MANIFESTO DOS MINEIROS

MANIFESTO DOS MINEIROS

 

O Manifesto dos mineiros, originalmente intitulado Manifesto ao povo mineiro, datado de 24 de outubro de 1943 — em homenagem à Revolução de 1930 —, foi o primeiro pronunciamento público de setores liberais contra o Estado Novo. As formas organizadas de oposição à ditadura restringiam-se, até então, à ação da esquerda (socialistas e comunistas) e aos movimentos operário e estudantil, sobretudo no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Recife, sempre clandestinos e sujeitos a severa repressão. A importância comumente atribuída ao Manifesto dos mineiros, malgrado o conteúdo do texto ser relativamente brando — mais próximo de um discurso de bacharéis do que de um libelo oposicionista de cunho radical —, decorre dos seguintes fatos: 1) de seu caráter precursor, por ser a primeira manifestação ostensiva, coletiva e assinada, organizada por membros de elites liberais, até então ausentes em qualquer contestação pública; 2) de seu significado regional, no sentido de ser uma resposta dos mineiros ao que percebiam como “a espoliação do poder político de Minas Gerais a partir da ascensão de Getúlio Vargas”, o que confirma a importância das tradições regionalistas na política brasileira; 3) da reação do governo, recorrendo a sanções contra os signatários (demissões ou aposentadorias dos cargos), o que foi objeto de grande repercussão em todos os setores da oposição ao regime, e 4) da vinculação entre os principais articuladores do manifesto com o movimento conspiratório que desembocaria na criação da União Democrática Nacional (UDN) em torno da candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes às eleições presidenciais de 1945.

Assim é que o Manifesto dos mineiros passou para a história como um dos elementos decisivos para a queda de Getúlio Vargas e o fim do Estado Novo, embora o documento não apresentasse qualquer proposta de ação concreta para a derrubada do regime.

 

Histórico

O antecedente imediato do movimento pela elaboração do Manifesto foi a realização do Congresso Jurídico Nacional, no Rio de Janeiro, convocado pelo Instituto dos Advogados Brasileiros, em agosto de 1943. A delegação mineira, chefiada por Pedro Aleixo, propôs uma tese sobre as liberdades públicas, tendo sido apoiada pelas delegações carioca e baiana. Elementos governistas manobraram para retirar a proposta da ordem do dia e as bancadas oposicionistas abandonaram o congresso em sinal de protesto. No mês seguinte, promoveram almoço-homenagem a Pedro Aleixo, último presidente da Câmara, e a partir de então o grupo mineiro passou a reunir-se no Rio de Janeiro (na residência dos Melo Franco, no Foro e no Instituto dos Advogados) e em Belo Horizonte.

A idéia de se redigir um manifesto, reivindicada por Afonso Arinos e Odilon Braga, surgiu, inicialmente, como a “resposta mineira” aos festejos oficiais do centenário da Revolução Liberal de 1842 (Batalha de Santa Luzia), quando o governo reverenciou a memória de Caxias, enquanto os mineiros teriam preferido exaltar seus heróis liberais. O texto original teve três versões (de Odilon Braga, de Virgílio de Melo Franco e de Dario de Almeida Magalhães) de cunhos decrescentemente radicais. Mílton Campos, Pedro Aleixo e Luís Camilo de Oliveira Neto contribuíram para o texto-fusão, de autoria de Virgílio de Melo Franco, cabendo a Afonso Arinos a redação final. A primeira impressão do texto (50 mil exemplares) foi feita numa tipografia de Barbacena, e como não foi possível a publicação, devido à censura (o Correio da Manhã chegou a cogitar do risco), a distribuição foi feita de mão em mão ou por baixo das portas. O brigadeiro Eduardo Gomes encarregou-se da distribuição pelo norte do país. Virgílio de Melo Franco e Luís Camilo de Oliveira Neto lideraram o movimento de coleta de assinaturas no Rio de Janeiro e Pedro Aleixo, Mílton Campos e João Franzen de Lima em Minas Gerais.

 

O elenco

A subscrição do Manifesto foi limitada aos mineiros, contando-se 92 assinaturas de personalidades tradicionais da vida política, intelectual (professores e jornalistas), econômica e social, sobretudo um grande número de advogados em geral, consultores jurídicos ou diretores de bancos, na época o setor mais dinâmico da economia de Minas Gerais. Entre os políticos encontram-se remanescentes da República Velha, como Afonso Pena Júnior, Alaor Prata Soares, Adolfo Bergamini, Daniel de Carvalho, Francisco Mendes Pimentel, Gudesteu Pires e Mário Brant, e aqueles desalojados do poder em conseqüência, direta ou indireta, da ação política de Getúlio Vargas. Entre estes últimos destacam-se o ex-presidente Artur Bernardes, marginalizado pela Revolução de 1930; o “tenente civil” Virgílio de Melo Franco, preterido em 1933, e os que se afastaram em 1937, como Pedro Aleixo e Odilon Braga, respectivamente presidente da Câmara e ministro da Agricultura.

Recusaram-se a assinar o Manifesto o ex-presidente Venceslau Brás, por se declarar afastado da vida pública; o ex-presidente de Minas Gerais e chefe da Aliança Liberal, Antônio Carlos, alegando ter sido poupado por Getúlio Vargas, que não fechara a Câmara sob sua presidência, e Bias Fortes, por razões de fidelidade a Benedito Valadares, interventor no estado.

 

As motivações

Duas motivações principais, uma explícita e outra implícita, inspiraram a elaboração do Manifesto, ambas decorrentes da participação do Brasil na Segunda Guerra Mundial, ao lado dos Aliados. A primeira, explícita, se referia à possibilidade de se aproveitar a mobilização da opinião pública, indignada com o torpedeamento dos navios brasileiros pelos alemães, e explorar a contradição entre “lutar contra o fascismo na Europa e aceitar uma ditadura fascista no Brasil”. A segunda, implícita, e de significado político mais sutil, referia-se à tentativa de se recuperar a iniciativa dos mineiros em face das pretensões democratizantes de Getúlio Vargas, cujas posições teriam começado a mudar com as perspectivas — em fins de 1943 já tidas como certas — da vitória dos Aliados contra o Eixo. Essa segunda interpretação, pouco lembrada, pode ser reforçada pela afirmação de Virgílio de Melo Franco (o único dos signatários a fazer tal reparo), ao reconhecer a iniciativa getulista quanto a um novo processo de organização política do país: “Desvendando a transparente intenção do cônsul, os homens da resistência democrática, especialmente os de Minas, conspiraram, a bem dizer, em segredo, para elaborar um manifesto que logo se tornou conhecido com a denominação de Manifesto dos mineiros. Quando começou a mudar a sorte das batalhas e o imenso poderio militar e industrial americano passou a pesar na balança, o plano de nosso pequeno Napoleão III tornou-se de uma clareza meridiana. Ele surpreenderia o país com a mesma manobra de 1937, porém pelo avesso: no sentido da democracia.”

O peso regional está presente, portanto, seja no plano da inspiração histórica, seja no plano das motivações políticas mais imediatas. A retrospectiva histórica do documento exalta os valores do passado mineiro, seus heróis e a tradição de suas lutas liberais: Filipe dos Santos, a Inconfidência Mineira, a Revolução de Teófilo Otoni. No plano da política, tratava-se de vencer a frustração das antigas elites mineiras, que se sentiam responsáveis pela ascensão de Getúlio Vargas ao poder, devido ao papel decisivo de Minas Gerais na Aliança Liberal, que consideravam traída. Estas jamais se conformaram, por exemplo, com a nomeação de Benedito Valadares para interventor no estado. Assim, o Manifesto pode ser visto como uma forma elegante — à moda mineira — de luta pelo poder — politicamente aquele grupo mineiro estaria defendendo a sua liberdade de ação enquanto participação política, social e econômica nos destinos da nação. É nesse sentido que a reação do governo, ao recorrer a sanções de alcance profissional, foi considerada “brutal”.

 

A reação do governo: “os leguleios em férias”

A maior parte dos comentários sobre o Manifesto dos mineiros acentua a violência da reação governamental. Essa afirmação deve ser relativizada. Em comparação com a repressão aos movimentos contestatórios de operários, estudantes ou militantes comunistas, a resposta do governo aos signatários do Manifesto pode ser considerada “branda”, pois não houve prisões, violências ou qualquer tipo de punição policial, ou o enquadramento na Lei de Segurança Nacional. Mas se não sofreram violências físicas, por serem membros notórios da elite intelectual e de facções oligárquicas desalojadas do poder, vários signatários foram duramente atingidos por sanções em sua vida profissional, sugeridas pelo ministro da Fazenda Sousa Costa e pelo interventor em Minas Gerais, Benedito Valadares. Assim, com base no artigo 177 da Constituição de 1937, foram demitidos ou aposentados aqueles que trabalhavam em empresas públicas e, nos casos de empresas particulares, o governo recorreu à pressão sobre os proprietários, em geral com êxito.

Foram punidos os seguintes signatários: Adauto Lúcio Cardoso — aposentado do cargo de consultor jurídico do Lóide Brasileiro e exonerado do cargo de consultor jurídico do Ministério da Viação e da presidência do Instituto Nansen; Afonso Pena Júnior — afastado do cargo de advogado do Banco Hipotecário e Agrícola de Minas Gerais (empresa privada); Antônio Neder — exonerado do cargo de juiz de direito em Mangaratiba (RJ); Artur Bernardes Filho — aposentado do cargo de chefe do Departamento Legal e Contencioso da Companhia de Seguros Eqüitativa (empresa privada); Bilac Pinto — aposentado de uma cátedra na Faculdade de Direito da Universidade do Brasil; Daniel de Carvalho — afastado do cargo de diretor da Companhia Siderúrgica Nacional; José de Magalhães Pinto — afastado do cargo de diretor do Banco da Lavoura de Minas Gerais (empresa privada); Luís Camilo de Oliveira Neto — exonerado da chefia do Serviço de Documentação no Ministério das Relações Exteriores; Mário Brant — afastado do cargo de diretor do Banco Hipotecário Lar Brasileiro (empresa privada); Mílton Campos — exonerado da chefia do Serviço Jurídico da Caixa Econômica de Minas Gerais; Odilon Braga — afastado dos cargos de consultor jurídico do Banco do Brasil e de diretor da Companhia Ultragás (empresa privada); Ovídio de Andrade — afastado do cargo de diretor do Banco Comércio e Indústria de Minas Gerais e da Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira (empresas privadas); Pedro Aleixo — afastado do cargo de diretor do Banco Hipotecário e Agrícola de Minas Gerais (empresa privada); Pedro Nava — aposentado do cargo de médico da Assistência Municipal da Prefeitura do Distrito Federal, e Virgílio de Melo Franco — exonerado do cargo de interventor do Banco Alemão Transatlântico.

Dario de Almeida Magalhães e Paulo Pinheiro Chagas escaparam às demissões pela firmeza de Américo Gianetti, diretor da Companhia Mineira de Estradas e Construções, frente às pressões de Valadares; os três professores da Escola de Minas de Ouro Preto, Edmundo Meneses Dantas, Francisco de Assis Magalhães Gomes e Sílvio Barbosa, por sua vez, foram poupados graças à intervenção do então chanceler Osvaldo Aranha, que ponderou sobre a inconveniência da punição devido à repercussão nos meios acadêmicos norte-americanos. Getúlio Vargas referiu-se aos signatários uma única vez, de forma velada e sutilmente irônica, ao discursar na inauguração do novo prédio do Ministério da Fazenda, a 10 de novembro de 1943, logo em seguida à divulgação do Manifesto, acentuando que: “Não temos tempo para desperdiçar na interpretação de fórmulas ideológicas e no exame das conveniências políticas de simples finalidade eleitoral. No fundo da nossa consciência sentiríamos remorso se contribuíssemos para lançar o povo brasileiro nos excessos de uma agitação partidária com o fim de tranqüilizar os pruridos demagógicos de alguns leguleios em férias. É singular e merece reparo irônico que esses inquietos reformadores improvisados, sempre conhecidos no cenário político pelas suas tendências, se exijam em profetas democráticos, exatamente na ocasião em que os povos da velha estrutura representada preferem adiar as convocações à vontade popular e manter os chefes nos seus postos.”

Assim, se na perspectiva de mais de 30 anos o Manifesto pode ser considerado um documento tímido, é inegável que, naquele momento, em se reafirmando o caráter de elite, foi uma manifestação vigorosa, e mesmo corajosa, de pronunciamento político. As demissões e as aposentadorias dos “leguleios em férias” confirmaram, de certa forma, a boutade de Mílton Campos de que o “Manifesto, feito para fazer onda, acabou criando vagas”.

 

A seqüência de manifestações

As tentativas de se promoverem manifestos semelhantes na Bahia (por iniciativa de João Mangabeira) e no Rio Grande do Sul não vingaram, mas o Manifesto dos mineiros tornou-se o precursor de outros documentos de índole igualmente liberal, porém de caráter cada vez mais contestatório. Em dezembro de 1943, Armando de Sales Oliveira, então exilado, divulgou uma Carta aos brasileiros na qual exortava a união dos liberais e chefes militares em defesa da democracia. Em abril de 1944, Dario de Almeida Magalhães, sob o pseudônimo de Timandro, escreveu uma carta ao ministro da Guerra, general Eurico Gaspar Dutra, alertando-o para o cumprimento dos “deveres das forças armadas em face da ditadura”. Em janeiro de 1945, o I Congresso Brasileiro de Escritores, em sua Declaração de princípios, exigiu “completa liberdade de expressão e sufrágio universal, direto e secreto”. Em março de 1945 os professores da Faculdade Nacional de Direito subscreveram um manifesto (redigido por San Tiago Dantas) no qual acentuavam a falta de legitimidade da Carta de 1937 e sugeriam a entrega da chefia da nação ao Judiciário (ao presidente do Supremo Tribunal Federal), como efetivamente ocorreu a 29 de outubro.

 

A trajetória política dos signatários

O Manifesto dos mineiros é considerado o marco inicial da conspiração que desembocaria na fundação da União Democrática Nacional (UDN), a 7 de abril de 1945. Dentre os que se dedicaram ativamente à vida político-partidária da UDN, em mandatos legislativos ou em cargos executivos, destacam-se Adauto Lúcio Cardoso, Afonso Arinos de Melo Franco, Alberto Deodato, Bilac Pinto, José Bonifácio, Mílton Campos, Magalhães Pinto, Odilon Braga e Pedro Aleixo. Artur Bernardes Filho militou no Partido Republicano (PR) e Paulo Pinheiro Chagas na “ala liberal” do Partido Social Democrático (PSD) mineiro. Vários entre aqueles udenistas participaram, em grau maior ou menor, do movimento que depôs o presidente João Goulart em 1964 e assumiram, assim, importantes cargos no governo do marechal Humberto Castelo Branco. Foram, no entanto, afastando-se gradualmente da cena política por discordarem da orientação política e econômica dos governos militares que se sucederam, principalmente a partir da edição do Ato Institucional nº 2, de outubro de 1965. Em 1979, apenas dois signatários permaneciam na política partidária: José Bonifácio e Magalhães Pinto, ambos deputados pela Aliança Renovadora Nacional (Arena) mineira. Antônio Neder, então ministro do Supremo Tribunal Federal, foi eleito pelos seus pares presidente daquela corte.

 

O conteúdo ideológico do Manifesto

A análise do conteúdo ideológico do Manifesto não pode ser desvinculada da origem profissional de seus organizadores. É tipicamente um manifesto de bacharéis e advogados. As palavras iniciais valorizam as raízes da formação mineira e exploram uma consciência legalista. “Queremos que as nossas palavras sejam serenas, sóbrias e claras”, e “este não é um documento subversivo”. O texto discorre sobre alguns temas básicos, sempre com a preocupação de filiar-se à tradição liberal mineira, em função da qual “esta compulsória e prolongada abstinência da vida pública constitui uma violência”. Ressalta, também, o caráter impessoal do documento, ao afirmar que “a prosperidade nos negócios, o êxito nas atividades profissionais... não esgotariam as nossas aspirações, nem resumiriam a nossa concepção do destino humano”. Os temas principais são os seguintes: a defesa dos princípios da Federação e da República realçando-se os males da centralização e da hipertrofia do Executivo; a denúncia do fascismo, como doutrina, e seus arremedos autoritários na prática política, como os ensaios de corporativismo; os reclamos por um tipo de liberalismo político aliado à “democratização da economia”.

Em termos de reflexão história, o Manifesto transcende o paroquialismo mineiro para citar, ao lado dos coestaduanos Teófilo Otoni, Cesário Alvim e João Pinheiro, o alagoano Tavares Bastos, os paulistas José Bonifácio, o Moço, Campos Sales e Prudente de Morais, o baiano Rui Barbosa, os fluminenses Francisco Otaviano e Quintino Bocaiúva e os gaúchos Assis Brasil e Júlio de Castilhos. Como modelos para a organização política e administrativa da nação, são sugeridas as constantes da circular de 19 de setembro de 1860, de Teófilo Otoni, o Manifesto republicano de 3 de dezembro de 1870 e os programas da convenção e do congresso realizados em fevereiro de 1882 e maio de 1884 no Rio Grande do Sul, adaptados às atuais circunstâncias. Apontam-se, também, as constituições de 1891 e 1934, a Carta outorgada em 10 de novembro de 1937, e os documentos básicos das campanhas eleitorais de 1910, 1919, 1922 e 1930. Indica-se, ainda, o estudo da Carta do Atlântico e das recomendações preliminares para os problemas do pós-guerra da Comissão Jurídica Americana.

O documento reconhece a fase de progresso material e a mobilização das riquezas naturais, apontando, entretanto, que outros países obtiveram idênticos resultados sem sacrifício dos direitos cívicos. Toma o documento uma posição defensiva, declarando que não deseja a volta das organizações e práticas políticas anteriores a 1930, condenando “os erros, as corrupções e os abusos daquele regime”, entre os quais aponta “a opressão do estado de sítio, de duvidosa legitimidade e de excessiva duração” — provavelmente o trecho que terá assustado Artur Bernardes, subscritor desprevenido do Manifesto — e afirmando logo a seguir que, exatamente por esse motivo, não pode aceitar a hipertrofia do Poder Executivo. Condena os ensaios de corporativismo e destaca que a supressão da liberdade, a sufocação do espírito público, o cultivo do aulicismo consistem na eliminação da vida política que forma e engrandece as nações.

A crítica do fascismo é feita com toda a veemência, alegando que se o país luta contra o fascismo, ao lado dos Aliados, não é pedir demais reclamar os mesmos direitos e garantias que caracterizam a democracia. Defendendo os postulados democráticos, o Manifesto declara, logo em seguida, que “fácil é inferir que a democracia por nós preconizada não é a mesma do tempo do liberalismo burguês. Não se constitui pela aglomeração de indivíduos de orientação isolada, mas por movimentos de ações convergentes. Preconizamos uma reforma democrática que, sem esquecer a liberdade espiritual, cogite principalmente da democratização da economia”.

Afirma, a seguir, que o tempo do liberalismo passivo já passou, e que é necessário na democracia alguma coisa além das franquias fundamentais do direito de voto, do habeas-corpus e do estabelecimento de garantias constitucionais que se traduzam em efetiva segurança e bem-estar para todos os brasileiros, não só das capitais mas de todo o território nacional. São necessários o espaço aberto aos moços e, finalmente, a liberdade de pensamento, sobretudo do pensamento político.

Termina o Manifesto afirmando que se deve cogitar, “com patriotismo e prudência, da organização política do país no pós-guerra” e conclama a união dos mineiros sobre os ideais vitoriosos em 15 de novembro de 1889, reafirmados solenemente em outubro de 1930, “a fim de que, pela Federação e pela democracia, possam todos os brasileiros viver em liberdade uma vida digna, respeitados e estimados pelos povos irmãos da América e de todo o mundo”.

A interpretação desse discurso político revela que o Manifesto foi mais a expressão de um espírito crítico da situação do que a apresentação de um programa positivo de governo. O problema do trabalho e as questões das classes proletárias estão absolutamente ausentes do Manifesto e nota-se no documento a ambigüidade de ter de reconhecer o programa de realizações materiais que o governo empreendia — negar seria um absurdo — e juntar a isso uma defesa puramente formal das liberdades democráticas. É assim, em conclusão, um dos modelos exemplares para se estudar a história do liberalismo no Brasil.

 

Relação dos signatários do Manifesto

Adauto Lúcio Cardoso, Adolfo Bergamini, Aquiles Maia, Afonso Arinos de Melo Franco, Afonso Pena Júnior, Alaor Prata, Alberto Deodato, Alfredo Carneiro, Viriato Catão, Alfredo Martins de Lima Castelo Branco, Aluísio Ferreira de Sales, Álvaro Mendes Pimentel, André de Faria Pereira, Antônio Carlos Vieira Cristo, Antônio Neder, Artur Bernardes, Artur Bernardes Filho, Artur Soares de Moura, Astolfo Resende, Augusto Couto, Augusto de Lima Júnior, Belmiro Medeiros da Silva, Bilac Pinto, Bueno Brandão, Caio Mário da Silva Pereira, Caio Nélson de Sena, Cândido Naves, Carlos Campos, Carlos Horta Pereira, Carmelindo Pinto Coelho, Dalmo Pinheiro Chagas, Daniel de Carvalho, Dario de Almeida Magalhães, Darci Bessoni de Oliveira Andrade, Edgar de Oliveira Lima, Edmundo Meneses Dantas, F. Mendes Pimentel, Fausto Alvim, Feliciano de Oliveira Pena, Flávio Barbosa Melo Santos, Francisco de Assis Magalhães Gomes, Galba Moss Veloso, Geraldo Resende, Gilberto Alves da Silva Dolabela, Gudesteu Pires, Heitor Lima, J. Sandoval Babo, João do Amaral Castro, João Edmundo Caldeira Brant, João Franzen de Lima, João Romero, Joaquim de Sales, Jonas Barcelos Correia, José de Magalhães Pinto, José Maria Lopes Cançado, José Maria Leão, José do Vale Ferreira, Lincoln Prates, Luís Camilo de Oliveira Neto, Mário Brant, Maurício Limpo de Abreu, Mílton Campos, Múcio Continentino, Nélson de Sena, Otávio Murgel de Resende, Odilon Braga, Ovídio de Andrade, Paulo Pinheiro Chagas, Pedro Aleixo, Pedro Batista Martins, Pedro da Silva Nava, Raul de Faria, Ronan Rodrigues Borges, Salomão de Vasconcelos, Sílvio Marinho, Tristão da Cunha, Virgílio A. de Melo Franco.

Posteriormente, foram apostas as seguintes assinaturas: Agenor Oliveira, Aroeira Neves, Brasil Araújo, Celso Faria Tavares, Cincinato Noronha Guarani, Glenarvan Faria Alvim, Dilermando Cruz, Geraldo Teixeira da Costa, João Resende da Costa, José Bonifácio Lafayette de Andrada, José Urbano Baeta AIvim, Lair de Resende Paleta Tostes, Miguel Batista, Orlando Bonfim, Sílvio Barbosa e Teófilo Ribeiro da Costa Cruz.

Maria Vitória Benevides colaboração especial

 

 

FONTES: CARONE, E. Estudo; CAVALCANTI, O. Insurretos; FRANCO, A. Alma; FRANCO, V. Campanha; HIPÓLITO, L. Manifesto; Manifesto dos mineiros; NABUCO, C. Vida; SILVA, H. 1945; VARGAS, G. Nova.