PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT)

PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT)

Partido político nacional criado oficialmente em 10 de fevereiro de 1980.

Natureza do partido

Novidade, diferença, socialismo democrático. Esses são termos freqüentemente associados ao PT, não só em seu momento de fundação, mas desde as greves no ABCD paulista, lideradas pelos metalúrgicos (1978-1979), passando pela elaboração de seus documentos iniciais constitutivos, Carta de princípios e Declaração política, ambos preparados pela comissão nacional provisória e datados de 1º de maio de 1979, e Manifesto do Partido dos Trabalhadores, aprovado na reunião nacional de 10 de fevereiro de 1980 (São Paulo), que também aprovou os Pontos para elaboração do programa, até o Programa do partido.

A novidade do partido decorre, antes de tudo, da forma pela qual ele surgiu: do movimento social de trabalhadores, com base na classe operária, e não a partir de bases congressuais ou de partido preexistente, o que, de resto, tem caracterizado a emergência de todos os partidos brasileiros; a exceção é o Partido Comunista, fundado em 1922. O PT se declara diferente porque defende a autonomia dos movimentos e organizações populares e, sobretudo, em virtude de seus objetivos políticos. Afirma-se como socialista e democrático, ao lutar pela livre organização dos trabalhadores, ao propor o combate aos instrumentos de repressão — cabe frisar que o seu surgimento deu-se durante o regime militar —, ao defender a alteração da estrutura fundiária no país, ao combater a política salarial (de arrocho) e ao defender uma política social efetiva.

O próprio partido, democrático em sua organização interna, é definido como partido dos trabalhadores urbanos e rurais e como partido de massas. Ideológica e organizacionalmente, o partido, desde sua origem, se compôs de tendências diversas. Em 1991 havia cerca de 15 tendências minoritárias, além da majoritária “Articulação”. Já em 1995 o PT se estruturava em torno de quatro grandes blocos ideológicos; nenhum deles, no entanto, se constituía como facção suficientemente majoritária para controlar o partido.

Com programa e ideologia definidos, o partido não poderia deixar de contemplar as facções e diferenças internas, apesar de todas elas buscarem sistematicamente o equilíbrio possível, sem deixar de, simultaneamente, reafirmar a diferença, justificada pela manutenção interna da democracia. A autodefinição como partido dos trabalhadores e como partido de massas é o segundo elemento que caracteriza — aliado à multiplicidade de facções — as ambigüidades do partido em suas relações com a sociedade, com o governo e com os demais partidos.

A terceira fonte de clivagem tem a ver com a dificuldade de se conciliar a idéia de partido voltado para organizar a ação dos trabalhadores com o objetivo precípuo de todo partido, vale dizer, maximizar o apoio eleitoral. O PT se vê simultaneamente como expressão social e como agente de organização social, de um lado, e como partido político, de outro lado, e como tal possui também o objetivo de maximização do voto, sem perda de sua identidade. A contradição reside no uso de duas categorias sociais distintas: classe e massas. A materialização diferenciada na ação política das categorias mencionadas, associada à presença de divergência ideológica organizada, leva ao conflito quase que permanente entre a militância, a burocracia partidária e os detentores de mandato popular, no Executivo e no Legislativo.

Ao longo do tempo, desde a sua criação, tais tensões fizeram parte — e continuarão a fazer — da vida interna do partido, revelada nos sucessivos encontros nacionais, embora o PT tenha externamente abrandado o seu discurso político, o que tem permitido a sua sobrevivência e o seu crescimento eleitoral.

A concepção inicial do programa do partido encontra-se hoje, 18 anos após a sua fundação, sub judice. No Pontos para a elaboração do programa, preparado pela comissão nacional provisória do Movimento Pró-PT (10/2/1980), dizia-se: “A concepção que tivermos do programa do PT também é uma marca distintiva da organização partidária que estamos construindo. Em primeiro lugar, o PT nem pode nem deve ter um programa de governo para quando o partido chegue ao poder. Precisamente porque a proposta do PT não é administrar o capitalismo e suas crises supostamente em nome da classe trabalhadora” (Sobre o PT, p. 87).

Representação política

Os números indicativos do crescimento do partido entre quaisquer duas eleições são modestos, mas o crescimento tem sido sistemático ao longo de toda a sua vida, tanto no que se refere a eleições para o Poder Executivo quanto para o Legislativo.

Na Câmara dos Deputados, o partido começou com uma representação circunscrita a oito cadeiras, todas elas obtidas na região Sudeste, e atingiu 49 cadeiras na eleição de 1994. Embora metade delas tenha sido obtida na região Sudeste, o PT já conta com representantes de todas as regiões brasileiras. Em 1998 o partido aumentou sua representação para 58 cadeiras. O quadro no Senado revela uma posição ainda extremamente frágil, mas crescente: em 1990 o partido elegeu um senador, em 1994, apenas quatro, e em 1998, tendo reeleito Eduardo Suplicy, por São Paulo, e eleito dois, ficou com uma representação de sete cadeiras.

A eleição presidencial de 1989, dez anos após a fundação do partido e a primeira após o regime de exceção, foi o ponto alto da vida partidária, em uma perspectiva puramente eleitoral. No primeiro turno foram derrotados todos os candidatos dos partidos eleitoral e congressualmente fortes. Passaram ao segundo turno Fernando Collor de Melo e Luís Inácio Lula da Silva; o primeiro, candidato do Partido da Reconstrução Nacional (PRN), recém-criado para abrigar a candidatura Collor de Melo; o segundo, líder das greves trabalhistas do final dos anos 1970 e presidente do PT. Collor de Melo elegeu-se com 35.089.998 votos (53% do total de votos válidos); Lula obteve 31.076.364 votos (47%). Novamente candidato à presidência da República em 1994, Lula perdeu para Fernando Henrique Cardoso, sustentado pela aliança entre o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), o Partido da Frente Liberal (PFL) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), ainda no primeiro turno. Nas eleições presidenciais de 1998 o Partido dos Trabalhadores se coligou, entre outros, com o Partido Democrático Trabalhista (PDT), tendo Lula como candidato à presidência e Leonel Brizola como candidato à vice-presidência. Essa coligação não ocorreu sem prévias discussões e acordos, entre eles o de que ela não necessariamente se repetiria nas disputas proporcionais. Como no pleito anterior, Lula foi derrotado no primeiro turno, obtendo 31,71% dos votos válidos

Em eleições majoritárias estaduais, o partido tem crescido modestamente. Em 1982, de um total de 48.188.956 votos, obteve ele, sem eleger governador algum, escassos 1.589.645 votos. Já em 1994 elegeu dois governadores, o do Espírito Santo (Vítor Buaiz) e o do Distrito Federal (Cristovam Buarque).

Nos legislativos estaduais, partiu de escassos 12 deputados, em 1982, para 39 e 83, nas eleições de 1986 e de 1990, e chegou a 92, em 1994. Em 1998 o partido elegeu 91 deputados estaduais. No plano municipal elegeu um prefeito e 179 vereadores em 1982; já em 1996, elegeu 112 prefeitos e 1.881 vereadores.

Em 1998 o PT elegeu três governadores — no Rio Grande do Sul (Olívio Dutra), Mato Grosso do Sul (Zeca do PT) e Acre (Jorge Viana) —, mas sofreu inesperada derrota com a não reeleição de Cristovam Buarque. No estado de São Paulo o partido teve grandes esperanças com a candidata Marta Suplicy que, após acirrada disputa com Mário Covas (PSDB), não conseguiu passar para o segundo turno das eleições. No Rio de Janeiro o partido foi obrigado a se confrontar com as divergências derivadas de sua organização em dez diferentes tendências. Correntes do PT do Rio de Janeiro consideradas mais radicais, ou mais de esquerda, aprovaram em seu encontro regional o lançamento de candidato próprio, Vladimir Palmeira, ao governo do estado. Tendo Leonel Brizola condicionado sua permanência na coligação nacional ao apoio do PT à candidatura de Anthony Garotinho, do PDT, e Benedita da Silva, do PT, como governador e vice-governadora, o diretório nacional do partido anulou a candidatura de Palmeira, interferindo diretamente na decisão do PT regional. Esse fato pôs em questão uma postura democrática característica do partido, ou seja, o respeito à soberania das decisões dos diretórios regionais.

Em meados dos anos 1990, após a conquista de várias prefeituras e de dois governos estaduais, o partido passou a conviver com um novo, mas esperado, conflito: ser governo. A distância entre um programa partidário e sua execução é sempre grande; mas é ainda mais acentuada e dramática quando se trata de um partido ideológico-programático. Isto porque a ação governamental tem como característica o pragmatismo, a tomada de decisão em circunstâncias variáveis e, com freqüência, pouco previsíveis; a justificativa e a orientação da ação se dirigem para a maioria do eleitorado e não para a militância e eleitorado do partido no governo. Ser governo é, atualmente, o grande desafio do PT.

Olavo Brasil de Lima Júnior colaboração especial

 

A CHEGADA AO PODER

 

O aprendizado obtido nas derrotas de 1994 e 1998 levou o PT a rever suas estratégias para a conquista do poder central que já por três vezes escapara a seu principal líder e candidato, Lula.

Antes disso, porém, tiveram lugar as eleições municipais de 2000, quando os petistas elegeram 187 prefeitos em todo o país, em novo sinal de crescimento. Seis destes prefeitos eram de capitais: Marta Suplicy, em São Paulo, Tarso Genro, em Porto Alegre, Pedro Wilson, em Goiânia, Edmílson Rodrigues, em Belém, João Paulo, em Recife, e Marcelo Déda, em Aracajú.

Chegada a campanha de 2002, Lula hesitava em disputar a quarta eleição seguida e sofrer nova derrota. Convenceu-se, ou convenceu seus correligionários, a partir para a formação de uma aliança eleitoral mais ampla, partidária e socialmente, assim como a utilizar ferramentas contemporâneas de marketing político e tratamento de imagem que o PT parecia resistir em incorporar. Convidou o empresário e senador por Minas Gerais, na legenda do Partido Liberal (PL), José Alencar, para compor como candidato a vice em sua chapa – procurando assim romper com predisposições negativas à sua candidatura por parte do empresariado e setores mais comprometidos ideologicamente com a livre iniciativaao mesmo tempo em que costurava a coligação também com os tradicionais aliados do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido da Mobilização Nacional (PMN) e Partido Comunista Brasileiro (PCB). Outro aspecto importante da estratégia foi o fato de que, desta vez, Lula não somente não colocou em questão a estabilidade econômica trazida pelo Plano Real – grande bandeira dos rivais do PSDB, e principal alavanca das vitórias de Fernando Henrique Cardoso em 1994 e 1998 – como também assumiu de público, com uma Carta aos Brasileiros, o compromisso de, se eleito, manter as linhas mestras da política econômica de seu antecessor. Atitude que gerou intenso debate dentro do PT, mobilizando aqueles que apoiaram a iniciativa do candidato, aqueles que se opunham a qualquer transigência com o governo em fim de mandato, e ainda aqueles que justificaram a atitude de Lula, caracterizando-a no entanto como movimento tático eleitoral, sem futuro real num próximo governo petista.

Pautando seu comportamento pessoal no Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE), e no trato com a mídia, por uma nova postura, mais leve e sorridente – na qual se auto-intitulou “Lulinha, paz e amor” –, em claro contraste com a imagem carrancuda que firmara nas eleições anteriores, o candidato petista liderou as pesquisas de intenção de voto ao longo de toda campanha e venceu o primeiro turno com 46,44% dos votos válidos, o que obrigou a realização de uma nova disputa.

Enfrentando o candidato tucano, José Serra (SP), Lula afinal elegeu-se presidente da República no 2º turno, obtendo cerca de 52 milhões de votos, ou 61% do total.

A emocionante vitória de Lula no pleito principal foi secundada pela eleição de três governadores petistas, repetindo-se assim o feito da legenda nas eleições anteriores. No Acre, reelegeu-se Jorge Viana, em Mato Grosso do Sul, José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT, também foi reconduzido ao poder, e no Piauí, a vitória de Wellington Dias, já no 1º turno, compensou, em parte, a derrota petista no Rio Grande do Sul, onde Tarso Genro foi superado, no 2º turno, por Germano Rigotto, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).

Na Câmara dos Deputados, contudo, a vitória de Lula teve efeitos mais visíveis para o PT, que, pela primeira vez, elegeu a maior bancada da Casa: 77 deputados, ou 17,7% das cadeiras, com expressivas participações dos PTs paulista e mineiro. Nas eleições para o Senado a legenda também brilhou, conquistando dez cadeiras.

As 400 prefeituras conquistadas pelo PT nas eleições de 2004 atestam o impacto do crescimento e penetração do partido, representando mais do que o dobro do resultado anterior, em 2000. Crescimento que se refletiu também no número de capitais conquistadas, que foram nove, dessa vez. João Paulo se reelegeu em Recife, e Marcelo Deda em Aracajú; as sete outras vitórias petistas em capitais se deram em Belo Horizonte, com Fernando Pimentel, Fortaleza, com Luizianne Lins, Rio Branco, com Raimundo Angelim, Macapá, com João Henrique Pimentel, Vitória, com João Coser, Porto Velho, com Roberto Sobrinho, e Palmas, com Raul Filho.

O ano de 2005 marcaria, porém, a trajetória do PT de modo indelével. Caíram sobre o partido pesadas acusações de envolvimento em esquemas de corrupção, compra de votos parlamentares, operação ilícita de fundos eleitorais, e práticas antiéticas na articulação de coligações com outras siglas, justamente nos pleitos vitoriosos de 2002 e 2004. A chamada crise do “mensalão” – suposto esquema de compra de votos de parlamentares da base aliada ao Governo Lula (20003-2007) no Congresso – não somente custou reputações e mandatos aos quadros partidários como também decepcionou milhares de militantes e simpatizantes do PT, principalmente nos setores da classe média do Sudeste e Sul, cujo vínculo principal com a legenda se dava em torno da ética na política, e na crença de que os métodos petistas eram intrinsecamente distintos dos de outras agremiações, tidas como mais tradicionais.

O impacto da crise, que se prolongou em Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), capitaneadas pela oposição, e exploradas por veículos de comunicação anti-petistas, ao longo da maior parte do ano de 2005, não se faria notar, contudo, de modo muito dramático no desempenho geral da legenda em 2006. Se, de fato, antes da crise a reeleição de Lula era tida como líquida e certa, o novo quadro impôs ao presidente um maior esforço na busca por um novo mandato. Enfrentando não apenas, como era esperado, o assédio de um rival tucano – que em 2006 seria o ex-governador paulista, Geraldo Alckmin –, Lula teve que se ver às voltas também com concorrentes do próprio campo das esquerdas que procuraram explorar e ocupar os flancos abertos pelo PT em seu transe. Heloisa Helena, do recém-criado Partido Socialismo e Liberdade (PSOL-AL), e o ex-ministro da Educação de Lula, Cristovam Buarque (PDT-DF), não por acaso dois dissidentes do PT, levaram o presidente a concentrar sua estratégia, inicialmente, apenas em torno dos resultados econômicos e sociais de seu governo. Uma vez qualificados Lula e Alckmin para a disputa no 2º turno, porém, o candidato petista apostou em nova edição da polarização clássica entre esquerda e direita, para atrair o voto dos setores descontentes que o haviam deixado na 1ª volta, mas que não desejavam de qualquer modo, o retorno dos tucanos ao poder, e venceu com menos dificuldades do que se previra inicialmente.

Na verdade, as pesquisas demonstraram que entre a primeira e segunda vitória de Lula, houvera mudança importante na composição do eleitorado petista: parecia perder importância o voto das regiões mais desenvolvidas, nas grandes concentrações urbanas, no Sul e no Sudeste, de par com um crescimento relativo do voto nordestino, e das pequenas e mais pobres cidades. Um sinal desse processo poderia estar no desempenho da sigla nas eleições estaduais: mesmo com toda a crise o PT elegeu um número maior de governadores em 2006. E todos no Norte e Nordeste: Binho Marques (AC), Ana Júlia (PA), Wellington Dias (PI), Marcelo Déda (SE), e, por último, mas não menos significativo, Jaques Wagner, na Bahia, outrora um reduto praticamente inexpugnável dos seus adversários do PFL.

Também a bancada petista na Câmara Federal não pareceu ter sofrido grandes abalos: com 71 deputados eleitos, o PT fez novamente a maior bancada. Apenas dessa vez, com a companhia do PMDB, que elegeu igual número. Para o Senado, porém, o desempenho da sigla ficou muito aquém do obtido anteriormente: foram eleitos apenas mais dois senadores petistas.

Nas eleições municipais de 2008 o PT manteve sua tendência de crescimento, elegendo 559 prefeitos em todo o país. O número de prefeitos eleitos em capitais sofreu relativa redução, embora o partido tenha mantido a dianteira, junto com o PMDB, que também conquistou seis capitais. Foram eleitos, ou reeleitos pelo PT em 2008: Raimundo Angelim (Rio Branco), Luizianne Lins (Fortaleza), João Coser (Vitória), João da Costa (Recife), Roberto Sobrinho (Porto Velho), e Raul Filho (Palmas).

 

FONTES: AZEVEDO, C. B. Estrela; Estado de S. Paulo (13/3/98); Folha de S. Paulo (4/10/98); GADOTTI, M. & PEREIRA, O. Pra que; Globo (25 e 27/4, 10/5/98); Jornal do Brasil (28/4, 5/10/98); KINZO, M. Radiografia; LIMA JÚNIOR, O. B. Democracia; PEDROSA, M. Sobre; TRIB. SUP. ELEIT. Dados (1998); Portal TSE (WWW.tse.gov.br; acessado em 1/12/2009).