DEPARTAMENTO DE IMPRENSA E PROPAGANDA (DIP)

DEPARTAMENTO DE IMPRENSA E PROPAGANDA (DIP)

 

Órgão governamental criado pelo Decreto-Lei nº 1.915, de 27 de dezembro de 1939, durante a vigência do Estado Novo, com o objetivo de difundir a ideologia estado-novista e promover pessoal e politicamente o chefe do governo, bem como as realizações governamentais. Constituiu-se, desta forma, no porta-voz oficial do regime. Foi extinto em 25 de maio de 1945, pelo Decreto-Lei nº 7.582, que criou o Departamento Nacional de Informações (DNI).

Antecedentes

A criação do DIP foi precedida, no tocante à divulgação das iniciativas governamentais, por três outros órgãos — o Departamento Oficial de Publicidade (DOP), o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (DPDC), e o Departamento Nacional de Propaganda (DNP) —, que se sucederam a partir de 1931. Nenhum deles, no entanto, desfrutou do grau de autonomia e abrangência do DIP, dada a conjuntura especificamente diferente em que atuaram.

Logo após a consolidação da vitória dos revolucionários de outubro de 1930, que depuseram o presidente Washington Luís e entregaram a chefia do Governo Provisório a Getúlio Vargas, começaram a ser dados os primeiros passos em direção à organização da propaganda política no plano nacional, consubstanciados na criação, em 2 de julho de 1931, do Departamento Oficial de Publicidade. Este órgão, vinculado ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, constituía-se numa espécie de apêndice da Agência Nacional e atuava basicamente no setor de radiodifusão. De resto, sua atividade limitava-se ao fornecimento de informações oficiais à imprensa.

A iniciativa da organização de uma forma mais sistemática de propaganda oficial, que abrangesse outros veículos de comunicação de massa, coube ao próprio presidente Getúlio Vargas, que confiou, em abril de 1934, ao diretor da Imprensa Nacional, Francisco Antônio Rodrigues de Sales Filho, o encargo de fazer experimentalmente um serviço dessa natureza. Assim, em 10 de julho do mesmo ano, avaliados os resultados positivos da fase experimental do projeto, Vargas criou o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural, através do Decreto-Lei nº 24.651, que extinguiu o DOP. O novo órgão continuou subordinado ao Ministério da Justiça e sua direção geral foi entregue a Lourival Fontes, jornalista e escritor sergipano e manifesto admirador do fascismo italiano. O DPDC compreendia, além da Imprensa Nacional — que manteve sua autonomia administrativa — e do setor de radiodifusão, já englobado pelo extinto DOP, os setores de cultura e cinema, tendo estimulado a produção de filmes educativos por meio de prêmios e favores fiscais.

Com o golpe do Estado Novo em 10 de novembro de 1937 e o fechamento do Congresso Nacional, o DPDC passou a ocupar as instalações do palácio Tiradentes, antiga sede da Câmara dos Deputados, no Rio de Janeiro. Por outro lado, a nova Carta Constitucional, então outorgada, atribuiu à imprensa a qualidade de serviço de utilidade pública e traçou os limites para a sua atuação através de uma série de restrições. Uma série de atividades não previstas por lei começou então a ser incorporada ao DPDC, que, no início de 1938, foi transformado, por decreto presidencial, no Departamento Nacional de Propaganda, passando a atuar em todos os campos relacionados com o que se denominava “educação nacional” e a exercer a censura e o controle de todos os meios de comunicação. O novo órgão manteve-se vinculado ao Ministério da Justiça e Lourival Fontes permaneceu na direção geral.

O DNP teve como uma de suas principais atividades a promoção do Brasil no exterior, particularmente através do lançamento de jornalistas e escritores nacionais em jornais estrangeiros e da criação do Boletim de Informações, editado em quatro idiomas e distribuído em hotéis, consulados, embaixadas, navios etc. No setor de radiodifusão, o DNP foi o responsável pela inauguração da Hora do Brasil, programa transmitido diariamente por todas as estações de rádio, com duração de uma hora, visando a divulgação dos principais acontecimentos da vida nacional.

No dia 7 de fevereiro de 1938, o DNP proibiu todas as transmissões radiofônicas em língua estrangeira em território brasileiro, bem como a importação e circulação de jornais e revistas publicadas no exterior, que tinham na época um peso significativo no mercado. No final de fevereiro, Vargas assinou o Decreto-Lei nº 300, que, entre outros pontos, dispunha sobre a isenção de taxas alfandegárias sobre a importação de papel, estabelecendo que os proprietários de jornais e revistas deveriam obter autorização do Ministério da Justiça, mediante o prévio preenchimento de numerosas exigências, para poder desfrutar da isenção. Através desse recurso, o governo passou a controlar diretamente a imprensa, concedendo os favores fiscais apenas àqueles jornais que seguissem a orientação governamental.

O DIP e sua atuação (1939-1945)

Com o objetivo de aperfeiçoar e ampliar as atividades do DNP, Vargas criou, pelo Decreto nº 1.915, de 27 de dezembro de 1939, o Departamento de Imprensa e Propaganda, extinguindo, através do mesmo decreto, o DNP. A direção geral do novo departamento permaneceu nas mãos de Lourival Fontes.

A partir da criação do DIP, todos os serviços de propaganda e publicidade dos ministérios, departamentos e estabelecimentos da administração pública federal e de entidades autárquicas passaram a ser executados com exclusividade pelo órgão, que também organizava e dirigia as homenagens a Vargas, passando a se constituir no grande instrumento de promoção pessoal do chefe do governo, de sua família e das autoridades em geral. Contando com maior amplitude de ação e maior autonomia que os departamentos que o antecederam, dada sua ligação direta com a Presidência da República, o DIP tornou-se o órgão coercitivo máximo da liberdade de pensamento e expressão durante o Estado Novo e o porta-voz autorizado do regime.

De acordo com o decreto que lhe deu origem, o DIP tinha como principais objetivos centralizar e coordenar a propaganda nacional, interna e externa, e servir como elemento auxiliar de informação dos ministérios e entidades públicas e privadas; organizar os serviços de turismo, interno e externo; fazer a censura do teatro, do cinema, das funções recreativas e esportivas, da radiodifusão, da literatura social e política e da imprensa; estimular a produção de filmes educativos nacionais e classificá-los para a concessão de prêmios e favores; colaborar com a imprensa estrangeira para evitar a divulgação de informações nocivas ao país; promover, organizar e patrocinar manifestações cívicas e festas populares com intuito patriótico, educativo ou de propaganda turística, assim como exposições demonstrativas das atividades do governo, e organizar e dirigir o programa de radiodifusão oficial do governo.

Para a execução dessa grande e complexa tarefa, as atividades do DIP distribuíam-se entre cinco divisões específicas. A divisão de divulgação tinha sob sua competência as atividades de elucidação da opinião nacional sobre as diretrizes doutrinárias do regime e o combate, por todos os meios, à penetração e disseminação de qualquer idéia perturbadora da unidade nacional. Cabia-lhe, também, a promoção dos compositores, cantores, poetas e pensadores brasileiros, tarefa que realizava através da organização periódica de espetáculos musicais, sessões literárias, conferências e congressos. Era ainda a responsável pela edição de folhetos, livros e cartazes do DIP e pela edição anual de uma publicação com todas as informações sobre jornais, revistas e livros publicados no país.

Competia à divisão de rádio, de acordo com regulamento do DIP, levar aos ouvintes radiofônicos nacionais e estrangeiros, por intermédio da radiodifusão oficial, tudo o que lhes pudesse fixar a atenção sobre as atividades brasileiras em todos os domínios, fazer a censura prévia de programas radiofônicos e de letras a serem musicadas e organizar o programa Hora do Brasil. À divisão de teatro e cinema cabiam as funções de censurar previamente e autorizar ou interditar todos os filmes e representações teatrais em todo o território nacional; publicar no Diário Oficial a relação de peças e filmes censurados, acompanhados de suas características e do resumo do julgamento; incentivar e promover facilidades econômicas às empresas nacionais produtoras e aos distribuidores de filmes em geral, e instituir, permanentemente, um cinejornal com versões sonoras, filmado em todo o Brasil e com motivos genuinamente brasileiros, o que deu origem ao Cine-jornal brasileiro distribuído nos cinemas de todo o país.

Sobre a divisão de imprensa recaía uma tarefa bastante complexa, cabendo-lhe, como principais funções, exercer a censura à imprensa; organizar o serviço de controle da imprensa nacional e estrangeira; organizar um arquivo de jornais, revistas, livros e todo o tipo de publicações nacionais e estrangeiras; manter um serviço de clichês e fotografias para fins de distribuição à imprensa; manter um serviço de copyright de artigos de autores brasileiros para os jornais do país e do exterior, e autorizar previamente a circulação de publicações periódicas. A divisão de imprensa era assistida, no exercício de suas atribuições, como nos casos de aplicação de penalidades às empresas jornalísticas, pelo Conselho Nacional de Imprensa, criado logo após o DIP, pelo Decreto-Lei nº 1.949, de 30 de dezembro de 1939. O conselho era composto por seis membros, sendo três deles nomeados pelo presidente da República e os demais eleitos, como delegados, em assembléias gerais, convocadas para esse fim pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e pelo Sindicato de Proprietários de Jornais e Revistas do Rio de Janeiro. A princípio, a presidência do conselho era exercida pelo diretor da divisão de imprensa, tendo, posteriormente, sido atribuída ao diretor-geral do DIP.

Entre as divisões do DIP, havia também uma divisão de turismo, encarregada da divulgação do Brasil no exterior, com a finalidade de incentivar o turismo. Essa divisão editou folhetos em língua estrangeira, com ilustrações do Rio de Janeiro e de Poços de Caldas, e deu início a uma publicação de caráter periódico, Travel in Brazil, que teve mais de 25 mil exemplares distribuídos por agências norte-americanas somente nos Estados Unidos. A divisão de turismo organizou também a exposição “Posição do Brasil no mundo”, na Feira de Amostras, com 70 painéis e gráficos sobre a economia brasileira em seus diversos aspectos, os quais foram depois entregues ao Ministério do Trabalho para figurar na Feira das Indústrias Brasileiras, em Montevidéu e Buenos Aires.

A estrutura do DIP contava, ainda, com 11 serviços auxiliares, seis criados por lei — comunicações, contabilidade e tesouraria, material, filmoteca, discoteca e biblioteca — e cinco por portaria do diretor-geral — garagem, distribuição de propaganda, registro de imprensa e administração do palácio Tiradentes. Contando com uma estrutura tão complexa, a eficácia do DIP na realização de seus fins se fez sentir rapidamente. O culto à personalidade e a construção de imagens idealizadas de Getúlio Vargas veiculadas pelo DIP — como, por exemplo, a de “pai dos pobres” — ajudaram a consolidar em pouco tempo o poder do ditador.

O DIP promoveu concursos de monografias, garantindo às obras premiadas sua publicação e divulgação por todo o país. Inúmeros folhetos explicativos do novo regime e que divulgavam a obra do governo, principalmente no campo da legislação trabalhista, marcaram a atuação doutrinária do órgão. As obras vencedoras desses concursos eram de caráter apologético e seus autores, na sua maioria, figuras desconhecidas no panorama intelectual. O DIP patrocinou também concursos de música popular e foi num deles que Aquarela do Brasil, de autoria de Ari Barroso, recebeu o primeiro lugar. Além disso, cabia ao DIP distribuir a fotografia oficial do presidente Vargas, não só nas repartições públicas, mas também em colégios, clubes, estações ferroviárias, aeroportos, bancos, casas comerciais etc.

Ainda dentro da área de divulgação do ideário estado-novista, o DIP lançou diversas publicações, entre as quais a de maior destaque foi Cultura Política — Revista Mensal de Estudos Brasileiros. Sob a direção de Almir de Andrade, a revista tinha como propostas principais a promoção de nova concepção de cultura, unificando a ordem política e social sob a égide do Estado, e o esclarecimento do rumo das transformações políticas e sociais em curso no país. A publicação contava em seu quadro de colaboradores com a presença de nomes expressivos da intelectualidade do período. Além dos principais ideólogos do Estado Novo, como Francisco Campos, Almir de Andrade e Lourival Fontes, recebia a contribuição eventual de intelectuais das mais diversas correntes, como Nélson Werneck Sodré, Graciliano Ramos e Gilberto Freire, que se limitavam a escrever sobre assuntos relacionados às suas respectivas áreas de interesse, no caso história, literatura e folclore.

Além da revista Cultura Política, o DIP editou uma publicação mensal denominada Estudos e Conferências, cujo primeiro número saiu em setembro de 1940. Outra publicação do órgão, Dos Jornais, foi lançada em junho de 1941 e se dedicava a transcrever artigos favoráveis ao governo publicados pela imprensa não-oficial.

Por outro lado, as relações do DIP com a imprensa caracterizaram-se sempre pela ocorrência de numerosos atritos. Já em março de 1940, registrou-se um dos casos mais notórios de intervenção em jornais, com a invasão pela polícia de O Estado de S. Paulo. O jornal permaneceu sob intervenção do DIP até o final do Estado Novo. No mesmo ano de 1940, também sofreram intervenção os jornais A Noite e A Manhã.

Ainda em 1940, através de decreto datado de 4 de setembro, o DIP teve seu poder ampliado com a instalação, em cada estado do país, de um Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda (DEIP), com suas mesmas atribuições. A partir de outubro, o Ministério da Justiça passou a coordenar todos os meios e órgãos de divulgação e publicidade existentes no país, inclusive o DIP. Ainda a partir desse ano, o DIP passou a centralizar as verbas de publicidade do Banco do Brasil e de outras instituições, distribuindo-as entre os jornais de sua preferência. Em dezembro ainda de 1940, numa atitude que demonstrava as simpatias do governo às potências do Eixo, o DIP proibiu que jornais cinematográficos exibissem quaisquer notícias sobre a Inglaterra.

Em 1941, já haviam sido requeridos ao DIP e submetidos à apreciação do Conselho Nacional de Imprensa 2.699 pedidos de registros de jornais, revistas e outros órgãos de publicações, dos quais 412 haviam sido negados e 508 permaneciam em diligência. No mesmo ano foram também solicitados registros de 17 agências telegráficas, 1.200 oficinas gráficas, 35 correspondentes de jornais estrangeiros e 1.256 de jornais nacionais, além de 160 agências de publicidade.

Em janeiro de 1941 o DIP proibiu as críticas aos Estados Unidos, que até então não passavam incólumes pelo crivo da imprensa escrita e falada. Em agosto, todos os jornais editados em línguas estrangeiras — cerca de 60 — e que anteriormente publicavam também a tradução de suas matérias, foram proibidos de circular. A proibição fazia parte da campanha muito difundida, na época, para que o Brasil se tornasse “mais brasileiro”.

Estando o governo dividido quanto à entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial contra os países do Eixo, em julho de 1942, Filinto Müller, chefe de polícia do Distrito Federal, tentou impedir a realização de uma passeata organizada por estudantes do Rio de Janeiro, em apoio aos países aliados. A manifestação pôde ser realizada graças à intervenção de Vasco Leitão da Cunha, ministro interino da Justiça durante a ausência do titular Francisco Campos. Essa dissensão veio aguçar a polarização no seio das forças governistas. Lourival Fontes, diretor-geral do DIP, colocou-se ao lado do ministro interino, o mesmo tendo feito Osvaldo Aranha, ministro das Relações Exteriores, Ernâni Amaral Peixoto, interventor no estado do Rio de Janeiro, e o próprio Francisco Campos, enquanto o general Eurico Dutra, ministro da Guerra, aliou-se ao chefe de polícia. Em decorrência da crise, no dia 17 de julho foram demitidos de seus cargos Filinto Müller, Francisco Campos, Leitão da Cunha e Lourival Fontes.

Em agosto, foi nomeado para assumir a direção geral do DIP o major Antônio José Coelho dos Reis. No mesmo mês, o Brasil declarou guerra aos países do Eixo. Nova mudança na diretoria do DIP veio a ocorrer em abril de 1943, quando o major Coelho dos Reis entregou o cargo ao capitão Amílcar Dutra de Meneses.

A partir de fins de 1944, as sucessivas vitórias dos Aliados no front permitiam entrever a proximidade do final da Segunda Guerra, fato que contribuiu sensivelmente para acelerar a desestabilização do governo Vargas. Refletindo o enfraquecimento do Estado Novo, o DIP, desde o início do movimento pela redemocratização do país, perdeu paulatinamente seus espaços de atuação, dadas as pressões em sentido contrário. Assim, nenhuma atitude foi tomada pelo departamento por ocasião da entrevista concedida por José Américo de Almeida ao repórter Carlos Lacerda, do Correio da Manhã, em fevereiro de 1945, na qual o escritor comentava o golpe de 1937 e exigia eleições imediatas.

Em entrevista coletiva à imprensa, no mês seguinte, o próprio Vargas, reconhecendo a decadência do DIP, afirmou que, a partir da normalização da situação internacional, ou seja, do fim da Segunda Guerra Mundial, o órgão passaria a tratar exclusivamente da divulgação da cultura brasileira.

No dia 23 de maio de 1945, após a concessão de anistia aos presos políticos, o diretor do DIP, Amílcar Dutra, autorizou a irradiação do discurso do líder comunista Luís Carlos Prestes durante o comício que se realizaria naquela data no estádio do Vasco da Gama, no Rio. A resolução foi severamente criticada pelo ministro da Guerra, general Eurico Dutra, o que determinou uma contra-ordem governamental no sentido de que fosse suspensa a transmissão. O fato, que refletia o descompasso entre a orientação do DIP e de outros setores do governo no que se referia ao novo momento político da nação, resultou na imediata exoneração de Amílcar Dutra de Meneses, que foi substituído por Heitor Muniz, o qual permaneceu no cargo apenas dois dias.

Avaliada a inexeqüibilidade dos objetivos para os quais havia sido criado e a crescente pressão popular pelo fim de todos os órgãos cerceadores de liberdade criados durante a vigência do Estado Novo, o DIP foi extinto em 25 de maio de 1945, pelo Decreto-Lei nº 7.582. Pelo mesmo decreto, foi criado o Departamento Nacional de Informações (DNI).

Rejane Araújo

 

 

FONTES: AMARAL, A. Departamento; AQUILES, A. Aspectos; Boletim Min. Trab. (1/40); CARONE, E. Estado; CARONE, E. Terceira; DULLES, J. Getúlio; SCHMITER, P. Interest.