FRANCO, Itamar
*sen. MG 1975-1989; vice-pres. Rep. 1990-1992; pres. Rep. 1992-1994; emb. Bras. OEA 1996-1998; gov. MG 1999-2003; emb. Bras. Itália 2003-2005; sen. MG 2011
Itamar Augusto Cautiero Franco, de
acordo com sua certidão de batismo, nasceu em Juiz de Fora (MG) no
dia 28 de junho de 1931, filho de Augusto César Stiebler Franco, engenheiro,
falecido poucos dias antes, e de Itália Cautiero Franco. No entanto, o local e
o ano de seu nascimento são motivo de divergências. No título de eleitor, o ano
de nascimento apontado é 1930. Segundo versão largamente aceita, Itamar teria
nascido a bordo de um navio no litoral baiano, tendo sido registrado em
Salvador. O pesquisador Douglas Fazzolato encontrou num cartório da capital
baiana registro segundo o qual ele teria nascido no dia 28 de junho de 1929, na
casa de uma tia. Ainda segundo a pesquisa de Douglas Fazzolato, Itália Cautiero
Franco se transferiu para Juiz de Fora quando o filho tinha quatro meses de
idade.
Em Juiz de Fora, entre 1935 e 1948, Itamar fez os
cursos primário e secundário no Instituto Grambery, formando-se em 1954 em
engenharia civil e eletrotécnica pela Faculdade de Engenharia. Durante o curso
universitário foi presidente da Liga Juiz-Forana de Esportes e, por duas vezes,
do diretório acadêmico de sua faculdade. Nesse período trabalhou como auxiliar
de estatística do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
topógrafo do Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) e
auxiliar-técnico do Serviço Social da Indústria (Sesi).
Ingressou na vida política ainda muito jovem, em
1954, quando concorreu, sem êxito, a uma cadeira na Câmara de Vereadores de
Juiz de Fora na legenda do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Em 1960
candidatou-se a vice-prefeito da cidade, ainda na legenda petebista, novamente
sem sucesso. Com a extinção dos partidos políticos pelo Ato Institucional nº 2
(27/10/1965) e a posterior instauração do bipartidarismo, filiou-se ao
Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido de oposição ao regime militar instaurado
em abril de 1964 após a deposição do presidente João Goulart.
Em novembro de 1966 elegeu-se prefeito de Juiz de
Fora com cerca de 75% do total de votos. Assumiu o cargo no início do ano
seguinte, e em 1968 casou-se com Ana Elisa Surerus, cuja família era
proprietária de um importante curtume. Com ela teria duas filhas.
Em janeiro de 1971 deixou a prefeitura. Integrante
do grupo autêntico do MDB, em novembro de 1972 voltou a eleger-se prefeito,
derrotando Francisco Antônio de Melo Reis, candidato da Aliança Renovadora
Nacional (Arena), partido de sustentação do regime militar, por uma diferença
de 302 votos. Empossado no início de 1973, deixou a prefeitura em maio de 1974
para concorrer ao Senado por Minas Gerais, quando outros líderes oposicionistas
preferiram concorrer à Câmara dos Deputados, temendo uma vitória esmagadora da
Arena nas eleições majoritárias. Realizado o pleito em novembro, derrotou o
candidato arenista José Augusto Ferreira Filho.
No Senado
Empossado em fevereiro de 1975, foi escolhido
vice-líder do MDB e, portanto, da oposição no Senado, para o biênio 1975-1976.
Em agosto desse último ano, quando já se discutia no país o fim do regime
militar, defendeu — após a explosão de uma bomba na sede da Associação
Brasileira de Imprensa (ABI), no Rio de Janeiro — a união dos poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como dos partidos políticos, para
evitar que “uma minoria radical” viesse a “perturbar a marcha do país para a
normalidade democrática”. Afirmou que, “quanto mais rápido for processada a
normalidade institucional, mais rapidamente serão eliminados todos os
movimentos de extrema direita ou de extrema esquerda radicais”. Em 1977 foi
novamente eleito vice-líder da oposição no Senado.
Durante o recesso forçado do Congresso decretado
pelo presidente Ernesto Geisel em abril de 1977, depois da recusa do MDB em
aprovar o anteprojeto de reforma do Judiciário, defendeu, em articulações
políticas, a instauração do parlamentarismo no país através de uma emenda
constitucional. A proposta, contudo, não prosperou. Em 1978, mais uma vez na
condição de vice-líder do MDB no Senado, desenvolveu os primeiros contatos com
o general Euler Bentes Monteiro com vistas ao lançamento da candidatura deste à
presidência da República na eleição indireta de outubro. Em junho defendeu a
adesão do MDB à Frente Nacional pela Redemocratização, organização que lançou a
candidatura de Euler Bentes. Posteriormente, contudo, declarou-se decepcionado
com o candidato, que, segundo ele, “era muito enquadrado para ser da oposição”,
parecendo, na sua opinião, mais governista do que o próprio candidato oficial,
general João Batista Figueiredo. Acusou-o, ainda, de não ter demonstrado
empenho na campanha, recusando-se a participar de debates com estudantes em
Brasília, além de ter falhado nas previsões sobre as possibilidades de obtenção
de apoio em setores militares e em dissidências da Arena. No dia 15 de outubro
de 1978, o Colégio Eleitoral elegeu Figueiredo, que obteve 355 votos contra 226
dados a Euler Bentes.
No início do governo do general Figueiredo,
empossado em março de 1979, Itamar Franco foi designado presidente da comissão
parlamentar de inquérito (CPI) criada para averiguar o acordo nuclear assinado
entre o governo brasileiro e a Alemanha Ocidental. Nessa condição, opôs-se à
construção das usinas nucleares Angra III e Angra IV. Membro da comissão mista
do Congresso encarregada de examinar o projeto de anistia do governo, visitou
em agosto, juntamente com parlamentares oposicionistas e líderes sindicais, os
14 presos políticos detidos no presídio Mílton Dias Moreira, no Rio de Janeiro,
que se encontravam em greve de fome havia 16 dias, reivindicando a aprovação de
um projeto de anistia ampla, geral e irrestrita. No dia 29 de agosto o projeto
de anistia do governo, que era mais restrito, foi aprovado pelo Congresso.
Em outubro de 1979, quando as propostas de
reformulação partidária encaminhadas pelo governo já estavam em discussão,
Itamar propôs que o MDB apresentasse alternativas, em vez de apenas rejeitar as
teses do Executivo. Com a aprovação do projeto governamental que extinguiu o
bipartidarismo, em 29 de novembro, e a consequente volta ao pluripartidarismo,
filiou-se ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Em seguida
defendeu a legalização do Partido Comunista Brasileiro (PCB), cujos militantes
atuavam no interior do PMDB. Disse que esta seria uma forma de diminuir
divergências no interior da legenda e de isolar parlamentares radicais que,
segundo ele, não respeitavam “nem o Congresso Nacional nem o pacto social que o
novo partido firmou”.
Como membro da comissão mista que examinava a
prorrogação dos mandatos de prefeitos e vereadores, em agosto de 1980
pronunciou-se contra a emenda constitucional de autoria do deputado Anísio de
Sousa, do Partido Democrático Social (PDS), que propunha o adiamento das
eleições municipais — marcadas para novembro de 1980 — para dois anos depois,
quando se realizariam as eleições legislativas e para os governos estaduais. O
projeto do deputado governista acabou sendo aprovado naquele mesmo mês.
Naquela legislatura foi ainda membro das comissões
de Serviço Público Civil e de Relações Exteriores do Senado. No pleito
seguinte, em novembro de 1982, reelegeu-se senador na legenda do PMDB. Seu
companheiro de chapa, Tancredo Neves, elegeu-se governador de Minas Gerais.
Empossado em fevereiro de 1983, Itamar presidiu a Comissão de Finanças
(1983-1984) e integrou a Comissão de Relações Exteriores do Senado (1983-1986).
Como um dos fundadores do grupo parlamentar Só
Diretas, foi o último peemedebista a aderir à política de participação nas
eleições indiretas para a sucessão do presidente João Figueiredo. Essa
alternativa acabou se impondo pelo fato de a emenda Dante de Oliveira, que
propunha o restabelecimento das eleições diretas para presidente já em novembro
de 1984, ter sido derrotada na Câmara em 25 de abril daquele ano. No Colégio
Eleitoral reunido em 15 de janeiro de 1985, Itamar votou no oposicionista
Tancredo Neves, candidato da Aliança Democrática, coligação entre o PMDB e a
dissidência do PDS abrigada na Frente Liberal, que derrotou o candidato do
regime militar, Paulo Maluf. Contudo, por motivo de doença, Tancredo não chegou
a ser empossado na presidência, vindo a falecer em 21 de abril de 1985. Seu
substituto foi o vice José Sarney, que já vinha exercendo interinamente o cargo
desde 15 de março.
Quando a convenção do PMDB mineiro, reunida em
agosto de 1986, decidiu apoiar Newton Cardoso, ex-prefeito de Contagem, na
sucessão do governador Hélio Garcia (PMDB), Itamar se transferiu para o Partido
Liberal (PL). No mês seguinte, lançou-se candidato ao governo com o apoio da
Coligação Movimento Democrático Progressista, que reunia o PL, o Partido da
Frente Liberal (PFL), o Partido Democrático Trabalhista (PDT), o Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB), o PCB e o Partido Socialista Brasileiro (PSB). Foi apoiado,
também, por dissidentes peemedebistas descontentes com a administração de Hélio
Garcia, como José Aparecido de Oliveira, então governador do Distrito Federal,
o deputado João Pimenta da Veiga Filho, líder do partido na Câmara, e vários
prefeitos mineiros. Contudo, realizado o pleito em 15 de novembro, foi
derrotado por Newton Cardoso, por uma diferença de 1% dos votos. O PMDB
conquistou naquelas eleições o governo de outros 21 estados e mais da metade
das cadeiras no Congresso, graças ao sucesso inicial do Plano Cruzado —
programa de estabilização econômica baixado em fevereiro daquele ano pelo
presidente José Sarney (1985-1990).
De volta à atividade parlamentar, Itamar participou
dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, iniciados em 1º de fevereiro
de 1987 e encerrados em 5 de outubro do ano seguinte com a promulgação da nova
Carta. Líder do PL no Senado no período 1987-1988, foi segundo-vice-presidente
da Subcomissão do Poder Legislativo, da Comissão da Organização dos Poderes e
Sistema de Governo, e suplente da Comissão de Sistematização.
Nas principais votações da Constituinte, foi a
favor do rompimento das relações diplomáticas do Brasil com os países que
desenvolvessem uma política de discriminação racial, do mandado de segurança
coletivo, da remuneração 50% superior para o trabalho extra, da jornada semanal
de 40 horas, da legalização do aborto, do turno ininterrupto de seis horas, do
aviso prévio proporcional ao tempo de serviço quando da demissão de um
trabalhador, da unicidade sindical, da soberania popular, do voto aos 16 anos,
da nacionalização do subsolo, da estatização do sistema financeiro, do limite
de 12% ao ano para os juros reais, da proibição do comércio de sangue, de uma
limitação do pagamento dos encargos da dívida externa, da criação de um fundo
de apoio à reforma agrária, da legalização do jogo do bicho e da desapropriação
até de propriedades produtivas para fins de reforma agrária. Votou contra a pena
de morte, o presidencialismo, o mandato de cinco anos para o presidente José
Sarney e a anistia às dívidas de micro e pequenos empresários. Absteve-se de
votar sobre a limitação do direito de propriedade privada.
Foi, também, primeiro-vice-presidente da CPI
instalada em abril de 1988 para apurar denúncias de corrupção contra o ministro
do Planejamento, Aníbal Teixeira. A CPI atingiu outros setores do governo,
inclusive o presidente José Sarney, que foi interpelado em maio no Supremo
Tribunal Federal (STF). As investigações duraram oito meses, e o relator,
senador Carlos Chiarelli, divulgou no dia 2 de novembro suas conclusões finais.
Foram acusados de crime de responsabilidade o presidente Sarney, o
consultor-geral da República, Saulo Ramos, quatro ex-ministros e mais 27
pessoas. No dia seguinte, por nove votos contra um, a CPI aprovou o relatório.
Em 22 de fevereiro de 1989, contudo, a Câmara dos Deputados determinou o
arquivamento da denúncia contra o presidente.
Ainda no início de 1989, Itamar Franco aceitou
convite de Fernando Collor de Melo, governador de Alagoas, para concorrer, como
candidato a vice-presidente na chapa do inexpressivo Partido da Reconstrução
Nacional (PRN) por ele encabeçada, à sucessão do presidente José Sarney nas
eleições de novembro daquele ano. Collor, que na ocasião tinha apenas 2% das
intenções de voto, já havia oferecido a dobradinha a outros políticos, sem
êxito. O nome de Itamar, então sem partido e em fim de mandato no Senado, lhe
interessava para compor a chapa, por se tratar de alguém que tinha a imagem de
político honesto e contava com uma boa base eleitoral em Minas Gerais.
Apresentando-se como oposicionista radical ao
presidente José Sarney e campeão da luta contra a corrupção, e defendendo um
programa econômico modernizador e liberal, Collor rapidamente cresceu nas
pesquisas de intenção de voto, superando os demais candidatos. A participação
de Itamar na campanha eleitoral foi tumultuada e, em decorrência de conflitos
com a coordenação dos trabalhos em Minas Gerais, ele chegou a ameaçar renunciar
à candidatura em duas ocasiões.
No primeiro turno concorreram 25 chapas. Realizada
a eleição em 15 de novembro, a do PRN foi a mais votada, seguida pela do
Partido dos Trabalhadores (PT), encabeçada por Luís Inácio Lula da Silva, tendo
o senador gaúcho José Paulo Bisol (PSB) como vice. No segundo turno, disputado
em 14 de dezembro, a chapa Collor-Itamar, apoiada por ampla coalizão de
centro-direita, saiu vencedora com 42,75% dos votos, contra 37,86% dados à
chapa encabeçada por Lula.
Na Vice-Presidência
Empossado o novo governo em 15 de março de 1990,
Itamar logo foi se afastando de Collor. Mantido à margem da elaboração do plano
de estabilização econômica apresentado no dia seguinte à posse — que teria
grande impacto sobre o cotidiano da população, inclusive com o confisco dos
depósitos em poupança —, divergiu de importantes aspectos da política
econômico-financeira do governo.
A primeira manifestação pública de discordância só
aconteceu, porém, em julho de 1991. Exercendo interinamente a presidência,
Itamar criticou a privatização da Usiminas, afirmando que a operação
prejudicaria a economia de Minas Gerais, onde ficava a sede da empresa. No mês
seguinte, criticou o próprio programa de privatização do governo, que, no seu
modo de ver, contribuía para enfraquecer o Estado brasileiro. Em setembro,
contudo, recuaria, reconhecendo que, como vice-presidente, suas posições
pessoais deveriam subordinar-se às razões do governo.
Não deixou, porém, de agir politicamente.
Participou, juntamente com o ex-governador Aureliano Chaves, parlamentares,
principalmente mineiros, o PDT, o procurador-geral da República Aristides
Junqueira, e o PT, de articulações contra a venda da Usiminas. Fazia questão de
esclarecer que não era contrário à privatização, mas apenas à forma como ela
vinha sendo implementada. Afirmava que não havia por que privatizar empresas
que davam lucro, como era o caso da Usiminas. Questionava, também, a aplicação
dos fundos obtidos com a venda das empresas, que deveriam, no seu modo de ver,
dirigir-se a investimentos na área social, em educação, segurança e saúde. Em
novembro voltou a se chocar com a orientação oficial ao defender a aplicação do
índice de 147% no reajuste das aposentadorias, considerada inviável pelo
governo, mas confirmada pelo STF em fevereiro do ano seguinte.
Outra importante divergência aconteceu ainda em
julho de 1991. Itamar defendeu a instituição de uma política salarial que
protegesse as classes menos favorecidas, proposta por técnicos da área
econômica, mas recusada por Collor com base em parecer do ministro da Justiça,
Jarbas Passarinho, que defendia a manutenção do princípio da livre negociação
preconizado pela ministra da Economia, Zélia Cardoso de Melo. A preocupação com
os níveis de emprego o levou, pouco tempo depois, a defender a adoção de uma
estratégia de combate à inflação que, mantendo-a em níveis razoáveis,
permitisse ao país retomar o desenvolvimento econômico.
Em maio de 1992, após a reforma ministerial
efetuada por Collor em abril, Itamar desligou-se do PRN e, em carta a Collor,
criticou seriamente o perfil do novo ministério, apontando a participação de
elementos conservadores que, a seu ver, deveriam ser alijados da vida pública.
Embora tivesse recebido convites de diversos partidos, declarou que não
pretendia filiar-se imediatamente.
O desencadeamento de uma sucessão de denúncias de
corrupção contra o governo Collor e de uma campanha para desalojá-lo do poder
levou Itamar a acentuar publicamente suas diferenças em relação ao presidente.
Em junho de 1992 fez questão de não deixar sem resposta um raciocínio que o
governador baiano Antônio Carlos Magalhães desenvolveu em entrevista à
revista IstoÉ, segundo o qual o vice teria
legitimidade, mas não representatividade para assumir a presidência em caso de
impedimento de Collor. Itamar divulgou nota defendendo a “união nacional em
torno da legalidade” e o respeito à Constituição. Dois dias depois,
proclamou-se isento das acusações de corrupção que vinham sendo feitas ao
governo e reafirmou que estava pronto para assumir a presidência no caso da
decretação do impeachment de Collor, exigido pela oposição e
por entidades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e
a Associação Brasileira de Imprensa (ABI).
Na época formou-se no Senado um grupo
suprapartidário para oferecer ao vice a estrutura política de que necessitaria
no caso do afastamento de Collor — o “cinturão do Itamar” ou “república dos
senadores”. Seus participantes mais destacados eram Pedro Simon (PMDB-RS),
Maurício Correia (PDT-DF), Alexandre Costa (PFL-MA) e José Sarney (PMDB-AP),
além do deputado Jamil Haddad (PSB-RJ). Por outro senador, Fernando Henrique
Cardoso (PSDB-SP), Itamar ficou sabendo que, devido à sua tradição estatizante
e nacionalista, despertava apreensões em setores que defendiam as reformas de
cunho liberal e a abertura da economia. Por isso, através do senador Albano
Franco (PRN-SE), presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), tentou
mudar sua imagem junto aos empresários, explicando suas posições contra a
política econômica recessiva e o processo de privatização. Chegaria mesmo, em
declarações à imprensa, a negar sua identificação com postulados nacionalistas
e estatizantes, afirmando-se simpático ao ideário neoliberal, então francamente
predominante entre os dirigentes políticos na maior parte dos países.
Fora do Congresso, representantes de um amplo leque
político que ia do PT ao ex-presidente José Sarney mobilizavam-se para tecer
uma aliança em torno de um duplo objetivo: conseguir o impeachment de
Collor e garantir a posse do vice. O senador Fernando Henrique Cardoso,
particularmente, empenhava-se em convencer Itamar a fazer um governo de união
nacional. De sua parte, embora procurasse não dar a impressão de conspirar
contra o presidente, Itamar participava ativamente das articulações. Dos
principais partidos, só não aceitava que integrasse seu provável futuro governo
o PFL, cujos principais líderes, aliás, não faziam segredo de que consideravam
remotas as possibilidades de que o vice assumisse no caso de aprovação do impeachment de
Collor.
Com o agravamento da crise no segundo semestre de
1992, Itamar passou a encarnar a possibilidade de uma solução constitucional,
dando prosseguimento normal ao mandato que tinha sido conferido a Collor até a
posse do presidente a ser eleito em 1994. Tomou providências nesse sentido,
como a formação de um grupo, composto de economistas ligados à Fundação Getúlio
Vargas e ao Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), encarregado
de esboçar as linhas de ação de seu governo, que deveria privilegiar a retomada
do crescimento econômico. Fez também contatos com o economista André Lara
Resende, defensor da dolarização da economia nacional como estratégia
anti-inflacionária.
Na presidência interina
Acusado de envolvimento num esquema de corrupção e
tráfico de influência, Fernando Collor afinal deixou a presidência em 2 de
outubro de 1992, depois que a Câmara dos Deputados, em sessão de 29 de
setembro, decidiu por ampla maioria autorizar a abertura do processo de impeachment do
presidente. Naquele mesmo dia, Itamar assumiu o cargo interinamente, até que o
titular fosse julgado no Senado. Não houve solenidade de posse. Itamar fez
apenas um breve pronunciamento em que destacou a situação de normalidade democrática
que aquela transição representava e anunciou que seu governo seria transparente
e não abrigaria corruptos.
A posse de Itamar foi bem recebida pela população.
O presidente propôs uma política de entendimento nacional, mas a composição do
ministério provocou surpresa nos meios políticos e empresariais, assim como a
ampliação do número de pastas, com o desmembramento de algumas já existentes e
a elevação das secretarias de Ciência e Tecnologia e de Cultura ao status de
ministério. Itamar foi criticado por escolher nomes de seu círculo de amigos,
sem expressão política nacional, como Paulo Roberto Haddad (ligado ao PSDB-MG)
para o Planejamento, Murílio Hingel (PMDB-MG) para Educação e Henrique
Hargreaves (PFL-MG) para o Gabinete Civil. Para as demais pastas, as
indicações, com exceção das militares, foram feitas pelos partidos que estavam
apoiando o governo: Alberto Goldman (PMDB-SP) para os Transportes; Alexandre
Costa (PFL-MA) para a Secretaria de Integração Regional; Antônio Brito
(PMDB-RS) para a Previdência Social; Antônio Houaiss (PSB-RJ) para a Cultura;
Fernando Coutinho Jorge (PMDB-PA) para o Meio Ambiente; Fernando Henrique
Cardoso (PSDB-SP) para Relações Exteriores; Gustavo Krause (PFL-PE) para a
Fazenda; Hugo Napoleão (PFL-PI) para Comunicações; Jamil Haddad (PSB-RJ) para a
Saúde; Israel Vargas para Ciência e Tecnologia; José de Castro Ferreira para a
Consultoria Geral da República; José Eduardo Andrade Vieira (PTB-PR) para
Indústria e Comércio; Jutaí Magalhães (PSDB-BA) para o Bem-Estar Social; Lásaro
Barbosa (PMDB-GO) para Agricultura; Mário César Flores para a Secretaria de
Assuntos Estratégicos; Maurício Correia (PDT-DF) para a Justiça; Mauro Durante
para a Secretaria Geral da Presidência; Paulino Cícero (PSDB-MG) para Minas e
Energia; Pedro Simon (PMDB-RS) para a Coordenadoria Política, e Válter Barelli
(simpatizante do PT-SP) para o Trabalho. Os ministros militares foram Zenildo
Zoroastro de Lucena, do Exército, Ivan Serpa, da Marinha, Lélio Viana Lobo, da
Aeronáutica, Fernando Cardoso, do Gabinete Militar, e Antônio Luís da Rocha
Veneu, do Estado-Maior das Forças Armadas.
Ao empossá-los, Itamar fez um pronunciamento sobre
o sentido geral que daria ao governo. A primeira tarefa seria colocar, em
caráter de urgência, a administração de fato a serviço do Estado, e este, a
serviço da nação. Aludindo à política econômica adotada por seu antecessor,
anunciou que o governo desceria ao “áspero solo da realidade” para repelir a
noção de modernidade “criminosa e cruel” que negava ao povo “a dignidade do pão,
do alfabeto, do trabalho honrado, da saúde e da alegria”. Criticou também os
que pregavam o enfraquecimento do Estado: “Se o Estado não servir para promover
a paz, a justiça e o bem-estar entre os homens, para que servirá?”
A situação econômico-social do país não era das
mais alvissareiras. A taxa de inflação chegara à casa dos 20% mensais. Apesar
de ligeira recuperação do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) após dois
anos de recessão, o desemprego não caía. Itamar Franco garantiu, porém, que não
aplicaria choques econômicos. O programa de 13 pontos apresentado como base da
política econômica do novo governo excluía confiscos, dolarização, congelamento
ou prefixação unilateral de preços. Por outro lado, o governo anunciou a
manutenção da política de juros altos e a contenção de gastos públicos e
informou que tentaria aprovar no Congresso uma proposta de ajuste fiscal de
emergência para vigorar já no ano seguinte.
Dando prosseguimento à orientação que vinha da
gestão de Collor, o governo procedeu, na segunda semana de outubro, à sua
primeira privatização: a venda da Acesita. Em seguida, contudo, Itamar
determinou o adiamento do programa de desestatização para março de 1993, além
de baixar decreto que ampliava a parcela de dinheiro vivo a ser usado obrigatoriamente
na compra das empresas. Recuou também em relação à reforma fiscal de
emergência, afirmando que faria, ainda em 1992, uma reforma tributária “ampla e
profunda” para combater a inflação e evitar que o país passasse por
conflagrações sociais.
Em 27 de novembro, finalmente, anunciou que
resolvera adiar a apresentação de seu plano econômico de curto e médio prazo
para depois do julgamento de Collor. A decisão forneceu argumentos para os que
o acusavam de inseguro com a condição de interino, mas deveu-se também à
ausência de consenso no interior da equipe econômica quanto a questões
cruciais. Uma delas, talvez a mais delicada, era a política de privatizações,
motivo de intensa disputa que estava sendo vencida pela corrente mais
estatizante, que tinha um ponto de vista mais próximo do do presidente. As
consultas paralelas a economistas e as críticas à política econômica geraram
uma crise ministerial. Gustavo Krause demitiu-se em 16 de dezembro, ficando sua
pasta, provisoriamente, a cargo de Paulo Haddad.
Na Presidência em Caráter Definitivo
Com a renúncia de Collor, seguida de sua condenação
pelo Senado, em 29 de dezembro, Itamar Franco foi empossado definitivamente na
presidência da República. Na ocasião, anunciou seu plano econômico, atribuído a
Paulo Haddad. As principais metas seriam o combate à miséria, começando pelo
restabelecimento dos programas de distribuição de alimentos básicos; a criação
de empregos, através de programas de saneamento básico e de construção de casas
populares; a luta contra a inflação por meio do ajuste fiscal; e a retomada do
crescimento, com investimentos em energia, telecomunicações, estradas e
habitação. O governo fez um esforço para que o Congresso aprovasse logo três
projetos: estabelecimento de regras mais rígidas para a rolagem das dívidas de
estados e municípios, alterações nas regras do processo de privatização, e
ajuste fiscal. O sentido geral do programa contrariava o viés liberal do
governo anterior.
Itamar começou a discutir um pacto de
governabilidade para enfrentar os problemas gerados pela escalada
inflacionária, reunindo-se, no dia 8 de janeiro de 1993, com os presidentes de
19 partidos políticos. Com o mesmo objetivo, renovou suas consultas a
economistas de orientação variada, como Afonso Celso Pastore e o deputado
Antônio Delfim Neto (PPR-SP), ambos importantes colaboradores do regime
militar, Dércio Munhoz de Barros e o deputado José Serra (PSDB-SP). Não deixou,
porém, de tomar algumas decisões que geraram polêmica, como o decreto que
alterou as regras de privatização de empresas estatais, dotando o presidente de
poderes para intervir no processo de venda e fixar a quantidade de dinheiro
vivo a ser exigida em cada operação, proibindo os fundos de pensão das empresas
estatais de participar dos leilões — medida suspensa pouco tempo depois, por
falta de amparo legal — e criando mecanismos de proteção aos empregados das
estatais privatizadas contra futuras demissões. O decreto baixado em 19 de
janeiro foi interpretado como uma tentativa de retardar o programa de
desestatização.
Ainda em janeiro, o governo fez significativo
esforço para ampliar sua base de apoio, com a nomeação da petista Luísa
Erundina, ex-prefeita de São Paulo, que aceitou assumir a Secretaria de
Administração, a despeito da orientação contrária de seu partido. Alguns dias
depois, Yeda Crusius, do PSDB gaúcho, assumiu o Ministério do Planejamento,
advertindo que as elevadas taxas de juros estavam insuportáveis e que era
necessário firmar um pacto social em torno do combate à inflação. No último dia
de fevereiro, contudo, Paulo Haddad pediu demissão do Ministério da Fazenda,
depois de ter sido criticado publicamente por Itamar, que lhe dera o prazo de
três meses para controlar a inflação. Para seu lugar foi nomeado imediatamente
Eliseu Resende, então presidente da Eletrobrás. O novo ministro anunciou
que o presidente permanecia decidido a não adotar choques econômicos nem
congelamentos e iniciou a redução das taxas de juros reais, o que seu
antecessor se recusara a fazer.
A situação financeira do país dava mostras de
deterioração progressiva. O orçamento federal aprovado em início de março
apresentava uma redução de cerca de seis bilhões de dólares nas verbas
referentes a programas sociais, explicada pelo governo como resultado da queda
nas receitas a eles destinadas, principalmente a Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social (Cofins), que não estaria sendo devidamente
paga pelas empresas. No dia 10, o Senado aprovou uma emenda sobre reforma
fiscal, com modificações no projeto inicial que praticamente o reduziu à
criação do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF): calculado
em 0,25% do valor de todos os cheques emitidos até dezembro de 1994, o IPMF
deveria arrecadar para o governo 600 milhões de dólares por mês.
Logo após o governo reativar o programa de
privatização, com a venda da Poliolefinas, em 19 de março, e da Companhia
Siderúrgica Nacional (CSN), em 5 de abril, o Brasil foi acusado pelo Senado
norte-americano, em 19 de abril, de ser um dos países que mais violavam os
direitos de propriedade intelectual e foi ameaçado de retaliações comerciais.
Ainda naquele mês, o Congresso brasileiro aprovou a nova lei sobre patentes
industriais, o que evitou que as ameaças se concretizassem.
O Plano Real
Fortalecido pelo resultado do plebiscito que, em 21
de abril, manteve a forma republicana de governo e o regime presidencial no
país, três dias depois Itamar Franco apresentou o plano econômico elaborado
pelo ministro da Fazenda, Eliseu Resende. Seus principais objetivos eram reduzir
a especulação financeira, combater a corrupção e retomar o crescimento
econômico. Em seguida iniciou, no dia 7 de maio, mais uma rodada de mudanças
ministeriais, que incluíram a substituição de Yeda Crusius no Ministério do
Planejamento por Alexis Stepanenko, vice-presidente do Banco Nacional do
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
As mudanças ministeriais foram interpretadas por
membros do governo como um indicador da influência do ministro da Fazenda.
Luísa Erundina chegou a promover contatos com representantes da esquerda para
encontrar formas de fazer frente ao fortalecimento de Eliseu Resende. Em
resposta, Itamar divulgou nota recomendando que deixassem o governo os
ministros que o criticavam. No dia 19 de maio Erundina foi demitida e substituída
pelo general da reserva Romildo Canhim. Nesse mesmo dia, Eliseu Resende, que
vinha sendo acusado de ter beneficiado irregularmente uma empreiteira em
contratos para a realização de obras no exterior, pediu demissão. Para seu
lugar foi nomeado o ministro das Relações Exteriores, Fernando Henrique
Cardoso.
O novo ministro da Fazenda assumiu o cargo em 21 de
maio, tendo sido bem aceito. Dos órgãos de imprensa ao Fundo Monetário
Internacional (FMI), predominou a opinião de que se tratava de uma escolha acertada
para o combate à inflação. A situação econômica apresentava melhoras, havendo
uma recuperação das importações e das atividades industriais. A inflação,
contudo, permanecia ascendente, chegando a 30% mensais em junho. Fernando
Henrique anunciou ter recebido carta branca do presidente para conduzir a
economia e até intervir nas decisões do Ministério do Planejamento. Em sua
assessoria, cercou-se de economistas que haviam participado da elaboração do
Plano Cruzado em 1986. A escolha alimentou especulações sobre a iminente adoção
de novo choque anti-inflacionário, levando o ministro, em seus primeiros
pronunciamentos, a deixar claro que não proporia qualquer plano milagroso. A
chave do problema da inflação, no seu modo de ver, não estava na economia, cujos
números eram os mais animadores, mas na crise do Estado, com seu déficit
crônico. O combate à inflação deveria, portanto, articular-se estrategicamente
com a reforma do Estado, privatizações e redução dos gastos públicos.
No início de junho foi apresentado o Plano de Ação
Imediata, cuja meta básica era a redução de seis bilhões de dólares nos gastos
públicos. Os cortes atingiram duramente a área social. As verbas destinadas aos
ministérios da Saúde e do Bem-Estar Social foram reduzidas em 43% e as do Ministério
da Educação em 25%. No dia 28 do mês seguinte, quando a inflação acumulada no
ano chegava à faixa dos 500%, o governo decretou o corte de três zeros da moeda
nacional, que passou a chamar-se cruzeiro real. A essa altura, a equipe do
Ministério da Fazenda começava a conceber uma proposta de revisão
constitucional para viabilizar a reforma do Estado e eliminar o déficit fiscal,
a ser apresentada ao Congresso revisor que se reuniria em 6 de outubro, para
funcionar simultaneamente à legislatura ordinária, conforme deliberação da
Assembleia Constituinte em 1988.
Enquanto cresciam os boatos de que estaria para ser
aplicado um novo choque econômico contra a inflação, o governo privatizou a
Açominas no dia 10 de setembro. Alguns dias depois, o ministro da Fazenda
anunciou a liberalização do câmbio, que passaria a flutuar livre da
interferência do Banco Central. A medida visava a extinguir as condições de
funcionamento do mercado paralelo de divisas, bem como a preparar a vinculação
da economia nacional ao dólar e reduzir a expectativa inflacionária imediata. A
estratégia da equipe econômica sofreu, porém, uma derrota com a decisão do STF
de suspender até 31 de dezembro a cobrança do IPMF, em resposta à ação de
inconstitucionalidade impetrada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores no
Comércio (CNTC).
As intervenções do governo na área financeira e a
resistência da inflação já no terceiro mês da gestão do novo ministro da
Fazenda acentuavam os rumores acerca de um suposto conjunto de medidas, que
incluiria nova troca de moeda e a adoção da âncora cambial. A revista Veja de
15 de setembro comentou o assunto, assegurando que se tratava de boato e que o
verdadeiro plano continuava indefinido, embora com seu anúncio marcado para
outubro. O plano autêntico estaria sendo concebido por uma equipe de
economistas integrada, entre outros, por Winston Fritsch, que, ao viajar para
Washington, onde participaria da reunião anual do FMI, revelou à imprensa que
apresentaria a essa entidade um programa de desindexação da economia que o
governo estava preparando, com medidas nas áreas cambial, fiscal e monetária. A
declaração dava a entender que o governo prestava contas de sua política
econômica ao FMI e provocou enérgica reação do presidente Itamar Franco, que
exigiu do economista “uma reparação pública da imagem do país”. No dia 24, o
ministro Fernando Henrique Cardoso desmentiu a existência do plano.
A aprovação, em 8 de outubro, de um novo modelo de
privatização, que passaria integralmente à jurisdição do Ministério da Fazenda,
além de ampliar o número de estatais abrangidas pelo programa de
desestatização, que incluiu a quebra parcial dos monopólios da Petrobras e
Eletrobrás, voltou a gerar boatos, agora sobre possíveis divergências entre o
presidente e o ministro da Fazenda. Em sua edição de 27 de outubro, a
revista Veja afirmava que Itamar resistia à maioria das
iniciativas propostas por Fernando Henrique Cardoso, inclusive às referentes a
emendas constitucionais necessárias para o ajuste fiscal. As medidas na área
econômica, de fato, provocavam divisões entre os auxiliares de Itamar. No dia
14 de novembro, o líder do governo na Câmara, Roberto Freire (PPS-PE),
demitiu-se por discordar da orientação do Ministério da Fazenda, principalmente
da resistência que o ministério demonstrara a reintegrar os servidores públicos
demitidos no governo Collor.
O Ministério da Fazenda, porém, não alterava o rumo
de sua gestão. Ainda em novembro baixou um conjunto de medidas destinadas a
criar condições para a implantação de um plano de estabilização econômica,
entre as quais uma sobretaxa de 5% para todos os impostos, cortes nas despesas
do orçamento do ano seguinte e a extinção de ministérios. No dia 7 de dezembro,
finalmente, Fernando Henrique, que em outubro tivera seu nome indicado pelo PSDB
como candidato à presidência da República nas eleições de 1994, anunciou o
Plano de Estabilização Econômica do governo. Seus principais pontos diziam
respeito ao ajuste fiscal, que seria perseguido, basicamente, por meio de
cortes radicais nos gastos públicos, e à preparação de uma nova moeda,
antecedida pela adoção da Unidade Real de Valor (URV), que passaria a funcionar
progressivamente como indexador único da economia.
Entre os parlamentares, a reação ao programa foi,
em geral, negativa. O governo foi acusado de não ter tentado negociar
previamente com os partidos as medidas, principalmente a elevação das alíquotas
dos impostos e contribuições. Mesmo no partido do ministro da Fazenda, o PSDB,
houve resistências ao plano, visto como rígido demais para um ano eleitoral.
O ponto que maiores divergências suscitou foi,
porém, a criação do Fundo Social de Emergência (FSE), dispositivo orçamentário
baseado na desvinculação de tributos e contribuições sociais de suas
destinações originais, definidas pela Constituição. Pela emenda constitucional
que o criou, o FSE financiaria as áreas de saúde, educação, benefícios
previdenciários, auxílios assistenciais e outros programas de relevante
interesse econômico e social. Os recursos viriam da incorporação direta de parcelas
de alguns tributos e da realocação de cerca de 20% das receitas arrecadadas por
todos os impostos e contribuições instituídos pela União, o que reduziria o
montante das transferências para estados e municípios determinadas pela
Constituição. Dessa forma, o governo disporia de soma considerável de recursos
para fazer face, com total autonomia, às despesas do Estado.
Portanto, ao contrário dos fundos sociais
concebidos pelo Banco Mundial como um contrapeso às políticas de estabilização
econômica por ele mesmo impostas aos países em dificuldades financeiras, como o
FSE instituído pela Bolívia em 1987, o FSE brasileiro apresentava um nítido
caráter contábil, subordinado à política de ajuste fiscal. O desvirtuamento das
transferências financeiras para estados e municípios e da alocação de recursos
para a área social constituíram empecilhos para sua imediata aprovação pelo
Congresso.
No dia 13 de dezembro, o Banco Central elevou a
taxa de juros, adequou a cotação do dólar às expectativas inflacionárias do mês
e promoveu leilões de câmbio para unificar as cotações do dólar comercial e
flutuante, medidas preparatórias para a adoção da URV. Em seguida, o governo
obteve importante vitória no campo fiscal, com a decisão do STF de autorizar a
cobrança do IPMF, embora somente a partir de 1994.
A conjuntura eleitoral era um elemento complicador
para o governo. Para antecipar a desincompatibilização dos ministros que
pretendessem se candidatar em 1994, Itamar Franco promoveu em 20 de dezembro
nova reforma ministerial. Por esse motivo, deixaram os cargos na ocasião seis
ministros, além do chefe do Gabinete Civil, Henrique Hargreaves, e o ministro
da Integração Regional, Alexandre Costa, que renunciaram por terem sido
envolvidos nas denúncias feitas pela comissão parlamentar mista de inquérito
instalada em outubro para investigar suspeitas de corrupção por parte de
integrantes da Comissão de Orçamento do Congresso. Alguns dias depois, alegando
divergências em relação a cortes de verbas que atingiriam sua área no ano seguinte,
o ministro da Cultura, Jerônimo Moscardo, também renunciou.
Ao findar o ano de 1993, a inflação, segundo dados
divulgados pela Fundação Getúlio Vargas em 29 de dezembro, tinha alcançado a
mais alta taxa anual da história brasileira: 2.567,46%. Ainda assim, graças ao
crescimento das exportações — entre 1990 e 1993 as vendas no interior do
Mercado Comum do Sul (Mercosul) quase triplicaram — e à redução em quase 50%
dos juros reais no primeiro semestre do ano, o PIB alcançara a melhor taxa de
crescimento da década: 4,5%.
A implantação do Plano de Estabilização Econômica
encontrava, porém, resistências na comunidade financeira internacional.
Informações obtidas junto a dirigentes do Banco Mundial e do FMI davam conta do
pessimismo com que era visto o plano de Fernando Henrique Cardoso. O motivo
principal da desconfiança seria o próprio presidente Itamar Franco, que, devido
a suas atitudes favoráveis à retomada do crescimento econômico e contrárias à
privatização generalizada, era criticado pelas duas entidades, de cujo aval o
governo brasileiro dependia para concluir o acordo da dívida externa com os
bancos privados. A data marcada para a conclusão do acerto era abril de 1994,
mas informações oficiosas davam conta de que, se a inflação não tivesse
declinado até lá ou não apresentasse franca tendência à queda, o aval não seria
concedido.
O governo prosseguia, contudo, tomando as
providências que considerava necessárias para combater a inflação. Em 31 de
janeiro de 1994, depois de intensas negociações com o Congresso em torno do
ajuste fiscal, Itamar sancionou uma medida provisória que criou novas alíquotas
para o imposto de renda de pessoas físicas, agravando a taxação dos
assalariados de classe média. A nova tabela visava, juntamente com outras
medidas, a elevar a arrecadação do governo naquele ano em um bilhão de dólares.
A elevação da taxa de inflação a 40% mensais levou
o governo, nos primeiros dias de fevereiro, a acelerar a implantação do
programa de estabilização. Pelo novo cronograma, logo que fosse aprovado o FSE,
seria preparada a adoção da URV, em março, e da nova moeda, o real, em abril ou
maio. O Congresso revisor aprovou o FSE em 8 de fevereiro, por 388 votos a 38.
O governo foi acusado de concentrar esforços políticos nessa proposta,
intensamente combatida pelos partidos de oposição, e depois abandonar a revisão
constitucional.
No dia 1º de março de 1994, a URV entrou em vigor,
depois de um período de acelerada elevação dos preços que se seguiu ao anúncio
da sua criação. A oposição, capitaneada pelo PT e pela Central Única dos
Trabalhadores (CUT), procurou combatê-la de todos os modos, argumentando que se
tratava de instrumento de uma nova política de arrocho salarial. Essa crítica
se baseava no fato de o novo indexador da economia ter alinhado desigualmente
salários — calculados pela média dos quatro meses anteriores — e preços —
calculados pelo ponto máximo. Fernando Henrique, contudo, rejeitou as críticas,
bem como as propostas de criação de um gatilho salarial, argumentando que o
importante não era conviver com a inflação, e sim vencê-la.
Os preços dispararam e a troca de moeda foi
considerada uma manobra de difícil execução. Foram momentos de tensão para
Fernando Henrique, àquela altura tentando se inserir na corrida eleitoral para
enfrentar na urnas o candidato do PT, Luís Inácio Lula da Silva, então em
flagrante vantagem nas pesquisas de intenção de voto.
Ainda no início de março, baixou-se a alíquota de
importação de cerca de 130 produtos, visando a reduzir a margem de manobra dos
cartéis e monopólios na fixação dos preços. Elogiada por Margaret Thatcher,
que, quando primeira-ministra do Reino Unido implantou um amplo programa de
liberalização econômica, essa abertura para o exterior não foi, contudo,
suficiente para que o FMI se dispusesse a avançar na negociação da dívida
externa com o Brasil, deixando para fazê-lo depois que fosse adotado o real.
No dia 30 de março, fim do prazo para a
desincompatibilização dos ocupantes de cargos públicos que fossem disputar as
eleições de outubro, Fernando Henrique afastou-se do ministério. Em seu lugar
assumiu Rubens Ricúpero, embaixador em Washington.
Os êxitos iniciais do Plano Real começaram a ser
capitalizados em favor da campanha de Fernando Henrique, cuja agenda incluiu a
passagem por estados já visitados pelo ministro Ricúpero para anunciar a nova
moeda. Com a inflação acumulada nos 12 meses anteriores, medida pelo Índice
Geral de Preços (IGP) da Fundação Getúlio Vargas, atingindo a casa de 5.153%, o
lançamento do real foi marcado para 1º de julho. Fernando Henrique afirmou em
Minas Gerais que, com isso, sua candidatura iria “dar um salto”.
Com o lançamento do real, o comércio esteve quase
paralisado, mas logo na primeira semana começou a haver reduções de preços. No
mercado de câmbio, a relação do real com o dólar foi estabelecida em termos
inesperados, com a moeda nacional valendo mais do que a norte-americana. As
primeiras pesquisas eleitorais feitas em seguida indicaram substancial redução
na vantagem de Lula sobre Fernando Henrique.
Após 15 dias da implantação do real, já era
flagrante a vertiginosa queda da inflação. Alguns dos segmentos mais pobres da
população se atreveram a incrementar suas compras, provocando uma corrida ao
crediário, apesar da manutenção das taxas de juros em patamares muito altos.
Entretanto, a tendência de subida da candidatura do ex-ministro da Fazenda
sofreu séria ameaça no início de setembro, em virtude de um episódio
protagonizado pelo ministro Ricúpero. Em conversa informal com um repórter
enquanto aguardava o início de uma entrevista num programa de televisão,
Ricúpero fez comentários que indicavam o envolvimento da máquina do governo na
campanha de Fernando Henrique. Captada por antenas parabólicas das redondezas,
a conversa foi tornada pública, fornecendo munição para a oposição, que, no
entanto, não conseguiu tirar proveito político do fato. O episódio, que
resultou na renúncia de Ricúpero, substituído por Ciro Gomes (PSDB-CE), não
afetou a tendência de parte significativa do eleitorado, que migrava da
candidatura petista para a de Fernando Henrique. Com a inflação já em patamares
pouco superiores a 1%, este se firmava como franco favorito. A oposição, por
sua vez, buscando argumentos para inverter a tendência eleitoral, procurava
denunciar a estabilização econômica como uma imposição da comunidade financeira
internacional.
Às vésperas do pleito, o Plano Real passou por
algumas turbulências, como a elevação dos preços da cesta básica e a cobrança
de ágio em certos produtos. Em resposta, o governo baixou medidas que facilitaram
as importações. Além disso, bancos estaduais enfrentavam problemas de caixa e a
insatisfação entre os trabalhadores se traduzia na eclosão de greves. Nada
disso impediu, contudo, que, realizada a eleição em 3 de outubro, Fernando
Henrique obtivesse, já no primeiro turno, uma vitória esmagadora: recebeu 54,3%
dos votos, contra 27% dados a Lula.
Embaixador e Candidato a Governador
Ainda na presidência, Itamar Franco foi convidado
por Fernando Henrique Cardoso para assumir a embaixada brasileira em Lisboa,
até então ocupada por seu amigo José Aparecido de Oliveira. Empossado o novo
governo em janeiro de 1995, a indicação foi formalizada e, em 23 de março,
aprovada pelo Senado.
Em sua chegada a Lisboa, em 31 de maio, Itamar
Franco pronunciou breve discurso em que defendeu o apoio à luta pela
independência de Timor Leste, ex-colônia portuguesa dominada desde 1976 pela
Indonésia, situação condenada em Portugal. Após permanecer no posto por pouco
mais de um ano, em 9 de setembro de 1996 foi substituído por Jorge Bornhausen e
assumiu o cargo de embaixador do Brasil na Organização dos Estados Americanos
(OEA), com sede em Washington. Mesmo no exterior, participou da política
brasileira, opondo-se ao presidente Fernando Henrique Cardoso no tocante à
reeleição para ocupantes de cargos executivos e à venda de algumas empresas
estatais, como a Companhia Vale do Rio Doce.
Iniciadas as articulações visando à eleição
presidencial de 1998, Itamar Franco apresentou-se como candidato em potencial e
filiou-se ao PMDB. Durante estada no Brasil, divulgou em Brasília, em 3 de
abril de 1997, nota oficial em que anunciava sua candidatura e adiantava que
deixaria em junho o cargo na OEA. Contudo, em outra passagem pelo país, em fins
de novembro, negou que já tivesse decidido candidatar-se. Embora a imprensa
afirmasse que procurara o presidente Fernando Henrique para entregar o cargo e
até anunciasse o nome de seu substituto – o embaixador Carlos Alberto Leite
Barbosa –, permaneceu à frente da embaixada brasileira na OEA.
Mesmo sem se apresentar oficialmente como candidato
à presidência da República, Itamar desfrutava de boa situação nas pesquisas de
intenção de voto, que lhe atribuíam 13% das preferências do eleitorado. O PMDB,
contudo, permanecia indeciso entre lançar um candidato próprio à presidência ou
reforçar com seus votos a campanha pela reeleição do presidente Fernando
Henrique. Itamar se alinhava com a corrente defensora da primeira opção, e seu
nome era vigorosamente defendido no partido pelo ex-governador de Minas Gerais e
então prefeito de Contagem, Newton Cardoso, interessado em projetar-se como
candidato ao governo mineiro. Também patrocinavam seu nome o presidente do
PMDB, deputado Pais de Andrade, que defendia com um grupo minoritário a
candidatura própria do partido à presidência, e o chamado grupo de Juiz de
Fora, formado por companheiros seus de longa data nas atividades políticas.
Em fevereiro de 1998, finalmente Itamar exonerou-se
do cargo na OEA. No mês seguinte, ao realizar-se a convenção do PMDB em
Brasília, sofreu violenta pressão do grupo peemedebista favorável ao
engajamento na campanha do presidente Fernando Henrique, coordenado pelo
ministro Eliseu Padilha, dos Transportes, pelo senador paraense Jáder Barbalho
e pelo líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA). A reunião se
desenrolou em meio a grande tumulto, e Itamar, cercado por cartazes com fotos
da campanha eleitoral de 1989, que o mostravam em companhia do ex-presidente
Fernando Collor, foi vaiado por grupos arregimentados por dirigentes peemedebistas.
Ao final, os convencionais decidiram, por 389 votos contra 303, apoiar a
candidatura de Fernando Henrique à reeleição.
Derrotado, Itamar se isolou em Juiz de Fora até
meados de 1998, quando se declarou pré-candidato ao governo de Minas Gerais. A
decisão se chocou com os projetos do ex-governador Newton Cardoso, cuja
campanha já estava em andamento desde o início do ano. Mas Newton acabou
entrando em acordo com Itamar, e foi candidato a vice-governador na sua chapa.
Essa composição trouxe problemas para a campanha, já que os dois, em 1986,
quando disputaram o governo de Minas Gerais, haviam se acusado mutuamente de
corrupção e grilagem de terra. Além disso, Newton Cardoso era rejeitado por 29%
do eleitorado do estado e por cerca de 50% do eleitorado de Belo Horizonte.
Quanto ao governo federal, Itamar assumiu posição dúbia: procurou
caracterizar-se como oposicionista, mas aceitou a montagem de comitês
eleitorais que o associavam à candidatura de Fernando Henrique. Seus principais
adversários no primeiro turno, realizado em 4 de outubro de 1998, foram o
governador Eduardo Azeredo, do PSDB, e Patrus Ananias, do PT. Itamar foi o mais
votado, seguido por Azeredo, com quem, no dia 24 de outubro, disputou o segundo
turno, elegendo-se com 57,62% dos votos válidos.
Governador de Minas Gerais
Empossado em 1º de janeiro de 1999 – mesmo dia
em que Fernando Henrique iniciava seu segundo governo –, Itamar Franco anunciou
que sua administração adotaria uma postura independente em relação ao governo
federal, defenderia uma mudança radical da política econômica, se recusaria a
levar a leilão de privatização qualquer empresa mineira e agiria no sentido de
obter a revisão do processo de venda dos bancos Credireal e Bemge, com sede em
Minas Gerais, o que acabaria não se concretizando. Uma de suas primeiras
medidas foi a decretação da moratória, por 90 dias, da dívida do estado com a
União, que havia sido renegociada com o governo anterior e montava a 18,6
bilhões de reais. Foram suspensos, também, os pagamentos da dívida flutuante,
no valor de 3,2 bilhões de reais, e de financiamentos internacionais. A medida
contribuiu para a desvalorização dos títulos brasileiros no exterior e tornou
tensas suas relações com o presidente Fernando Henrique Cardoso, que, em
resposta, suspendeu repasses determinados pela Constituição, como o Fundo de
Participação dos Municípios. Ao final, a dívida mineira foi repactuada em
fevereiro de 2000.
Outros episódios que marcaram
o governo Itamar em Minas foram a retomada, por meio judicial, do controle acionário
da estatal elétrica Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), parcialmente
vendida no governo anterior, de Eduardo Azeredo (PSDB), e a reação de Itamar
após a intenção do governo federal de privatizar a estatal Furnas, projeto que
não foi levado adiante.
Com a abertura do processo sucessório ainda em
2001, Itamar Franco fez críticas públicas ao presidente Fernando Henrique
Cardoso, que lhe valeram o enquadramento, pelo procurador-geral da República,
na Lei de Imprensa, pelos crimes de injúria e difamação. A acusação se baseava
em matérias publicadas, em 5 de setembro de 2001, pelos jornais O Globo, Jornal
do Brasil e Gazeta Mercantil. O governador teria
dito, entre outras afirmações, que o presidente estava “liberando, rapidamente,
verbas que estavam retidas para peemedebistas em troca de votos para o deputado
Michel Temer na convenção do PMDB” para “manipular o processo de escolha do
novo presidente do partido”. Apresentada a denúncia no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), foro competente para processar e julgar governadores nos crimes
comuns, foi pedida em 2002 autorização da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais para processar e julgar Itamar Franco, condição indispensável para a
instalação de ação penal contra governadores. Não houve, porém, resposta.
A posição contra o presidente ficou publicamente
reforçada quando o governo de Minas Gerais demonstrou simpatia pela ação de
cerca de 500 membros do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST) que, em
março de 2002, invadiram a fazenda de propriedade dos filhos de Fernando
Henrique Cardoso no município mineiro de Buritis. O governo federal enviou
tropas do Exército e da Polícia Federal para o local no dia seguinte, e a
invasão terminou com 16 líderes do MST presos.
Também no plano administrativo, o governo Itamar
Franco se distanciaria da orientação federal. Procurou desfazer medidas de
cunho neoliberal tomadas por seu antecessor sob a orientação do Ministério
da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE), como redução de
despesas com pessoal, privatizações e terceirização de serviços. Ao contrário,
procurou reforçar a presença do Estado nos planos econômico e social, sem
atingir os servidores públicos ou dar prioridade à extinção de órgãos da
administração indireta, tendo mesmo conseguido reverter judicialmente a
privatização da Centrais Elétricas de Minas Gerais (Cemig), cujo controle
acionário recuperou para o estado.
Concluído o mandato em 1° de janeiro de 2003,
Itamar Franco passou o governo a Aécio Neves, do PSDB. Em abril seguinte, foi
indicado pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva para substituir Andrea
Matarazzo à frente da embaixada do Brasil na Itália.
Embaixador na Itália
Somente quatro meses após ter sido indicado, Itamar
Franco assumiu o posto na Itália, em protesto contra a dificuldade que
encontrou no Senado para ter seu nome aprovado (29 votos a favor e 25 contra).
Por sua condição de embaixador, a ação que corria contra ele no STJ foi
encaminhada, em novembro de 2004, para o STF. O processo foi, porém, arquivado,
porque o procurador-geral da República entendeu que os supostos crimes já
estariam prescritos, desde agosto do ano anterior, entendimento endossado pelo
STF. Em 24 de agosto de 2005 deixou a embaixada em Roma, sendo substituído
por Ademar Bahadian.
A Volta ao Senado
Em 2007 foi nomeado, pelo governador mineiro Aécio
Neves, presidente do Conselho de Administração
do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG). Em maio de 2008, Itamar
Franco, então sem filiação a qualquer legenda partidária, solicitou ao
governador Aécio Neves desligamento da função, alegando descontentamento com a
decisão do governo mineiro de transformar Uberlândia em entreposto aduaneiro,
em detrimento de Juiz de Fora, sua base eleitoral. Permaneceu, contudo, no
cargo. Em julho de 2009, filiou-se ao Partido Popular Socialista, (PPS). No
discurso de filiação, ele ainda criticou o presidente Lula e o PT. Em outubro foi eleito vice-presidente da
agremiação.
No ano seguinte deixou a presidência do BDMG para
concorrer a uma cadeira no Senado. Sua legenda integrou a coligação liderada
pelo PSDB e no pleito de outubro de 2010 foi eleito senador por Minas Gerais. Assumiu
sua cadeira na Câmara Alta em fevereiro de 2011 e passou a integrar a Comissão
de Reforma Política. Defendeu o fim do voto obrigatório e a
reeleição. Ele também defendeu um veto à possibilidade de retorno de um
político que cumpriu dois mandatos no Planalto. Na oportunidade, declarou:
"Quem já foi presidente duas vezes não poderia concorrer mais. Vamos dar
oportunidade a outras pessoas. O cidadão fica oito anos no poder e quer
voltar?"
Itamar Franco exerceu por pouco tempo o seu
novo mandato de senador. Em 25 de maio de 2011 anunciou que um exame de rotina
diagnosticou uma leucemia em estágio inicial. Ele se licenciou do Senado e se
internou no Centro de Hematologia e Oncologia do Hospital Albert Einstein, em
São Paulo. No final de junho, Itamar foi internado na UTI devido a uma
pneumonia. O hospital chegou a informar que o paciente havia apresentado uma
remissão completa no quadro de leucemia, o que não equivalia à cura da doença,
mas, conforme o Instituto Nacional do Câncer (Inca), representava um estado de
aparente normalidade obtido após a quimioterapia. Apesar da melhora, o
parlamentar apresentava um quadro grave de pneumonia aguda e respirava com a
ajuda de aparelhos.
Itamar
fez também os cursos de métodos de trabalho, relações de trabalho e ensino
correto no trabalho da Comissão Americano-Brasileira de Educação Industrial, em
São Paulo, e de extensão sobre política energética brasileira na Escola
Superior de Guerra (ESG), no Rio de Janeiro.
Foi ainda chefe do Serviço de Engenharia do Sesi de
Juiz de Fora; diretor-presidente da Construtora Itec Ltda.; diretor da Blokret
Engenharia Ltda., no Espírito Santo; engenheiro do Setor de Planejamento do
Curtume Krambeck, em Juiz de Fora; diretor da Construtora e Imobiliária Paranoá
Ltda.; diretor da Sândalo Incorporadora de Imóveis Ltda.; diretor da Divisão
Industrial e do Departamento de Água e Esgoto da Prefeitura Municipal de Juiz
de Fora; presidente do Clube de Engenharia de Juiz de Fora e vice-presidente da
Associação Mineira de Municípios.
Faleceu em São Paulo no dia 2 de julho de 2011.
Sua vaga no Senado foi ocupada pelo primeiro
suplente, José Perrela de Oliveira Costa, conhecido como Zezé Perrela, então
presidente do Cruzeiro Esporte Clube.
Publicou Primeiras intervenções (1975), Artur
Bernardes — Centenário (1975), Homenagem a
Juscelino Kubitschek de Oliveira (1976), Inquietações (1976), A
imprensa e o parlamentar (1979), Tributo ao liberal Pedro
Aleixo (1980), O negro no Brasil atual (1980), Minas
no Senado (1980), Desproclamação da República (1981), Saudação
ao presidente da República Federal da Alemanha (1981), Dívida
externa e soberania nacional (1983), Poder legitimado:
eleições diretas (1984), A atuação do Congresso Nacional no
controle da política externa brasileira e Compromisso de um
democrata com o povo mineiro (1986).
Renato Lemos/Alan Carneiro
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