Grande do Sul. Uma outra possibilidade, se a primeira não fosse viável, seria marcharem rumo ao norte para tentar invadir Santa Catarina. Diante dessas opções, o grupo resolveu enviar um emissário a Isidoro para consultá-lo. Em resposta, o líder da rebelião em São Paulo informou que seus estoques de armas e munições eram pequenos e que o grupo deveria marchar para o norte. Nesse momento, a coluna gaúcha, sob a chefia de Prestes, decidiu ir ao encontro de Isidoro.

Em 27 de dezembro de 1924, o núcleo inicial daquela que seria mais tarde denominada Coluna Prestes abandonou São Luís. Os oficiais comandantes eram os seguintes: major Mário Portela Fagundes (1º Batalhão Ferroviário), substituído após sua morte pelo “major” Osvaldo Cordeiro de Farias; “major” João Alberto (2º Regimento de Cavalaria); “major” João Pedro Gay (3º Regimento de Cavalaria), depois substituído pelo “major” Siqueira Campos. Ao marcharem ao encontro da divisão de São Paulo, as tropas gaúchas atravessaram o rio Uruguai na foz do rio Anta. No local chamado Queimados, perto de Barracão (SC), Prestes empossou Siqueira Campos no comando do 3º Destacamento, enquanto o major João Pedro Gay era destituído por haver argumentado com a inutilidade da revolução, tentando convencer os soldados de seu destacamento a emigrarem.

A coluna gaúcha chegou a Barracão reduzida a oitocentos homens. O coronel Fidêncio de Melo, fazendeiro do Contestado, prometera ao general Isidoro colaborar, mas na prática isso não ocorreu, e os rebeldes passaram por um momento difícil. Enfrentaram as tropas do general Paim e organizaram a defesa de Maria Preta (SC), onde Cordeiro de Farias, com apenas 70 homens do Batalhão Ferroviário, combateu os dois mil homens chefiados por Claudino Nunes Pereira. Lutando contra as forças do general Paim e de Claudino Nunes, Prestes não só abandonou Maria Preta em completa ordem, como também conseguiu enganar os dois adversários e lançá-los um contra o outro. Em seguida uniu suas tropas às do coronel Fidêncio de Melo, abriu uma picada no terreno sem estradas e partiu para a região do Iguaçu, onde estavam as forças de Isidoro e Miguel Costa. Durante esse período de combates, suas qualidades militares e de liderança foram-se afirmando perante seus companheiros. Segundo seu próprio depoimento, essa experiência levou-o a pensar em transformar a guerra de trincheiras, que lhe fora ensinada na Escola Militar, em guerra de movimento.

Em abril de 1925, no Paraná, a vanguarda dos revoltosos gaúchos fez junção com a divisão de São Paulo no cruzamento das estradas de Benjamim com Santa Helena. No dia 12 desse mesmo mês deu-se a conferência entre Isidoro, Prestes e Bernardo Padilha, da qual participaram, entre outros, o coronel Mendes Teixeira e os majores Álvaro Dutra, Delmont e Asdrúbal Gwyer de Azevedo. No encontro ficou acertado um novo plano de campanha e foi também decidido que o general Isidoro partiria para a Argentina, seguido dos oficiais paulistas que o quisessem acompanhar, para organizar uma rede de auxílio externo ao movimento. Entre os oficiais que seguiram para o exílio na Argentina figurava o tenente Filinto Müller. A 1ª Divisão Revolucionária, sob o comando geral do “general-de-brigada” (as patentes tinham caráter revolucionário) Miguel Costa, ficou organizada em duas grandes unidades: a Brigada Rio Grande, comandada por Prestes, com cerca de oitocentos homens, e a Brigada São Paulo, comandada pelo tenente-coronel Juarez Távora, com cerca de setecentos homens.

A brigada de Prestes, que contava em seu estado-maior com o major Paulo Kruger, o capitão Ítalo Landucci e os primeiros-tenentes Sadi Vale Machado e Nicácio Costa, ajudantes de ordens, era formada pelos 1º, 2º e 3º destacamentos, comandados respectivamente pelos tenentes-coronéis Osvaldo Cordeiro de Farias, João Alberto Lins de Barros e Antônio de Siqueira Campos, e por um corpo auxiliar, o 1º Esquadrão de Cavalaria Independente, comandado pelo capitão Ari Salgado Freire. A Brigada São Paulo era composta pelo 2º Batalhão de Caçadores (2º BC), sob as ordens do major Mário Alves Lira; pelo 3º BC, chefiado pelo major Mário Virgílio dos Santos; pelo Batalhão de Artilharia Montada, sob o comando do capitão Henrique Ricardo Holl; e pelo 2º Esquadrão de Cavalaria Independente, liderado pelo capitão Jorge Danton.

Estava formada a Coluna Miguel Costa-Prestes, ou simplesmente Coluna Prestes, que nos dois anos seguintes iria percorrer o país divulgando seus ideais revolucionários.

 

A MARCHA

Iniciada a marcha, em 29 de abril de 1925 a coluna terminou a travessia do rio Paraná, invadiu o Paraguai e marchou em direção a Mato Grosso (atual Mato Grosso do Sul). A vanguarda na invasão de Mato Grosso era o destacamento João Alberto, que se juntou ao destacamento Siqueira Campos para tomar a cidade de Ponta Porã, que fora abandonada pela guarnição local e invadida pelos paraguaios da cidade vizinha. Por outro lado, as forças legalistas do coronel Péricles de Albuquerque, que se retiraram da cidade, foram engrossadas pelas tropas procedentes de Campo Grande, sob o comando do major Bertoldo Klinger. Siqueira Campos e João Alberto atacaram Klinger na cabeceira do rio Apa, obrigando-o a se retirar em direção a Campo Grande. Os dois destacamentos encontraram-se com o resto da coluna perto da estação do Rio Pardo, da estrada de ferro Noroeste. Em 16 de maio a coluna estava novamente reunida e continuou sua marcha através de Mato Grosso.

Em 10 de junho, num lugar chamado Deserto de Camapuã, a coluna sofreu nova estruturação, uma vez que, durante a campanha de Mato Grosso, surgiram divergências entre seus integrantes. A divisão em duas brigadas, Rio Grande e São Paulo, criara constantes atritos entre os dois chefes, Miguel Costa e Prestes, sobre a maneira como devia ser conduzida a campanha. Na entrada de Mato Grosso, Miguel Costa pretendia sustentar um combate decisivo, mas a opinião que prevaleceu foi a de Prestes, o qual alegou que, em vista da diminuta munição de que dispunham, seria impossível uma vitória. Coube-lhe então a reorganização da coluna, que continuaria sob o comando de Miguel Costa, mas passaria a contar com um estado-maior chefiado por ele, Prestes, tendo Juarez Távora como subchefe e Lourenço Moreira Lima como secretário. Cordeiro de Farias, João Alberto e Siqueira Campos continuaram no comando dos 1º, 2º e 3º destacamentos, e criou-se ainda um 4º destacamento, sob o comando de Djalma Dutra. Os soldados gaúchos e paulistas foram distribuídos igualmente entre os quatro destacamentos.

Com essa nova organização e estratégia, a coluna invadiu Goiás e, sempre combatendo as forças de Klinger e a polícia goiana, galgou a serra do Paranã, entrou em Minas Gerais e ocupou São João do Pinduca. Em 7 de setembro os revolucionários voltaram a Goiás e começaram a marchar em direção ao norte do estado (atual estado de Tocantins). Entraram no Maranhão e aí ocuparam em novembro a cidade de Santo Antônio das Balsas. O destacamento Siqueira Campos, com o qual marchava Juarez, ocupou a vila de Passagem Franca, às margens do rio Parnaíba, sendo dali encarregado de cortar as ligações entre Nova Iorque e Barão de Grajaú, no Maranhão, e Teresina, no Piauí. A partir de 28 de dezembro as forças de Juarez atacaram Teresina, enquanto as de Prestes investiram contra Flores, no Maranhão. No dia 31 de dezembro, Prestes enviou Cordeiro de Farias para combinar com Juarez Távora e Miguel Costa o abandono do cerco de Teresina e Flores, bem como o início da marcha para o leste em direção a Pernambuco. Nesse mesmo dia Juarez foi feito prisioneiro quando fazia um reconhecimento nas margens do Parnaíba, entre Areias e Caieiras, no Maranhão.

A coluna reuniu-se na fazenda Cantinho e daí marchou para Pernambuco em 10 de janeiro de 1926. Sempre combatendo, atravessou o Piauí, o Ceará, o Rio Grande do Norte e a Paraíba, até que, em 12 de fevereiro, o grosso da tropa rebelde entrou em Pernambuco. Nessa travessia registrou-se um sangrento combate em Piancó, na Paraíba, onde Cordeiro de Farias e seus soldados obtiveram uma grande vitória. Foi também durante esse percurso que, sob o comando de Prestes, se realizou uma das manobras militares que alcançaram na época enorme repercussão. A operação ocorreu quando três colunas governistas, compostas de 15 mil homens, tentaram cercar a coluna acampada na fazenda Buenos Aires, num contraforte da serra Negra. Prestes esperava ali o resultado da revolta liderada por Cleto Campelo, que deveria eclodir em Recife, mas fracassara. As tropas legalistas cercaram a coluna no dia 22 de fevereiro. Prestes fez então uma volta sobre si mesmo de 23 léguas, evoluindo em marcha forçada através da caatinga, abrindo picadas, andando dia e noite, enquanto as forças do governo continuavam garantindo o cerco à fazenda Buenos Aires. A marcha de Prestes descreveu um arco que saía do rio São Francisco, atravessando o sertão rumo à Bahia. Essa manobra ficou conhecida como “laço húngaro”, pois o trajeto percorrido se assemelhava ao laço assim chamado, que servia de ornamento ao uniforme do Exército.

Ainda em fevereiro de 1926, Prestes e Miguel Costa redigiram uma declaração de princípios da coluna, para ser distribuída à nação. Nesse manifesto, intitulado Motivos e ideais da revolução, seus integrantes se colocavam contra “os impostos exorbitantes, desonestidade administrativa, falta de justiça, mentira do voto, amordaçamento da imprensa, perseguições políticas, desrespeito à autonomia dos estados, falta de legislação social, reforma da Constituição sob o estado de sítio”. Propunham ainda “assegurar o regime da Constituição de 24 de fevereiro [de 1891]; estabelecer ensino primário gratuito e ensino profissionalizante e técnico em todo o país; assegurar a liberdade de pensamento; unificar a Justiça, colocando-a sob a égide do Supremo Tribunal Federal; unificar o regime eleitoral e estabelecer o voto secreto e obrigatório; unificar o fisco; assegurar a liberdade municipal; castigar os defraudadores do patrimônio do povo; acabar com a anomalia de um tesouro público endividado, enquanto os políticos profissionais enriquecem; rigorosa economia dos dinheiros públicos e auxílio eficiente às forças econômicas do país”.

De fevereiro a 3 de julho os revolucionários percorreram a Bahia, entraram em Minas Gerais e voltaram ao território baiano, sendo mal recebidos por parte da população e enfrentando, além das tropas do governo e da polícia estadual, os cangaceiros e jagunços que passaram a combatê-los sob a chefia de Horácio de Matos, Franklin de Albuquerque e Abílio Wolney. Em julho, em território pernambucano, a coluna ocupou os municípios de Murici e Ouricuri. Sempre combatendo, entrou no Piauí e, em 20 de agosto, já em Goiás, armou uma emboscada na fazenda Piauí para as tropas do governo.

 

O ENCERRAMENTO DA MARCHA

Em 15 de outubro os revoltosos entraram no estado de Mato Grosso acampando nas proximidades de Coxim. Foi decidido que a marcha seria encerrada e que eles emigrariam para a Bolívia. A decisão de pôr fim à marcha foi tomada por várias razões, uma das quais ligada ao fim do governo de Artur Bernardes, que seria substituído em novembro por Washington Luís. Ainda segundo Prestes, a decisão se deveu à compreensão, por parte dos comandantes revolucionários, da “inutilidade de nossos esforços [...] começamos a dar-nos conta de que as consequências da luta que sustentávamos golpeavam a parte mais pobre da população, pois atrás da coluna vinham as forças do governo, capazes de todas as violências e arbitrariedades [...] Além disso, por falta de um objetivo político claro, no seio da coluna começaram a aparecer sintomas de degeneração, o que poderia conduzir muitos dos seus componentes ao banditismo”.

Prestes e Miguel Costa não quiseram tomar sozinhos a decisão de pôr fim à luta e enviaram emissários a Isidoro e a Assis Brasil, solicitando-lhes instruções para agir. Foram enviados o capitão Lourenço Moreira Lima, secretário da coluna, e Djalma Dutra, escoltados pelo destacamento comandado por Siqueira Campos. Em 24 de outubro a coluna se dividiu: Siqueira Campos partiu com 80 homens em direção a Campo Grande e o restante — cerca de 620 homens — rumou em direção à Bolívia, onde penetrou no dia 3 de fevereiro de 1927, acampando na fazenda Capim Branco.      No dia seguinte foi lavrada uma ata assinada por Prestes e Miguel Costa e pelo major boliviano Heliodoro Carmona, na qual se estabeleceu a deposição voluntária das armas mediante as garantias concedidas pela Constituição boliviana a toda pessoa que ingressasse no país.

Ainda no dia 4, Miguel Costa, João Alberto, Cordeiro de Farias e mais cem revolucionários dirigiram-se para San Matías, enquanto Prestes, à frente de cerca de quatrocentos de seus comandados, seguiu para La Gaiba. Prestes encarregou-se de estabelecer a ligação com Siqueira Campos, que continuava em território brasileiro. Este, afinal, em 23 de março de 1927, entrou em território paraguaio com 65 homens.

Foi encerrada, assim, a marcha da Coluna Prestes, que percorreu 11 estados do Brasil ao longo de aproximadamente 25 mil quilômetros, levando a mensagem revolucionária. Sua longa duração fazia parte da estratégia dos revolucionários, que pretendiam que a luta se estendesse para além do período governamental de Bernardes, a fim de levar suas idéias às populações do interior. Entretanto, para permanecer tão longo tempo em combate com forças governamentais que lhes eram superiores, tiveram que adotar como única possibilidade de luta a guerra de movimento. Assim, quando se encontravam em situação de superioridade, atacavam com toda a intensidade e gritavam para assustar o inimigo, promovendo uma enorme algazarra. O objetivo não era vencer, mas criar uma legenda de força e bravura, causar impacto. Quando se encontravam em situação de inferioridade, evitavam o confronto para não serem submetidos a um desgaste.

Ao terminar a marcha da coluna, Prestes se projetara nacionalmente como líder militar, tendo adquirido ainda grande prestígio popular. Ao chegar a La Gaiba, tentou encontrar emprego para todos os soldados da coluna até poder enviá-los de volta ao Brasil. Desse modo, assinou um contrato com a Bolivian’s Concession Limited, companhia inglesa de colonização de terras bolivianas. O acerto previa que, como administrador, Prestes contrataria serviços para sanear uma zona do setor oriental boliviano. Para isso era necessário abrir estradas, demarcar terras e perfurar poços. Os ex-combatentes da coluna se espalharam por uma faixa de terra que abrangia La Gaiba, Puerto Suárez, San Carlos, Victoria e Santo Corazón. Nessa sua tarefa de saneamento das terras bolivianas, Prestes fez um estudo sobre as condições das fronteiras do Brasil na região, enviando-o depois ao Ministério das Relações Exteriores.

Mas nem todos os integrantes da coluna ficaram na Bolívia. Um grupo liderado por Miguel Costa e Isidoro se estabeleceu em Paso de los Libres, na Argentina, e outro fixou-se em Montevidéu. A separação entre os veteranos da coluna — com Prestes, em La Gaiba — e o antigo quartel-general revolucionário — com Isidoro, em Libres — acentuou-se. Percebendo que a dualidade La Gaiba-Libres não agradava a Prestes, Siqueira Campos começou a articular a retirada do poder de Isidoro, iniciando em Montevidéu e Buenos Aires a implantação da mística de Prestes. Na verdade, não houve luta pelo poder, pois Isidoro não fazia objeção a que Prestes assumisse a liderança dos revolucionários.

 

Alzira Alves de Abreu

 

[Verbete do Dicionário histórico-biográfico da Primeira República 1889-1930. Coordenação: Alzira Alves de Abreu/FGV]

FONTES: ABREU, A. Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930. Luis Carlos Prestes (verbete); ABREU, A. Dicionário histórico-biográfico brasileiro pós-1930. Tenentismo (verbete).