CAMPOS, Francisco
*dep. fed. MG 1921-1926; min. Educ. 1930-1932; consult.-ger. Rep. 1933-1937; min. Just. 1937-1941.
Francisco Luís da Silva Campos nasceu em Dores do Indaiá (MG) no dia 18 de novembro de 1891, filho do magistrado Jacinto Álvares da Silva Campos e de Azejúlia de Sousa e Silva. Pelo lado paterno, pertencia à descendência de Joaquina Bernarda da Silva de Abreu Castelo Branco, dita Joaquina do Pompéu, casada com Inácio Oliveira Campos, neto do bandeirante Antônio Rodrigues Velho, um dos fundadores de Pitangui (MG) no início do século XVIII. Joaquina do Pompéu foi a matriarca mais famosa de Minas Gerais. Numerosas famílias dominantes na vida econômica, social e política do estado pertenciam a sua linhagem. Para citar apenas alguns nomes que se tornaram conhecidos após a Revolução de 1930, encontram-se nessa trama familiar Benedito Valadares, Gustavo Capanema, os Melo Franco, José de Magalhães Pinto, Olegário Maciel e Ovídio de Abreu. Um tio-avô de Francisco Campos e de Benedito Valadares, Matinho Álvares da Silva Campos, foi ministro da Fazenda e presidiu o Conselho de Ministros do Império entre 1880 e 1882, depois de ter sido deputado geral (1857, 1869 e 1872) e presidente da província do Rio de Janeiro (1881); senador em 1882, foi nomeado conselheiro de Estado em 1887.
Francisco Campos aprendeu as primeiras letras com sua mãe e depois passou dois anos como interno no Instituto de Ciências e Letras de São Paulo, regressando em seguida a Dores do Indaiá para estudar português e francês. Fez o curso secundário nas cidades mineiras de Sabará e Ouro Preto. Em 1910, matriculou-se em Belo Horizonte na Faculdade Livre de Direito. Quando cursava o segundo ano da faculdade, chamou a atenção dos meios forenses da capital mineira ao produzir a defesa de soldados do Exército envolvidos num tiroteio com guardas da polícia civil. Sua cultura e sua oratória impressionaram o tribunal. No último ano, fez um discurso de homenagem ao falecido presidente Afonso Pena, sobre o tema democracia e unidade nacional, em que vaticinava: “O futuro da democracia depende do futuro da autoridade. Reprimir os excessos da democracia pelo desenvolvimento da autoridade será o papel político de numerosas gerações.” Contemplado com o Prêmio Barão do Rio Branco por ter sido o melhor aluno ao longo dos cinco anos do curso, foi o orador de sua turma na solenidade de formatura, em dezembro de 1914. Estabeleceu-se em seguida como advogado em Belo Horizonte.
Em 1916 candidatou-se a professor de toda uma seção de disciplinas — filosofia do direito, economia política, ciências das finanças e direito romano — da faculdade em que estudara. Obteve o primeiro lugar no concurso, mas não a nomeação, concedida a um dos dois outros postulantes, Gudesteu Pires, posteriormente seu colega no secretariado do governo de Minas. Em 1917, conquistou em concurso a cadeira de direito público constitucional, sendo admitido como professor substituto em abril de 1918.
Defensor da ordem
Em 1918 teve também início o governo de Artur Bernardes em Minas, que marcou a eliminação da velha direção da política estadual. Bernardes e seu secretário do Interior, Raul Soares, promoveram uma renovação dos métodos políticos, que herdaram, contudo, da prática dos que estavam sendo substituídos, o vezo autoritário. Completando a conquista da hegemonia política em Minas pelos representantes da Zona da Mata, mas dirigindo homens de diferentes regiões do estado, eles destruíram implacavelmente a influência do ex-presidente estadual Francisco Sales na máquina estatal e no Partido Republicano Mineiro (PRM), único no estado entre 1897 e 1930.
Segundo a análise de Norma de Góis Monteiro em artigo publicado na Revista Brasileira de Estudos Políticos, “o quadro político começava a alterar-se com a introdução de novos valores, representativos da nova geração oligárquica que se encontra imbuída do espírito de modernização. Assim, são lançados na política Odilon Braga, Cristiano Machado, Daniel de Carvalho e outros mais que terão papel atuante a partir de 1930. Entre os nomes agora projetados na órbita federal está o de Francisco Campos”.
Assim, graças à repercussão de seu primeiro concurso e às qualidades intelectuais que continuou a revelar, Francisco Campos teve seu nome incluído por Raul Soares na lista de candidatos do PRM a deputado estadual para a legislatura de 1919-1922. Eleito em 1919, com 4.287 votos, pela 7ª Circunscrição Eleitoral, foi relator da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça da Câmara estadual, participando com destaque da reforma constitucional elaborada por iniciativa de Artur Bernardes. Condenou notadamente em suas intervenções a autonomia municipal, concebendo as prefeituras, segundo assinalou Norma de Góis Monteiro, como órgãos executivos municipais de caráter exclusivamente administrativo e providos mediante designação ou nomeação estadual. “As prefeituras não são, pois, mais do que uma modalidade, e a mais eficaz e inteligente, do controle da administração central sobre a administração local”, declarou em 1920, no curso dos debates parlamentares.
Em 1921, Francisco Campos foi incluído na relação de candidatos do PRM a deputado federal. Eleito, tomou posse em abril, depois de renunciar ao mandato de deputado estadual, estreando na Câmara dos Deputados com discursos que se destacaram pela erudição. Logo cresceu a fama de sua inteligência, numa bancada mineira que incluía nomes como os de Afonso Pena Júnior, Afrânio de Melo Franco, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, José Bonifácio de Andrada e Silva, Bráulio de Magalhães, José Francisco Bias Fortes e Manuel Tomás de Carvalho Brito.
Desde o início de seu mandato, investiu “contra o Estado liberal e as instituições democrático-liberais, as quais qualifica de superstição política”, como escreveu Jarbas Medeiros. Ainda em 1921, aludiu ao “dragão da ideologia democrática”, que já estaria relegada ao “museu de antigüidades políticas”. Contrapondo-se à visão do filósofo Jean-Jacques Rousseau acerca dos direitos do cidadão e do individualismo, afirmou, no mesmo ano: “já é passado o tempo... da liberdade como um direito natural, superior e anterior à formação orgânica da sociedade: ambos, direito e liberdade, não passam de formas e modalidades da existência social ou órgãos destinados a uma função social específica... No regime moderno, as liberdades individuais passaram a ser garantidas pelo Estado e a administração do Estado a ser uma administração legal.” Investiu também contra a autonomia municipal e a autonomia estadual, defendendo o fortalecimento do poder central, contra o voto secreto e contra os parlamentos, que deveriam ser substituídos pela imprensa e pelos sindicatos: “A administração tende, portanto, a monopolizar em suas mãos o trabalho legislativo, com grandes vantagens para a sua simplicidade e regularidade.”
Em dezembro de 1921 acusou a campanha de Nilo Peçanha para a presidência da República (contra Artur Bernardes, que seria eleito em março de 1922) de transfigurar “uma luta que é um movimento normal e corriqueiro em uma democracia que se preza em um movimento revolucionário pelas suas intenções, pelos seus processos e pelos seus objetivos”. Atribuía tal transfiguração a uma mentalidade “que é de uma letalidade fatal e absoluta às instituições democráticas,... incomparavelmente mais nociva e ruinosa à República do que a do despotismo e da oligarquia”.
Reeleito em 1924, foi, ao longo das duas legislaturas, um defensor intransigente dos governos federais de Epitácio Pessoa (1919-1922) e Artur Bernardes (1922-1926), da preeminência do Poder Executivo nos marcos das instituições republicanas definidas em 1891 e da ordem estabelecida. Foi inimigo ferrenho dos “tenentes”, que promoveram uma série de tentativas insurrecionais e sublevações a partir do episódio dos 18 do Forte (5/7/1922), assim como dos liberais (chamou o líder gaúcho Joaquim Francisco de Assis Brasil de “demagogo”). A uns e outros se juntaria, não obstante tudo isso, na Revolução de 1930, que liquidou a primeira ordem republicana brasileira.
Segundo Jarbas Medeiros, nos dias seguintes à revolta fracassada dos 18 do Forte, voltou a acusar as oposições e apoiou a decretação do estado de sítio pelo presidente Epitácio Pessoa, contra “essas reincidentes tentativas do plebiscito de quartéis” e o “fantasma da sedição militar”. Viu as manifestações militares de protesto como explosões de “instintos primitivos”, “forças da desordem e da destruição”, “espírito primário e jacobino”, qualificando-as de “sombria aventura”, “agressão à ordem tradicional do país” e “flagelação da pátria”.
Temia as potencialidades de uma “revolução social anárquica” da qual o tenentismo pudesse ser uma ponta-de-lança. Em maio de 1925, respondeu ao manifesto lançado no exílio por Assis Brasil, chefe da Aliança Libertadora, contra o governo, indagando: “Que abalos, se este movimento (a sedição militar) se propaga, sacudiriam o país, fazendo emergir ninguém sabe que correntes de sentimentos, de idéias ou de paixões desses fundos submarinos da alma nacional, cujos agregados, subitamente dissolvidos, libertariam poderosas energias, menos capazes de criar do que de destruir?”
Em outro discurso feito na mesma época, oferecia o remédio preventivo: “Nestes períodos críticos de dissolução de um Estado social e de liquidação de tradições é que é preciso conter os espíritos, refrear os impulsos, apertando as malhas desta armadura elástica que é a ordem legal, de maneira a tornar tanto mais rigorosa e estrita a disciplina quanto mais ativos os fermentos que trabalham pela decomposição.”
Depois de ter defendido sistematicamente as medidas repressivas adotadas pelo governo de Bernardes — fazendo coro com os colegas da bancada do PRM —, apoiou sua proposta de reforma constitucional, que seria aprovada pelo Congresso em setembro de 1926. A revisão da Constituição de 1891 promovida por Bernardes fortaleceu os poderes do Executivo e do presidente da República, a União em detrimento dos estados e, de modo geral, a autoridade, em face da efervescência social e militar. Francisco Campos via na educação religiosa a matriz da educação moral e na educação moral e cívica a maneira de combater os “males” do tenentismo e do “falso liberalismo declamatório”. Assim, preconizou, sem êxito, o reconhecimento da religião católica como “a religião do povo brasileiro”.
Durante todo esse período, não deixou de exercer o magistério: em 1920 e 1921 lecionou filosofia do direito e direito público e, em 1924, já deputado federal, assumiu a cátedra de filosofia do direito, exercendo-a intermitentemente até 1930.
Reformador do ensino
Em 1925, o até então líder do governo Bernardes na Câmara dos Deputados, Antônio Carlos, foi escolhido pelo PRM para ser o presidente de Minas no quadriênio 1926-1930. Eleito sem concorrentes em março de 1926, Antônio Carlos foi empossado no dia 7 de setembro e indicou para a Secretaria do Interior Francisco Campos, que deixou a Câmara para se tornar o mais influente de seus auxiliares no Executivo mineiro.
Segundo Jarbas Medeiros, Francisco Campos, ao contrário da grande maioria dos políticos conservadores da época, “já trazia ao debate e à ação administrativa pública, na década de 1920, os conceitos e os programas que objetivavam a montagem, entre nós, de um Estado nacional, antiliberal, autoritário e moderno. Colocado dentro da estrutura de poder então vigente, nela trabalhava não certamente para solapar suas bases sociais — e nisto qualificava-se como um conservador —, mas sim para substituir e reconstruir, do alto, as suas instituições políticas e burocráticas, modernizando-as”.
Do governo de Antônio Carlos em Minas se apresenta geralmente um saldo bastante positivo em confronto com outras administrações do período e, sobretudo, com os governos de seus antecessores. Há entretanto quem julgue, como Alexandre Barbosa Lima Sobrinho, que suas realizações foram motivadas pelo afã de projetar nacionalmente o próprio nome de Antônio Carlos, tendo em vista a sucessão de Washington Luís, que assumira a presidência da República em 15 de novembro de 1926.
Foi no setor educacional, atribuição de Francisco Campos, que o governo de Antônio Carlos teve atuação mais notável. Em setembro de 1927 foi criada em Belo Horizonte a Universidade de Minas Gerais (atual Universidade Federal de Minas Gerais). Foi entretanto na renovação de todo o ensino primário e normal do estado, em experiência pioneira no país, que Francisco Campos mais se destacou. Seguiu nessa renovação os postulados da “escola nova”, que haviam chegado ao Brasil, através de educadores como Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo, após a Primeira Guerra Mundial.
Francisco Campos via a escola tradicional, segundo Jarbas Medeiros, como de natureza retórica e ornamental, dirigida para a formação de elites. A “escola nova” deveria ensinar a pensar, a inventar e a criar soluções para a multiplicidade de novos problemas da complexa vida moderna. Para ele, o futuro das instituições democráticas dependia sobretudo “da orientação e do incremento do ensino primário”, o qual, deixando de formar homens, orientar a inteligência e destilar o senso comum, “poderá fazer eleitores, não terá feito cidadãos”.
Com um grupo de psicólogos e professores estrangeiros — entre os quais a educadora Helena Antipoff, que se tornaria conhecida nacionalmente — Francisco Campos traçou todo um plano de reforma do ensino, do qual resultou, notadamente, a criação da Escola de Aperfeiçoamento, destinada a formar e reciclar educadores na linha da “escola nova”. O número de escolas primárias foi triplicado entre 1926 e 1929, foram fundadas 19 escolas normais e remodeladas as mais antigas já existentes, as de Belo Horizonte e Ouro Preto. Contrataram-se professores na Suíça, França e Bélgica e mestras mineiras foram estagiar nos Estados Unidos como bolsistas do governo estadual. Em 1928, provocando alguma celeuma nos meios políticos e angariando a simpatia da Igreja Católica, o governo de Minas Gerais reintroduziu o ensino religioso nas escolas públicas.
Outra reforma que contou com a participação direta de Francisco Campos foi, apesar de tudo o que defendera anteriormente em sentido oposto, a que instituiu o voto secreto nas eleições municipais e estaduais (1927-1928). No terreno político, contudo, sua atuação aumentou efetivamente de importância com a campanha da Aliança Liberal e seu desdobramento no processo que culminou com a Revolução de 1930.
Rumo a uma nova ordem
A Aliança Liberal foi criada em 1929 para apoiar as candidaturas dissidentes dos presidentes do Rio Grande do Sul, Getúlio Vargas, e da Paraíba, João Pessoa, para a presidência e a vice-presidência da República nas eleições de março de 1930. Desde as sucessões de Delfim Moreira (1919) e Epitácio Pessoa (1922), estava em curso um processo de estiolamento da política de predomínio concertado de São Paulo e Minas Gerais, levando a reboque um Rio Grande do Sul freqüentemente contrariado. O que acelerou tal processo, levando à cisão definitiva das oligarquias que dominaram a República Velha e à derrubada do quadro institucional de 1891, foi a questão sucessória. Em torno dela se condensariam as contradições entre a política oficial e as instituições, de um lado, e a situação real da sociedade e da economia, de outro.
Em meados de 1928, quando percebeu que sua candidatura — contrapartida tácita do acordo São Paulo-Minas que levara Washington Luís à presidência da República — se tornara praticamente inviável devido à obstinação do presidente em fazer de Júlio Prestes, governante de São Paulo, seu sucessor, Antônio Carlos começou a procurar uma aliança com a política gaúcha. Washington Luís queria, em desacordo com a praxe republicana, que o problema da sucessão presidencial só fosse introduzido no debate político nacional a partir de setembro de 1929, seis meses antes das eleições. Em junho de 1929, porém, a questão foi suscitada no Congresso Nacional, e o secretário de Segurança Pública de Minas, José Francisco Bias Fortes, abordou-a em discurso numa cerimônia oficial.
No dia 17, as negociações entre Minas e o Rio Grande do Sul, em curso desde o início do ano, foram traduzidas num acordo secreto, o “pacto do Hotel Glória”, no Rio de Janeiro. Francisco Campos e o líder da bancada mineira na Câmara dos Deputados, José Bonifácio de Andrada e Silva, irmão de Antônio Carlos, representavam o presidente mineiro. Vargas e o chefe do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), Antônio Augusto Borges de Medeiros, eram representados pelo líder da bancada gaúcha do PRR, João Neves da Fontoura. Pelo acordo, os dois estados apoiariam a candidatura de um mineiro que viesse a ser proposta por Washington Luís; mas, no caso de o presidente propor candidato de qualquer outro estado, Minas recusaria e lançaria o nome de um gaúcho — Borges de Medeiros ou Getúlio Vargas. Embora não fosse ignorada uma hipotética e remota candidatura de Antônio Carlos, o sentido principal do pacto foi o de repudiar o nome de Júlio Prestes.
Depois de uma troca de cartas entre Washington Luís, de um lado, e Getúlio Vargas e Antônio Carlos, de outro, foi formada, no início de agosto, a Aliança Liberal. Seu programa propunha a concessão de uma anistia ampla a todos os presos políticos, processados e perseguidos desde o 5 de julho de 1922, além do voto secreto, no primeiro plano de uma série de reformas políticas. Sob a presidência de Antônio Carlos, a Aliança Liberal realizou sua convenção nacional em 20 de setembro de 1929, no Rio de Janeiro, homologando as candidaturas de Vargas e João Pessoa.
À medida que se aproximava a data das eleições, os políticos mais radicais da Aliança Liberal — como o mineiro Virgílio de Melo Franco e os gaúchos João Neves, José Antônio Flores da Cunha, João Batista Luzardo e Osvaldo Aranha, secretário do Interior de Vargas — foram reforçando a convicção de que Washington Luís impediria por todos os meios a vitória dos candidatos oposicionistas. Começaram assim a contemplar a hipótese de desencadear um movimento armado contra o governo federal. Desde fins de 1929, passaram a ser procurados por oficiais revolucionários de 1922 e 1924, como Antônio de Siqueira Campos, Newton Estillac Leal, João Alberto Lins de Barros, Juarez Távora, Leopoldo Néri da Fonseca, Eduardo Gomes e Osvaldo Cordeiro de Farias. O principal intermediário entre os “tenentes”, e as forças políticas mineiras e gaúchas foi Virgílio de Melo Franco, que era deputado estadual em Minas.
Essa primeira fase do movimento conspirativo não implicava ainda uma preparação para a luta armada, sendo os contatos realizados paralelamente à propaganda eleitoral da oposição. No fundo, segundo Virgílio de Melo Franco, os dirigentes dos três estados oposicionistas “não estavam de todo resolvidos a apelar para o extremo recurso da revolução, senão em último caso... O sr. Antônio Carlos, sobretudo, tinha um supremo horror à idéia de revolução”.
No dia 1º de março de 1930, não foi difícil para Washington Luís obter a vitória de Júlio Prestes e de seu companheiro de chapa, o baiano Vital Soares, com grande diferença de votos sobre a chapa da Aliança Liberal. Ganhou alento, então, a perspectiva de um movimento armado. Em fins de março, Batista Luzardo, acompanhado por Virgílio de Melo Franco, fez contatos com Epitácio Pessoa, em Petrópolis (RJ), e Antônio Carlos, em Minas, seguindo depois para Porto Alegre, onde se reuniu com os chefes políticos gaúchos envolvidos na conspiração, inclusive Getúlio Vargas. Voltando em seguida ao Rio, refez com Virgílio o roteiro anterior, confirmando o apoio de Antônio Carlos ao movimento armado.
Em abril, o esquema de preparação revolucionária foi transmitido por Virgílio, Luzardo e Luís Aranha, irmão e emissário de Osvaldo Aranha, a Epitácio Pessoa, Artur Bernardes e Antônio Carlos. Osvaldo Aranha acelerava a conspiração, encomendando na Tchecoslováquia cerca de 16 mil contos de réis em material bélico e munições. O Rio Grande do Sul deveria participar com a metade dessa soma, cabendo seis mil contos a Minas e dois mil à Paraíba.
Antônio Carlos concordou com o esquema proposto e incumbiu Francisco Campos de acompanhar Luís Aranha ao Rio Grande do Sul, para verificar in loco o andamento dos preparativos. Ele ficou no Rio Grande do Sul entre 18 e 27 de abril, mantendo contatos com os políticos da Ala Moça do PRR e com Borges de Medeiros. Com Vargas e Osvaldo Aranha, acertou as condições de participação de Minas Gerais no movimento. A tarefa militar do estado consistiria em distrair as tropas federais que nele se encontrassem e fechar as próprias fronteiras, atraindo mais tropas federais, que assim seriam retiradas da fronteira sul de São Paulo. Os sediciosos contavam dominar as tropas federais no Rio Grande do Sul e marchar em seguida rumo à capital da República.
De volta ao Rio, entrevistou-se com Artur Bernardes e seguiu para Minas. Antônio Carlos autorizou o início da preparação material do movimento. No dia 27 de maio, a comissão executiva do PRM aprovou unanimemente a participação de Minas no movimento. Em 1º de junho, Vargas lançou um manifesto à nação, denunciando os procedimentos do governo federal no processo eleitoral e afirmando não estar longe “a necessária retificação, para vermos a democracia brasileira no regime que exige a felicidade pátria”.
Nos dias seguintes, entretanto, Antônio Carlos começou a recuar. Ao lhe ser comunicada a escolha da data de 16 de julho para a deflagração do movimento, mostrou-se hesitante e criticou o que considerava precipitação dos revolucionários gaúchos. Em meados de junho, assustado com indícios de que o movimento estava sendo mal preparado, acusou Virgílio de Melo Franco e os demais ativistas mineiros da conspiração de o estarem envolvendo, assim como a Minas Gerais, em uma “aventura louca”. Francisco Campos, escreveu Virgílio, “com o seu temperamento de cético, pouco nos ajudou, no esforço desesperado que fizemos no sentido de galvanizar o Andrada”.
No dia 17 de junho, Antônio Carlos ordenou a Francisco Campos que assinasse um radiograma para Osvaldo Aranha afirmando que o presidente de Minas considerava o movimento inteiramente sem articulação, deficientemente preparado e sem probabilidade de sucesso e propondo uma concertação entre Minas e o Rio Grande do Sul com vista a uma campanha política. Osvaldo Aranha respondeu instando o governo mineiro a se definir em relação à luta armada. No dia 21, Francisco Campos voltou a se comunicar com Osvaldo Aranha, reiterando que Antônio Carlos preconizava, como diretriz, uma ação exclusivamente política. Acrescentou, como opinião sua, mas instado por Antônio Carlos, que o presidente mineiro queria evitar o movimento.
Dois dias depois, veio a áspera resposta de Aranha: arcava o presidente de Minas com a inteira responsabilidade da desistência. Preocupado com a repercussão de sua atitude, Antônio Carlos procurou transferir a responsabilidade da participação ou não de Minas a Olegário Maciel, eleito em março para sucedê-lo na presidência do estado. No fim do mês, Getúlio, com a cobertura do recuo de Antônio Carlos, recuou ele próprio, o que levou Osvaldo Aranha a se demitir da Secretaria do Interior do governo gaúcho. A primeira tentativa de desencadear a revolução fracassara.
O assassinato de João Pessoa em Recife, no dia 26 de julho de 1930, recolocou na ordem do dia a perspectiva revolucionária. Houve idas e vindas a propósito da data em que seria possível deflagrar a luta armada. Em Minas, o problema girava em torno do dia 7 de setembro, quando haveria a transmissão da presidência do estado. Antônio Carlos queria que a revolução estourasse já no governo de Olegário Maciel, que por sua vez desejava o contrário. Afinal, Vargas e Osvaldo Aranha escolheram o dia 3 de outubro.
A revolução começou em Porto Alegre às 17:30h do dia 3 de outubro. Às 11 da noite estavam dominadas todas as guarnições militares da capital gaúcha, à exceção de um bataIhão de cavalaria, que se rendeu no dia seguinte. Em Belo Horizonte, a luta começou no mesmo momento, mas a resistência oferecida pelo 12º Regimento de Infantaria (12º RI) foi mais tenaz: o regimento resistiu ao cerco e aos ataques dos rebeldes (tropas da Força Pública, na sua maior parte) durante cinco dias. Odilon Braga, que fora secretário de Segurança até 7 de setembro, articulou as atividades revolucionárias na capital mineira. Francisco Campos, que fora sucedido na Secretaria do Interior por Cristiano Machado, também atuou como se continuasse no governo, com a concordância de seu substituto.
Em 24 de outubro, quando as tropas que partiram do Rio Grande do Sul já estavam na fronteira do Paraná com São Paulo, Washington Luís foi deposto na capital federal, assumindo o governo uma junta militar. As intenções da junta não eram claras. Seus integrantes se declararam dispostos a aceitar que Vargas, o chefe do movimento, assumisse a presidência de um colegiado de governo. Mas os planos de Getúlio não previam a partilha do poder. Ele se tornou chefe do Governo Provisório em 3 de novembro, depois que a junta cedeu diante da ameaça de as tropas rebeldes prosseguirem seu avanço rumo ao então Distrito Federal.
A Legião Mineira
O Governo Provisório adquiriu configuração legal em 11 de novembro, através de decreto assinado por Vargas. Três dias depois, ele criou o Ministério da Educação e Saúde Pública e convocou Francisco Campos para assumi-lo. Segundo Edgar Carone, antes da revolução, Vargas assumira o compromisso de dar três ministérios ao Rio Grande do Sul, três a Minas e um à Paraíba. Entretanto, foi obrigado a manter na pasta da Marinha um dos membros da junta que o precedera e a distribuição dos demais ministérios não obedeceu ao esquema previsto.
No Ministério das Relações Exteriores ficou um mineiro, Afrânio de Melo Franco, que assumira a pasta em 24 de outubro, quando a junta depôs Washington Luís. Mas Artur Bernardes e Olegário Maciel, os dois políticos que saíram fortalecidos em Minas com o processo revolucionário, declararam que Afrânio não representava a política de seu estado no ministério e reivindicaram que Mário Brant e Francisco Campos fossem nomeados (Mário Brant foi para a presidência do Banco do Brasil). A reforma do ensino mineiro projetara nacionalmente o nome de Campos, credenciando-o a ocupar o ministério recém-criado.
A vitória da revolução fortaleceu, em Minas Gerais, a autoridade de Olegário Maciel — único governante estadual que não foi substituído por um interventor federal — e do PRM, representante dos grupos dominantes locais. O presidente do partido, Artur Bernardes, desempenhara um papel importante na preparação política do movimento, mantendo uma posição firme, que contrastara com a conduta vacilante de Antônio Carlos e mesmo de Olegário Maciel.
A situação pós-revolucionária era instável porque encerrava uma contradição entre os objetivos dos “tenentes” e dos jovens políticos radicais da Aliança Liberal, como Osvaldo Aranha e Virgílio de Melo Franco, de um lado, e os das forças políticas tradicionais, de outro. Para estas, que Olegário, Bernardes e Antônio Carlos integravam, a revolução havia sido “um movimento armado que visava restabelecer o jogo político rompido por São Paulo”. Já a intervenção dos “tenentes” na vida política mineira “tinha como objetivo principal a neutralização do poder político das oligarquias, encontrando na facção bernardista um alvo e uma resistência”, conforme escreveu Helena Bomeny, em trabalho publicado no livro Regionalismo e centralização política.
Ao mesmo tempo, a divisão se instalara dentro do PRM desde o processo de escolha de Olegário Maciel para o governo do estado, em outubro de 1929, com o afastamento da candidatura do então vice-presidente da República e ex-presidente do estado, Fernando de Melo Viana, e a subseqüente criação da Concentração Conservadora, cuja atividade roubara ao candidato Getúlio Vargas muitos votos em Minas no pleito de 1º de março de 1930. Desde sua posse, Olegário Maciel vinha se defrontando com sérias dificuldades para constituir dentro do PRM um grupo que pudesse servir de base de apoio ao seu governo. Era grande a influência de Bernardes em seu governo e ela pareceu crescer após o triunfo do movimento armado.
Ainda em novembro de 1930, os “tenentes” começaram a pressionar Olegário no sentido de estabelecer uma aliança antibernardista. O alvo mais importante, contudo, não era propriamente a presença de Bernardes na vida política mineira, mas sobretudo o PRM e seu sistema de poder, como expressões de uma mentalidade e de práticas que a revolução, na concepção dos “tenentes”, viera erradicar. Osvaldo Aranha, ministro da Justiça do Governo Provisório, e Francisco Campos consideravam necessária a criação de um partido revolucionário. Logo após a vitória, os “tenentes”, sob a liderança do tenente-coronel Pedro Aurélio de Góis Monteiro, chefe das forças revolucionárias, e de outros militares membros do governo, como Miguel Costa, João Alberto e Juarez Távora, criaram a Legião de Outubro, também chamada Legião Revolucionária.
O primeiro manifesto da nova organização foi lançado em São Paulo no dia 12 de novembro. No dia 21 seguinte os ministros Osvaldo Aranha, Francisco Campos, José Fernandes Leite de Castro (Guerra) e lsaías de Noronha (Marinha), além de Batista Luzardo, chefe de polícia, e Góis Monteiro, enviaram um telegrama a Olegário Maciel sugerindo a criação da Legião de Outubro em Minas, como instrumento de defesa e propagação dos ideais da revolução. Francisco Campos seria o principal artífice da organização e, como tal, instrumento de Vargas, Osvaldo Aranha e Góis Monteiro na luta para destruir a influência de Bernardes em Minas e, a longo prazo, destruir o próprio PRM. “Representante dos novos valores originados das oligarquias decadentes”, escreveu Norma de Góis Monteiro, “Francisco Campos aliava à sua grande capacidade intelectual um enorme desejo de ascensão política. Daí a facilidade com que se adaptará a todas as injunções políticas, contanto que permaneça no poder”.
No dia 26 de novembro, Olegário exonerou três secretários estaduais ligados a Bernardes — José Carneiro de Resende (Finanças), Alaor Prata (Agricultura) e Cristiano Machado (Interior) —, substituídos respectivamente por Amaro Lanari, Cincinato Noronha Guarani e Gustavo Capanema. Nessa ocasião, Francisco Campos foi a Minas conferenciar sigilosamente com o presidente mineiro a respeito da formação da Legião de Outubro no estado. Presume-se que sua visita tenha tido relação com as exonerações, já que os novos secretários seriam os líderes da legião.
Falando de uma viagem que fez ao Rio em 5 de dezembro, Gustavo Capanema, conforme cita Helena Bomeny, afirmou que Francisco Campos, depois de recebê-lo na estação ferroviária, “tratou do assunto comigo: liquidar o Bernardes... O plano inicial do Campos não era a fundação da legião ou de outro partido em Minas. Era a reorganização da comissão executiva do PRM com a liquidação do Bernardes. Achei difícil e arriscado. Além de tudo ingrato e injusto... Depois de vários dias de conversa regressei... No fundo vim do Rio disposto a auxiliar o Campos na trucidação do Bernardes”.
Entre os dias 6 e 26 de dezembro, Francisco Campos assumiu em caráter interino o Ministério da Justiça, em substituição ao titular Osvaldo Aranha. No dia 13, Olegário Maciel enviou uma carta a Vargas designando Francisco Campos representante de Minas Gerais junto ao Governo Provisório.
A Legião de Outubro foi fundada em Minas no dia 27 de fevereiro de 1931, através do manifesto distribuído nessa data em Belo Horizonte assinado por Francisco Campos, Gustavo Capanema e Amaro Lanari, entre outros. Segundo o documento, a legião não seria “uma liga de carbonários, nem uma casta de agitadores”, mas “uma agremiação de patriotas ligados indissoluvelmente por vínculos morais e só animados da aspiração de trabalhar pelo Brasil”. A Legião de Outubro vinha com uma “dupla finalidade: defender a vitória da revolução brasileira e realizar seus ideais”. Defender a vitória da revolução brasileira significava “combater contra todos os seus inimigos”, definidos em “três categorias: inimigos oriundos do velho regime (os governadores depostos, os aderentes hipócritas e os viciados e corruptos de toda espécie), inimigos existentes no seio da própria revolução (os revolucionários sem convicção e os revolucionários preguiçosos ou céticos) e inimigos de origem externa (todos os propagandistas, pregoeiros e apóstolos de doutrinas políticas exóticas e inaplicáveis para a solução de problemas brasileiros)”. Era seu dever, finalmente, “manter e fortalecer o espírito da unidade nacional e pregar e desenvolver os altos sentimentos e grandes virtudes humanas”.
A Legião de Outubro não tardou a revelar seu caráter fascistizante. Em 21 de abril, Francisco Campos organizou um desfile da legião em Belo Horizonte. Os legionários, constituindo uma milícia uniformizada com camisas cáqui, acorreram de quase todos os municípios do estado. Olegário Maciel também envergou uma camisa cáqui, sobre a qual, algo constrangido, vestiu um paletó, e saudou o cortejo da sacada do palácio do governo.
A organização passou então a denominar-se Legião Liberal Mineira, ficando mais conhecida como Legião Mineira, e conseguiu arregimentar um grande contingente de perremistas por meio de pressões e intimidações. Segundo Helena Bomeny, a ambigüidade marcou desde o início a Legião: “Resultante de um projeto tenentista, viu-se na contingência de ser implantada por forças oligárquicas do estado. Se ideologicamente caracterizava-se pela crítica ao regionalismo oligárquico, na prática era impulsionada por setores da oligarquia.”
Nessa época, o pensamento de Francisco Campos inclinava-se para o fascismo, segundo Wilson Martins, que transcreve relato de Maurício de Lacerda sobre um diálogo mantido com Campos poucos dias antes da posse do Governo Provisório: “Impugnamos vivamente tal orientação opressora, que é a vergonha da história italiana e opróbrio da Europa moderna. Explicou, meio hesitante, que se tratava de um fascismo de idéias, de espírito, e não de métodos de compressão.”
Modernização do ensino médio e superior
No final de março de 1931, o Governo Provisório reformou o Tribunal Especial que havia sido criado em novembro anterior com o objetivo de apontar irregularidades e corrupção sob o governo de Washington Luís. A reforma, que transformou o tribunal em Junta de Sanções, foi feita num momento em que Artur Bernardes e mais de uma centena de deputados haviam sido denunciados. Três ministros — Osvaldo Aranha, Francisco Campos e Leite de Castro — integraram a Junta de Sanções, que em setembro passou a se chamar Comissão de Correição Administrativa, conservando de sua antiga composição apenas Osvaldo Aranha. A nova comissão, entretanto, acabou morrendo esquecida.
As principais medidas adotadas por Francisco Campos na pasta da Educação e Saúde Pública datam de abril de 1931. No dia 11 foram assinados dois decretos. O primeiro, contendo o estatuto das universidades brasileiras, afirmava ser o sistema universitário preferencial ao das escolas superiores isoladas. A fim de dar corpo à idéia universitária, o decreto estabelecia a exigência, para a fundação de entidades universitárias, da existência de três unidades de ensino superior — Direito, Medicina e Engenharia — ou, ao invés de uma delas, a Faculdade de Educação, Ciências e Letras. O segundo decreto dispunha minuciosamente sobre a organização da Universidade do Rio de Janeiro (posteriormente Universidade do Brasil e atual Universidade Federal do Rio de Janeiro).
No dia 18 de abril foi decretada a reforma do ensino secundário, retirando-se-lhe o caráter de passagem para a faculdade. Na verdade, foi a partir de então que passou a existir no Brasil um ensino secundário tal como se concebe hoje. O curso foi aumentado para sete anos, sendo cinco da parte fundamental comum (o que depois se chamou de ginasial) e dois de um curso complementar, “obrigatório para os candidatos à matrícula em determinados institutos de ensino superior” (o complementar se desdobraria mais tarde em “científico” e “clássico”, adquirindo vida própria, enquanto o acesso ao ensino superior passava a ser feito através dos exames vestibulares). Finalmente, no dia 30, foi assinado o decreto que reintroduziu, em caráter facultativo, o ensino religioso nas escolas oficiais.
A faceta modernizadora do pensamento de Francisco Campos, que constituiu uma das vertentes ideológicas da formação da “tecnocracia” brasileira, foi a base conceitual das reformas do ensino superior, assim como aparece nas exposições de motivos dos respectivos decretos: “A educação do homem não se fará jamais mediante o sistema de receptividade passiva... A verdadeira educação concentra o seu interesse antes sobre os processos de aquisição do que sobre o objeto que eles têm em vista, e a sua preferência tende não para a transmissão de soluções já feitas, acabadas e formuladas, mas para as direções do espírito, procurando criar, com os elementos constitutivos do problema ou da situação de fato, a oportunidade e o interesse pelo inquérito, a investigação e o trabalho pessoal em vista da solução própria e adequada e, se possível, individual e nova.”
A função da escola, acrescentava, “cresce ainda de vulto com as transformações por que vem passando a vida contemporânea”. Pouco mais tarde, em discurso na Faculdade de Economia da Bahia, afirmou: “O mundo vive hoje sob o sinal do econômico, como já viveu em outros tempos sob o sinal do religioso e do político.” Daí a necessidade de um ensino “de cunho técnico e profissional”, que permitisse dirigir a economia (“economia dirigida é, sobretudo, economia organizada e racionalizada”). “Dirigir a economia nacional sem uma intensa preparação científica e prática de um corpo de técnicos e de peritos destinados a orientar as medidas legislativas e as intervenções do governo é, evidentemente, passar dos mais competentes, que são os produtores, para o empirismo e as aventuras oficiais o governo da riqueza nacional.”
Proclamar a necessidade da “escola nova” não o impedia de buscar a “recuperação dos valores perdidos”, tarefa que só o ensino religioso, a seu ver, poderia cumprir. Num discurso de 1936, explicaria retrospectivamente que a reintrodução do ensino religioso implicara “violar um sistema político que, na conformidade das praxes agnósticas, os liberais consideravam como uma das categorias eternas do espírito humano”. Não fora, por isso, ato de um ministro: “Só o ditador, guia e intérprete da revolução, poderia quebrar os grilhões, estendendo a ruptura do sistema político vigente até ao dogma fundamental da liberdade de pensamento que as inspirações maçônicas e livre-pensadoras do liberalismo do século XIX haviam postulado para as suas próprias crenças e os seus próprios fanatismos excluindo do privilégio as grandes formas do pensamento e do sentimento religioso.”
Em Minas Gerais, a reintrodução do ensino religioso nas escolas públicas foi vista como urna forma de fortalecer a Legião Mineira através de uma aliança com a Igreja Católica, evidente beneficiária de uma lei que fazia depender o ensino de qualquer das religiões, em cada escola, de solicitação feita por um grupo de pelo menos 20 alunos. Houve críticas, formuladas, segundo Helena Bomeny, “a partir do pressuposto de que o pacto entre a legião e a Igreja iria favorecer o desenvolvimento da nova agremiação pela propaganda que a última faria em seu favor. No que toca a Francisco Campos, essa aliança poderia reverter em seu próprio benefício, pela perspectiva de apoio do clero católico mineiro à sua ascensão a cargos políticos.”
A trajetória de Francisco Campos no Ministério da Educação sofreu um hiato em virtude da luta política em Minas Gerais e de seus reflexos no seio do Governo Provisório. Como representante de Minas no Governo Provisório, Campos contava com meios políticos próprios para intervir em seu estado. “A legião”, escreveu Helena Bomeny, “significava para ele a oportunidade de efetivamente ascender no cenário político, já que controlava de forma efetiva a política estadual, através dos vínculos estreitos estabelecidos com o governo Olegário Maciel” (em carta de junho de 1931 a Osvaldo Aranha, um chefe político do interior mineiro chamou Gustavo Capanema, secretário do Interior, de “menino de recados” de Francisco Campos).
Osvaldo Aranha, um dos “homens da revolução”, tinha projetos próprios em relação à política mineira. Depois da criação da Legião Mineira, que representara um rude golpe para o PRM, o partido de Bernardes resistiu ao assédio que sofria dos “tenentes” e das forças oligárquicas adversárias. Em 15 de agosto de 1931, iniciou-se em Belo Horizonte, num clima de grande agitação, uma convenção do partido. Osvaldo Aranha articulou um golpe militar para coincidir com a reunião. Seu objetivo era derrubar Olegário Maciel e colocar Virgílio de Melo Franco à frente do governo mineiro. A tentativa foi feita no dia 18, pelo comandante do 12º RI, coronel Júlio Pacheco de Assis, mas fracassou diante da resistência de Olegário, respaldado pela Força Pública e apoiado por Francisco Campos, Antônio Carlos e Venceslau Brás.
Pouco depois, sem aludir ao episódio, que disse ter sido um “equívoco”, Osvaldo Aranha criticou Francisco Campos junto a Vargas, questionando a lealdade do ministro da Educação ao Governo Provisório. Francisco Campos pediu então demissão do cargo, enquanto Osvaldo Aranha fazia o mesmo. Vargas não aceitou a demissão de Aranha mas aceitou a de Francisco Campos, que no dia 1º de setembro foi substituído, em caráter interino, por Belisário Pena, diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública. Em 1º de dezembro, depois de ter passado uma temporada em Minas, Francisco Campos reassumiu a pasta, no contexto da tentativa de composição da política mineira então em curso.
Ainda em dezembro, conquanto estivesse fora de cogitação entregar o poder estadual ao bernardismo, percebeu-se não ser possível governar Minas à inteira revelia dessa facção. Tendo em vista, além disso, que a Legião Mineira não conseguira se afirmar como estrutura partidária alternativa, as forças antagonistas começaram a negociar um acordo por inspiração de Getúlio e com a intermediação de Gustavo Capanema. A idéia era fundir num só partido a Legião Mineira e o PRM, constituindo assim a base de apoio dos governos estadual e federal. Em fevereiro de 1932, essa aliança, que ficou conhecida como Acordo Mineiro, se traduziu na criação do Partido Social Nacionalista (PSN), tendo Antônio Carlos, Bernardes, Venceslau Brás e Virgílio de Melo Franco na comissão diretora.
Daí até a eclosão da Revolução Constitucionalista de julho de 1932, a política mineira oscilou entre a defesa do Governo Provisório e o apoio à causa paulista. E foi também em torno desse movimento insurrecional que se deu a demissão de Francisco Campos do Ministério da Educação, assim como do Ministério da Justiça, que ele havia acumulado em caráter interino desde a demissão coletiva, no início de março, de representantes gaúchos no Governo Provisório (entre os quais Maurício Cardoso, que substituira Osvaldo Aranha na pasta da Justiça).
No curso da Revolução Constitucionalista, Olegário Maciel escreveu a Vargas acusando Francisco Campos, com quem havia rompido politicamente, de participar das articulações comandadas por Artur Bernardes para a realização, em Minas, de um movimento armado de apoio a São Paulo. Apesar da inverossimilhança dessa acusação, que entretanto despertou as suspeitas de Vargas, em 16 de setembro, antes mesmo da rendição dos paulistas (2 de outubro), Francisco Campos pediu demissão de seus cargos ministeriais. Na pasta da Educação e Saúde foi substituído por Washington Pires, ex-deputado federal por Minas e novo representante do estado no Governo Provisório, por indicação de Olegário Maciel. A pasta da Justiça foi assumida em caráter interino por Afrânio de Melo Franco, até a nomeação, em novembro, do novo titular, Francisco Antunes Maciel.
Ainda em 1932, quando foi publicado seu livro de poesia Ciclo de Helena, Francisco Campos chegou a se candidatar a uma vaga na Academia Brasileira de Letras, desistindo após dois adiamentos das eleições por falta de quorum. No mesmo ano, abriu escritório de advocacia no Rio e transferiu-se para a Faculdade Nacional de Direito como catedrático de filosofia do direito.
Ideólogo da nova ordem
O novo caminho para buscar o apoio da política mineira ao Governo Provisório foi o da reorganização partidária no estado, tendo em vista as eleições para uma assembléia nacional constituinte, prometidas por Vargas desde maio de 1932. Da Legião Mineira, após a tentativa de unificação com o PRM no PSN, não restou qualquer estruturação própria. Ficaria, sim, a idéia do partido reacionário de massas, mais tarde traduzida na criação, por Plínio Salgado, da Ação Integralista Brasileira (AIB). Em fevereiro de 1933, Olegário Maciel, Antônio Carlos, José Monteiro Ribeiro Junqueira, Gustavo Capanema e Virgílio de Melo Franco fundaram o Partido Progressista (PP) de Minas Gerais, passando o combalido PRM à condição definitiva de oposição.
As eleições para a Constituinte foram confirmadas para 3 de maio de 1933. “Se nos primeiros anos da Revolução”, escreveu Norma de Góis Monteiro, “tudo parecia favorável a Campos, a sua ambigüidade de ação e de palavra provocará nos políticos mineiros uma desconfiança atroz.” Sem legenda partidária, Campos concorreu como candidato avulso à Constituinte por Minas Gerais e sofreu fragorosa derrota. “No âmbito estadual”, comenta a mesma autora, “sua vida política tinha chegado ao fim. Daí sua transferência definitiva para o Rio. Lá, devido à sua capacidade intelectual e relacionamento razoável com os altos escalões da política nacional, ainda poderá encontrar o seu caminho.”
Em 23 de novembro de 1933, enquanto Minas vivia a crise da sucessão de Olegário Maciel (falecido em setembro), Virgílio de Melo Franco obteve de Vargas sua nomeação para consultor-geral da República, em caráter interino. Pouco depois, Campos licenciou-se do cargo para representar o Brasil na VII Conferência Pan-Americana de Montevidéu, voltando a assumi-lo em janeiro de 1934. Foi efetivado em 18 de outubro seguinte.
A reconstitucionalização do país, com a aprovação da Constituição de 1934 (16 de julho), não abriu um período de estabilidade política mas, ao contrário, de ainda maior instabilidade, que iria levar ao golpe de 10 de novembro de 1937 e à implantação do Estado Novo. A solução golpista começou a se desenhar, como hipótese, com a promulgação da Carta de 1934 e a confirmação de Getúlio Vargas na chefia do Executivo, um dia depois, pelos constituintes. A propensão a romper a legalidade constitucional, presente em primeiro lugar nas forças armadas, foi estimulada pela tentativa insurrecional comunista de novembro de 1935. O estado de sítio foi implantado, trazendo em seu bojo a censura à imprensa.
Acusado de envolvimento com os comunistas, sob pressão dos integralistas e das alas mais retrógradas do mundo católico, o prefeito do Distrito Federal, Pedro Ernesto Batista, aceitou no dia 1º de dezembro de 1935 a demissão de seu secretário de Educação, Anísio Teixeira, nomeando Francisco Campos para substituí-lo. Em abril de 1936, Pedro Ernesto seria preso por ordem do chefe de polícia Filinto Müller. O cônego Olímpio de Melo assumiria a prefeitura, conservando Francisco Campos no cargo. Coube-lhe o trabalho de demolição da obra de Anísio Teixeira — principal expoente da “escola nova” —, notadamente da Universidade do Distrito Federal, fundada em 1934 e alvo predileto das acusações convergentes de católicos e integralistas.
Foi nessa época que Francisco Campos se afirmou como um dos mais importantes ideólogos da direita brasileira, na companhia de Francisco José de Oliveira Viana e de Antônio José de Azevedo Amaral. Já em 28 de setembro de 1935, em conferência pronunciada na Escola de Belas-Artes, via instituído na vida política o “primado do irracional”. Como escreveu Wilson Martins, que não hesita em considerar essa conferência “um dos grandes textos de nossa literatura política”, ali a política transformava-se em teologia e o homem passava a pertencer, “alma e corpo, à nação, ao Estado, ao partido”, juntando-se a esse valor, carregado de eletricidade emocional, o aparecimento do “mito solar da personalidade”, da “personalidade carismática”.
Personalidade carismática que “é o centro da integração política”, disse então Francisco Campos. “Quanto mais volumosas e ativas as massas, tanto mais a integração política só se torna possível mediante o ditado de uma vontade pessoal. O regime político das massas é o da ditadura... Há uma relação de contraponto entre massa e César. Os ouvidos habituados a distinguir, à distância, o rumor das coisas que se aproximam, percebem, sob o tropel confuso das massas, cuja sombra começa a dominar o horizonte da nossa cultura, os passos do homem do destino... Não há, a estas horas, país que não esteja à procura de um homem, isto é, de um homem carismático ou marcado pelo destino para dar às aspirações da massa uma expressão simbólica, imprimindo a unidade de uma vontade dura e poderosa ao caos de angústia e de medo de que se compõe o patos ou a demonia das representações coletivas. Não há hoje um povo que não clame por um César.”
Em março de 1936, ao saudar a posse de Afonso Pena Júnior na reitoria da Universidade do Distrito Federal, falou sobre o comunismo: “As monstruosas ideologias internacionalistas visam apenas enfraquecer a humanidade no homem para transformá-lo mais facilmente em animal de um rebanho miserável, tangido pela fome e pelo medo.” Em julho, discursando acerca da reintrodução do ensino religioso nas escolas públicas, explicitou sua posição anticomunista, antes de aludir à tentativa insurrecional de novembro anterior: “Há três laços que reúnem os homens — a religião, a família e a pátria. Mais do que ninguém o comunismo sabe disso. Ele combate os três ao mesmo tempo e em cada um deles combate os outros dois.”
Uma das idéias mais caras a Francisco Campos era a da unidade de um estado nacional. Segundo Jarbas Medeiros, seu pensamento, que o credenciaria a montar o arcabouço jurídico-institucional do Estado Novo, pode ser sintetizado nos seguintes aspectos: 1) uma visão apocalíptica do período que se vivia (“nunca falhou em tão grande escala a confiança humana na coerência do universo do pensamento e do universo da ação”); 2) uma visão da sociedade moderna como “sociedade de massa” (“quem quiser saber qual o processo pelo qual se formam efetivamente, hoje em dia, as decisões políticas, contemple a massa alemã, medusada sob a ação carismática do Führer”); 3) uma visão do Estado moderno como Estado autoritário e antiliberal (“o que o Estado totalitário realiza é — mediante o emprego da violência, que não obedece, como nos Estados democráticos, a métodos jurídicos nem à atenuação feminina da chicana forense — a eliminação das formas exteriores ou ostensivas de tensão política”; “o sufrágio universal, a representação direta, o voto secreto e proporcional, a duração rápida do mandato presidencial foram meios impróprios, senão funestos, aos ideais democráticos”; “para as decisões políticas, uma sala de parlamento tem hoje a mesma importância que uma sala de museu”); 4) uma apologia das elites, vistas como agentes da história (“as transformações não se operaram pela ação da mentalidade primitiva das multidões e dos seus líderes, mas pela influência das ciências e das artes, filósofos, pesquisadores, cientistas, engenheiros, artistas”).
O Estado Novo
Ao longo de 1936 foi se firmando a candidatura do governador paulista Armando de Sales Oliveira à sucessão presidencial prevista para 1938. Sua candidatura foi lançada extra-oficialmente em dezembro, quando ele deixou o governo de seu estado para se desincompatibilizar. Paralelamente, a hipótese de golpe se transformava em tendência e esta em articulação consciente a partir da hierarquia militar e do governo federal.
Getúlio, que conduzia com tato o desdobramento da perspectiva golpista e precisava ganhar tempo, fixou-se, depois de examinar outros nomes, na candidatura de José Américo de Almeida, lançada oficialmente em 25 de maio de 1937. Entretanto, a articulação golpista prosperava, capitaneada pelos dois homens fortes do Exército, os generais Góis Monteiro (chefe do Estado-Maior do Exército) e Eurico Gaspar Dutra (ministro da Guerra).
Desde fins de 1936, Francisco Campos, acionado por Vargas, adaptava um substitutivo à Constituição de 1934 — que não fora conveniente apresentar durante os trabalhos da Constituinte —, para transformá-lo em projeto da Constituição a ser outorgada após o golpe de Estado. Em meados de 1937, ultimou esse trabalho com a colaboração, entre outros, de Vicente Rao, titular da pasta da Justiça entre julho de 1934 e janeiro de 1937. Conduziu também, junto ao chefe nacional do integralismo, Plínio Salgado, os entendimentos visando o apoio desse movimento ao golpe. Em meados de setembro, encontrou-se com Plínio na casa de Amaro Lanari. Segundo relato do chefe da AIB em carta a Getúlio datada de 28 de janeiro de 1938, Francisco Campos entregou-lhe o texto do projeto de Constituição e, dizendo-se autorizado por Vargas, pediu o apoio de Plínio para o golpe, dando 24 horas para a resposta e solicitando o mais absoluto sigilo.
No dia seguinte, em novo encontro na casa de Amaro Lanari, Plínio disse que, embora não sendo em princípio contrário ao Estado corporativo, achava desnecessária a outorga de uma nova Constituição, julgando suficientes “reformas na Carta de 1934, substituindo o sufrágio universal pelo voto corporativo e dando maior amplitude ao Estado no concernente aos poderes de interferência no ritmo econômico-financeiro e no tocante ao fortalecimento do poder central”. E ainda: “Uma vez que eu não conseguia demover o governo do propósito da outorga e que o governo se achava apoiado, segundo o dr. Campos me afirmava, pelo Exército e pela Marinha, o integralismo não criaria dificuldades, mesmo porque não tinha elementos para se opor e, nesse caso, confiaria no patriotismo do sr. presidente da República, cujos propósitos nacionalistas não punha em dúvida.”
Perguntado sobre qual seria a situação da AIB, Francisco Campos respondeu a Plínio que ela “seria a base do Estado Novo”, acrescentando que o integralismo deveria ampliar seus quadros para receber todos os brasileiros que quisessem apoiar Vargas. Pediu a Plínio que ficasse oito dias com o projeto de Constituição e lhe apresentasse um parecer. Houve novo encontro ao fim do prazo combinado. Plínio Salgado achava que “a Constituição, como estava, não concretizava a doutrina integralista, na sua totalidade”, mas que os integralistas, “fiéis à nossa ética”, aceitariam o fato consumado e tomariam a Constituição “como uma etapa inicial até atingir-se a democracia orgânica como tínhamos sonhado”. Proclamou o caráter democrático do integralismo e a diferença de seu projeto em relação aos regimes fascista ou nazista.
“O dr. Francisco Campos, plenamente satisfeito, declarou sorrindo ao dr. Lanari que não sabia que eu era tão liberal”, escreveu ainda Plínio, acrescentando: “De minha parte, como conheço as idéias fascistas do sr. Campos, eu me imaginava mais próximo do pensamento do presidente do que ele próprio.” Finalmente, Francisco Campos deu a Plínio a notícia da apreensão de um documento que “iria criar um grande ambiente para o golpe, pois diante de tal documento o perigo comunista se apresentava tão grave que se tornaria necessário o estado de guerra”.
No dia 30 de setembro, a conspiração entrou em fase final: o Estado-Maior do Exército anunciou à nação que tinha apreendido “instruções da Internacional Comunista (Komintern) para a ação de seus agentes no Brasil”, constituindo um plano de tomada de poder que foi batizado de Plano Cohen. Elaborado na verdade pelo capitão Olímpio Mourão Filho — chefe do serviço secreto da AIB e oficial lotado no Estado-Maior do Exército —, o documento, confirmando o vaticínio de Francisco Campos a Plínio Salgado, serviu de pretexto, numa base anticomunista com tinturas anti-semitas, ao golpe em marcha.
No dia 1º de outubro, a Câmara dos Deputados aprovou mensagem do Executivo pedindo nova decretação do estado de guerra, que fora suspenso em julho. No dia 18, o governador gaúcho José Antônio Flores da Cunha, acossado pelo Exército, por Getúlio e pela oposição local, renunciou a seu cargo e seguiu para Montevidéu. Era um dos mais importantes partidários da candidatura de Armando Sales.
No dia 27 de outubro, com o golpe já marcado para 15 de novembro, teve início a Missão Negrão de Lima. A missão do deputado federal Francisco Negrão de Lima, representante mineiro, consistiu em contactar os governadores do Norte e Nordeste, comunicando-lhes os pontos básicos das mudanças institucionais em preparação e sondando-os a respeito de suas posições em face do golpe.
Antes de embarcar num avião colocado à sua disposição pelo governo, Negrão foi à casa de Francisco Campos e fez uma leitura do texto da Constituição a ser outorgada.
Todos os governadores consultados por Negrão se declararam de acordo com o golpe e ele voltou ao Rio em 1º de novembro. Antes de embarcar para Minas — onde o governador Benedito Valadares queria retê-lo para evitar que, assediado por parlamentares e jornalistas, acabasse cometendo alguma indiscrição —, passou pela casa de Francisco Campos e comunicou-lhe, para que este transmitisse a notícia a Getúlio, que havia cumprido sua missão.
A natureza da Missão Negrão de Lima acabou sendo divulgada pelo Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, no dia 5 de novembro, mas Getúlio armou com a ajuda de Benedito Valadares um esquema para desmentir a denúncia. Francisco Campos, muito procurado, também negava a seus interlocutores que as versões em circulação fossem verdadeiras. No próprio dia 5, alegando fadiga, o ministro da Justiça, José Carlos de Macedo Soares, entregou a Vargas sua carta de demissão. Horas depois, Getúlio comunicou aos altos chefes militares que o novo ministro seria Francisco Campos.
No dia 8, o texto da Constituição a ser outorgada foi examinado na casa de Francisco Campos por Góis Monteiro e pelos ministros da Guerra, general Eurico Dutra, e da Marinha, almirante Aristides Guilhem. Os homens fortes da hierarquia militar concordaram com o teor da Carta, introduzindo pequenas modificações nos dispositivos atinentes às forças armadas.
Em 9 de novembro, foi lido na Câmara dos Deputados um manifesto de Armando Sales aos chefes militares, pedindo-lhes que garantissem a ordem constitucional ameaçada. Diante disso, Getúlio reuniu o ministério no mesmo dia e antecipou a data do golpe, com a concordância de todos, à exceção de Odilon Braga, ministro da Agricultura. Francisco Campos tomou posse no Ministério da Justiça e Negrão de Lima foi designado seu chefe de gabinete. O golpe foi dado no dia 10, com o fechamento do Congresso Nacional, das assembléias estaduais e das câmaras de vereadores e com a outorga da nova Constituição, que o novo ministro da Justiça anunciou como “remédio nacional contra as moléstias que assolavam o país”.
A Constituição de 1937
Em longa entrevista à imprensa ainda em novembro — e de cujas repercussões negativas nos Estados Unidos o embaixador do Brasil em Washington, Osvaldo Aranha, se queixaria a Getúlio —, Francisco Campos afirmou que “a Revolução de 30 só se operou, efetivamente, em 10 de novembro de 1937”. Referindo-se ao manifesto lançado por Vargas nessa data, observou que o país vivera, “durante mais de 40 anos, em regime constitucional teórico e em estado de inconstitucionalidade crônica, mal dissimulado por instituições que já haviam caducado antes de viver”. Referiu-se ao “monstruoso aparelhamento” da Constituição de 1934, do qual uma das peças era o Poder Legislativo, cuja “incapacidade para legislar é hoje um dado definitivamente adquirido não só pela ciência política como pela experiência das instituições representativas”. “O Brasil estava cansado”, prosseguia. “O Brasil estava enjoado, o Brasil não acreditava, o Brasil não confiava. O Brasil pedia ordem, e, dia a dia, agravava-se o seu estado de desordem”. Daí a outorga da nova Constituição, cujas características resumiu.
Restringindo o uso do sufrágio universal — um “mito” —, a nova Carta não fizera mais do que “aceitar uma situação de fato, hoje geral no mundo”. “A maior parte dos eleitores não se preocupa com a coisa pública”, explicava, porque “cada vez mais os problemas em torno dos quais se fere a luta dos partidos tendem a ser problemas técnicos... impróprios a provocar nas massas a emoção”. Ademais, sendo o sistema de educação “mais ou menos fechado, acessível tão-somente a um pequeno número”, as massas, ignorantes, não podiam tomar decisões com conhecimento de causa: “A massa eleitoral continua em estado de ingenuidade em relação aos problemas capitais da política e do governo.”
“A nova Constituição é profundamente democrática. Aliás, a expressão democrática... não tem um conteúdo definido, ou não conota valores eternos.” Segundo Francisco Campos, a democracia reinante no século XIX ‘‘era uma atitude de revolta contra a ordem estabelecida” e, conseqüentemente, “as constituições tinham um caráter eminentemente negativo: declaravam os limites do governo”. Entretanto, “a liberdade individual e as garantias não resolviam o problema do homem”. Na nova declaração de direitos, “o cidadão deixa de ser homem livre, ou o homem em revolta contra o poder, para ser o titular de novos direitos, positivos e concretos... O princípio de liberdade não garantiu a ninguém o direito ao trabalho, à educação, à segurança. Só o Estado forte pode exercer a arbitragem justa”.
“No regime liberal”, disse ainda, “organizou-se um novo feudalismo econômico e político”. Já o regime corporativo que pretendia ver implantado “não exclui a liberdade; apenas torna justo o seu exercício”. Uma vez que “o liberalismo político e econômico conduz ao comunismo” (o qual se fundaria, “precisamente, na generalização à vida econômica dos princípios, das técnicas e dos processos do liberalismo político”), o remédio seria o corporativismo, que “mata o comunismo como o liberalismo gera o comunismo. O corporativismo interrompe o processo de decomposição do mundo capitalista previsto por Marx como resultante da anarquia liberal”.
Jarbas Medeiros resumiu assim as linhas de força da Constituição de 1937: “a) a preeminência da União Federal sobre os estados e os municípios; b) a preeminência do Poder Executivo sobre os demais poderes do Estado; c) a preeminência dos interesses do Estado sobre os interesses dos indivíduos e das associações ‘intermédias’. Esta hierarquia política estruturou, juridicamente, a Constituição. O Poder Legislativo nela é exercido simultaneamente por três órgãos: a) o presidente da República; b) o Parlamento — Câmara dos Deputados e Conselho Federal; c) o Conselho da Economia Nacional, encarregado de dar uma estrutura corporativa ao nosso sistema econômico.” Todos esses órgãos seriam constituídos pelo voto indireto.
Outras características da Carta de 1937, segundo o mesmo autor, seriam: “Os direitos e garantias individuais são limitados na medida dos interesses da ordem política e social, e estabelecia-se a censura prévia da imprensa. Na ordem econômica, tentava-se um compromisso entre a iniciativa privada... e a organização corporativa da economia... A legislação social e trabalhista é consagrada no corpo da Constituição, proibindo-se as greves.” O texto previa a nacionalização “progressiva das minas, jazidas minerais e quedas d’água ou outras fontes de energia, assim como das indústrias consideradas básicas ou essenciais à defesa econômica ou militar da Nação”. Além de manter o estado de guerra, criava o estado de emergência. “Durante a vigência destes”, prossegue Jarbas Medeiros, “a Constituição deixaria de vigorar nas partes indicadas pelo presidente da República... Nas Disposições Transitórias já se declarava vigente o estado de emergência no país, que permaneceu sob ele até 1945. Como o artigo 180 autorizava o presidente a expedir decretos-leis ‘enquanto não se reunir o Parlamento nacional’ e este, no estado de emergência, não foi convocado, todo o período do Estado Novo foi administrado pelo regime dos decretos-leis.”
Conforme escreveram Afonso Arinos de Melo Franco e Raimundo Faoro nos verbetes “Direito” e “Constituição” da enciclopédia Mirador, “a Constituição do Estado Novo não chegou a ser aplicada”. Vargas “não quis levar adiante as medidas que a Constituição previa como necessárias à sua entrada em vigor. Preferiu governar indefinidamente, sem qualquer sistema limitativo de seus poderes, atribuindo-lhes uma extensão que o artigo 180... invariavelmente referido, estava longe de conter”.
Explicam os dois autores que a inviabilidade prática da Constituição arquitetada por Francisco Campos, filiando-se “aos modelos europeus, especialmente polonês (daí o apelido depreciativo de polaca) e italiano”, decorreu do fato de que “as condições do Brasil eram diversas das de outros países que adotaram sistemas antidemocráticos”. O jurista mineiro seguira a trilha dos seus antecessores, “tais como Antônio Carlos e Carneiro de Campos, para a Constituição do Império de 1824; Rui Barbosa e os membros da Comissão dos Cinco, para a Constituição da República de 1891; Assis Brasil, João Mangabeira e Oliveira Viana, para a Constituição de 1934. Francisco Campos acompanhou-lhes o método ao adotar, sem adaptar, princípios recentemente instaurados em países muito diferentes do Brasil”.
“Esse artificialismo, nas vezes anteriores, exigia uma acomodação que se fazia por meio de expedientes jurídicos... Mas, agora, tais reverências à legalidade não eram necessárias. O ambiente mundial as dispensava. Vargas não precisou de muita cerimônia para deixar de aplicar a Carta que ele mesmo outorgara. Daí o fato de o regime do Estado Novo não se dirigir pela Carta de 10 de novembro, aplicada somente na parte que previa a outorga de poderes excepcionais ao presidente da República.”
No dia 10 de maio de 1938, Francisco Campos organizou no Ministério da Justiça uma solenidade para comemorar os seis meses do Estado Novo. Com o 10 de novembro, disse então em discurso, começou para o Brasil “o clima da ordem: não apenas o da ordem nas ruas, mas, antes de tudo, e sobretudo, o clima da ordem no Estado”. Dentro da nova ordem, disse, “nosso Estado é hoje um Estado nacional”. No primeiro semestre de sua existência, instaurara “uma autoridade nacional: um só governo, um só chefe, um só Exército... Um chefe, um povo, uma nação: um Estado nacional e popular... O Estado Novo não é uma controvérsia nas nuvens, mas uma realidade na terra. O que está feito está feito e foi feito para o bem do Brasil”.
Às primeiras horas do dia 11 de maio, os integralistas de Plínio Salgado tentaram um golpe de Estado, assaltando o palácio Guanabara, residência de Vargas. O assalto fracassou diante da resistência, mesmo precária, dos ocupantes do palácio e da ação improvisada do general Dutra, ministro da Guerra. Fazia igualmente parte dos planos dos sediciosos, planos em sua maior parte abandonados, a prisão do ministro da Justiça em sua residência, mas esta ação não chegou a se realizar.
No dia 16 de maio, para fortalecer o governo, foram promulgadas as leis constitucionais números 1 e 2. A primeira estabelecia a pena de morte para os atos de subversão e a segunda dava duração indeterminada aos poderes do presidente para punir funcionários e militares, poderes já peremptos na ocasião.
O Ministério da Justiça foi ocupado interinamente pelo chefe de gabinete Negrão de Lima em setembro de 1938, em março e em agosto de 1939 e de janeiro a março de 1941. Em agosto-setembro de 1941, Campos foi substituído em caráter interino por Vasco Leitão da Cunha, que por sua vez substituíra Negrão. Operado da tireóide, teve seu pedido de demissão negado por Vargas, que ainda em setembro designou mais uma vez Leitão da Cunha para responder pelo expediente durante seu afastamento. Entretanto, a interinidade de Vasco Leitão da Cunha, que se prolongaria até julho de 1942, assinalou concretamente o afastamento definitivo de Francisco Campos do ministério.
Durante sua gestão, Francisco Campos elaborou outras emendas ao texto constitucional ou regulamentações que foram editadas por Getúlio. O Decreto-Lei nº 1.202 (8/4/1939), que dispunha sobre a administração dos estados e municípios, era, segundo Afonso Arinos de Melo Franco e Raimundo Faoro, “uma longa e minuciosa regulamentação do federalismo do Estado Novo”. As leis constitucionais nº 3 e nº 4, de 18 e 20 de setembro de 1940, alteraram o sistema tributário previsto na Carta de 1937. Francisco Campos promoveu também as reformas do Código de Processo Civil (1939), do Código Penal (1940) e do Código de Processo Penal (1941), elaborando ainda um anteprojeto de novo Código Civil. Publicou a Lei do Júri, a Lei dos Serviços da Justiça Federal, a Lei Orgânica do Ministério Público Federal, a Lei de Segurança (reorganizando ao mesmo tempo o Tribunal de Segurança, tribunal de exceção que começara a funcionar em setembro de 1936), a Lei das Contravenções Penais, as leis de Loteamento de Terrenos, de Economia Popular, de Fronteiras, de Nacionalidade, de Extradição e Expulsão de Estrangeiros, de Imigração, de Atividades Políticas de Estrangeiros e de Dissolução dos Partidos Políticos.
Segundo Jarbas Medeiros, “a reforma da legislação penal, processual e das contravenções obedeceu ao critério de maior repressão e de maior restrição aos direitos e garantias individuais, assim como ao da ampliação dos fatos considerados como delituosos”. Segundo o próprio Francisco Campos, “impunha-se o seu aperfeiçoamento ao objetivo de maior facilidade e energia de ação repressiva do Estado... O futuro Código, orientado pelo propósito de uma efetiva defesa social, criará, pela disciplina das penas e das medidas de segurança, um aparelhamento mais rigoroso para a repressão dos crimes”.
As concepções de Francisco Campos em relação ao nacionalismo econômico são também reveladas por Jarbas Medeiros. Ao tratar do Código de Águas e Minas, disse Campos: “Nós conhecemos o número e a força dos interesses que se movimentam em torno das riquezas nacionais e que nos cumpre reduzir aos seus limites legítimos se quisermos continuar como donos desta terra.” E, quanto ao petróleo: “O abastecimento do combustível... não podia ficar à mercê das competições e dos acordos privados, que não tinham outro fim senão auferir o maior lucro no menor tempo possível.” Ao mesmo tempo, as pesquisas do combustível nacional “estavam sendo inexplicavelmente prejudicadas”.
Sua gestão no Ministério da Justiça correspondeu a um período de grande repressão política, com o prosseguimento das prisões de comunistas e antifascistas que vinham ocorrendo desde 1935. Depois de maio de 1938, também integralistas, em grande número (mas ficando de fora os grandes líderes, como Plínio Salgado), passaram a ser presos. As polícias estaduais foram reforçadas, com novos tipos de organizações policiais e verbas secretas. Em toda parte, foram feitas denúncias contra a tortura e a violência vigentes nas prisões.
Desagregação do Estado Novo
Em janeiro de 1942 o Brasil rompeu relações diplomáticas com os países do Eixo, a Alemanha, a Itália e o Japão. Já em fevereiro, os primeiros navios mercantes brasileiros foram torpedeados por submarinos alemães. A situação mundial se modificara com a entrada dos Estados Unidos na guerra. Decorria disso a pressão exercida pelo governo norte-americano sobre o brasileiro no sentido de uma clara definição pró-Aliados.
Em julho de 1942, os estudantes cariocas organizaram, para comemorar a data da independência norte-americana (4 de julho), uma “passeata antitotalitária”, iniciativa inédita sob o Estado Novo e que contou com o apoio de Osvaldo Aranha (na ocasião, ministro das Relações Exteriores) e do interventor no estado do Rio, Ernâni Amaral Peixoto. O chefe de polícia, Filinto Müller, tentou impedi-la e, para tanto, dirigiu-se a Vasco Leitão da Cunha, com quem teve uma áspera discussão. O ministro interino da Justiça mandou prender Filinto por desacato à autoridade. A passeata se realizou e, em conseqüência do incidente, deixaram seus cargos Francisco Campos (que reassumira três dias antes e renovara seu pedido de demissão), Vasco Leitão da Cunha, Filinto Müller e Lourival Fontes, chefe do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). O Ministério da Justiça passou a ser acumulado então pelo ministro do Trabalho, Alexandre Marcondes Filho. Essas demissões foram interpretadas como um primeiro abalo sério do regime ditatorial.
Em janeiro de 1943, com a morte de Afrânio de Melo Franco, Francisco Campos foi nomeado por Getúlio para substituí-lo na presidência da Comissão Jurídica Interamericana, organismo internacional sediado no Brasil e presidido por um representante do governo brasileiro. Passou a dedicar-se, além disso, a seu escritório de advocacia, ao magistério na Faculdade Nacional de Direito e à sua extensa propriedade no interior de Minas, a fazenda do Indostão, próxima do município de Pompéu, onde criaria gado até o fim de seus dias.
Segundo John Foster Dulles, em novembro de 1944, quando o edifício do Estado Novo entrava em processo acelerado de demolição, Francisco Campos tentou convencer Getúlio a se adaptar e adotar a causa da democracia e da liberdade de imprensa, assumindo “a liderança da oposição contra o governo”. Pouco depois, sugeriu ao ministro da Guerra que a Carta de 1937 fosse emendada e convocada uma assembléia para aprovar essa Constituição emendada ou mesmo substituí-la por uma nova. Dutra aprovou plenamente suas recomendações. Entretanto, participou em seguida, com Marcondes Filho e Góis Monteiro, da elaboração de um documento que propunha a realização de um plebiscito, em lugar da convocação de uma constituinte, eleições diretas e indicação de Vargas para um novo período. O documento foi entregue a Getúlio em 22 de fevereiro de 1945. Nessa mesma data uma entrevista de José Américo de Almeida ao Correio da Manhã derrubou a censura à imprensa e a realização de eleições gerais no Brasil foi oficialmente anunciada.
Seis dias depois foi promulgada a Lei Constitucional nº 9, conhecida como Ato Adicional, que previa eleições com a data a ser marcada dentro de 90 dias. O Ato Adicional foi classificado pelos jornais como “uma reforma de moldes fascistas” e condenado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). No dia 2 de março, uma manifestação de 16 professores da Faculdade Nacional de Direito acusou a Constituição de 1937 de ilegítima para daí concluir que também o era a Lei Constitucional nº 9.
A resposta de Francisco Campos veio no dia seguinte, sob a forma de uma entrevista ao diário O Jornal, do Rio de Janeiro, considerada um marco do processo de decomposição do Estado Novo. Na entrevista, afirmava que a Constituição de 1937 “nada tem de fascista... Os males que, porventura, tenham resultado para o país do regime instaurado pelo golpe de Estado de 1937 — prosseguia — não podem ser atribuídos à Constituição. Esta não chegou a vigorar. E, se tivesse vigorado, teria certamente constituído uma importante limitação ao exercício do poder. Poderia haver, ao lado ou à sombra da Constituição de 1937, ideologias ou individualidades fascistas. Eram, porém, fascistas frustos, larvados (no bom sentido latino) ou inacabados, sem o fundo das grandes culturas históricas, cujo espírito os autênticos fascistas europeus haviam traído, assimilando o seu aspecto técnico e dinâmico e esquecendo os seus valores de sentido e direção... O nosso regime, de 1937 até hoje, tem sido uma ditadura puramente pessoal”.
E explicitava uma guinada em suas posições, em função das novas circunstâncias: “Na guerra, tomamos um partido, e precisamente o partido cuja ideologia política está em manifesto desacordo com a estrutura ideológica da Constituição... Não podemos, militarmente vitoriosos na guerra, deixar que subsistam motivos para sermos colocados, do ponto de vista ideológico, no campo dos vencidos. Atualizemos as nossas instituições políticas, transformando-as no sentido das correntes espirituais e culturais que já anunciam claramente a configuração do mundo de amanhã.”
Já que “as forças plásticas que neste momento dominam o pensamento político e o sentimento público são de fundo democrático,... é inútil qualquer tentativa destinada a subtrair à sua influência a modelagem das instituições políticas”. Reconhecia adiante que a Constituição de 1937 “é radicalmente contrária à liberdade de opinião”, a qual “é da substância do regime democrático”. Assim, reformar a Constituição através do Ato Adicional não resolveria, inclusive porque ela “não tem mais vigência constitucional”, sendo “um documento de caráter puramente histórico e não-jurídico”.
Acrescentava que “a tese implícita no Ato Adicional é que o poder constituinte, ao invés de residir no povo, reside no chefe do governo. Ora, essa tese é o fundamento do regime totalitário e o primeiro postulado desse regime”. E concluía: “Diante dos erros irreparáveis cometidos pelo governo, que teve a fraqueza de, em questões morais e políticas da importância mais capital, ceder à pressão dos seus áulicos, escribas e leguleios, só vejo uma solução, atendendo o sr. Getúlio Vargas aos conselhos de sua consciência e às inspirações do seu patriotismo: restituir à nação o governo de si mesma, e, para isto, passar o poder a uma autoridade capaz, eminente e responsável, para que esta, imediatamente, convoque o país à primeira e inadiável deliberação, que é eleger uma assembléia com a autoridade necessária para tomar decisões fundamentais de caráter constitucional... O sr. Getúlio Vargas já pensou demais em si mesmo. É tempo que pense um pouco no Brasil e no seu povo.”
Embora tenha reformulado daí por diante alguns aspectos de seu ideário, o que moveu Francisco Campos em 1945, além da percepção da nova realidade internacional, foi sobretudo sua sensibilidade para a inclinação predominante na alta cúpula militar do país. A mesma entrevista deixava isto claro: “talvez que, se o sr. Getúlio Vargas consultasse os fiadores do golpe de Estado de 1937, isto é, as classes armadas, outro não seria o seu conselho, ou outra não poderia ser a sua decisão”.
Essa sensibilidade o levaria, já em 29 de outubro de 1945, a participar na conspiração que, através de um golpe militar, derrubou Vargas. E a conspirar, nas duas décadas seguintes, novamente contra Vargas (1954) e contra Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart, conforme revelação dele próprio reportada pela revista Veja.
O jurista fora do poder
Definitivamente afastado dos cargos políticos, Francisco Campos permaneceu na presidência da Comissão Jurídica Interamericana até 18 de março de 1955, quando foi substituído por Francisco de San Tiago Dantas. Em seu discurso de saudação a Francisco Campos, San Tiago Dantas afirmou que ele e Rui Barbosa haviam sido “as duas forças intelectuais mais poderosas que acionaram, entre nós, a cultura jurídica nos últimos 50 anos”. Enquanto a de Rui Barbosa havia operado “no sentido da elevação dos princípios jurídicos, principalmente dos princípios do liberalismo, à dignidade de um credo social”, a de Francisco Campos operara “no sentido do reexame das construções jurídicas em face das condições sociais e políticas que nelas se encarnam” e abrira o caminho da “modernização de inúmeras instituições”. Isso através das reformas do ensino secundário e superior e, principalmente, “escolhendo, modificando, substituindo, registrando e afinal dotando o país de um corpo de leis que, embora elaborado sob um regime político depois repudiado, pôde subsistir praticamente intacto nos quadros legais do Estado democrático restaurado.”
Em 1949, numa conferência intitulada Atualidade de Dom Quixote, Francisco Campos mostrou, como observa Jarbas Medeiros, que conservara sua visão apocalíptica. Identificando em Sancho Pança as “massas populares”, via em Dom Quixote o espírito e o ideal dominadores, o guia e redentor da humanidade. Entre ambos, um vínculo milenar, que estava prestes a romper-se em face da “sinistra mascarada das revoluções”, quando os “seres noturnos”, o “mundo subterrâneo”, movidos pela “raiva da destruição”, teriam começado já o “assalto”, reinando “em todos os domínios a troca, a confusão, a desfiguração ou a mistificação dos valores”. Por isso, o mundo pedia “uma cruzada”: “Este nosso mundo de hoje, que é como Sancho abandonado por seu amo, reclama a volta de Dom Quixote, por sentir que sem ele a sua vida não teria sentido. De todos os lados, sob os mais diversos nomes e as mais contraditórias aparências, o que o homem dos nossos dias pede e reclama, o que ansiosamente espera — é o retorno de Dom Quixote.”
Em 1950, segundo Jarbas Medeiros, ostentava “uma visível orientação neoliberal, ao lado de seu permanente e tradicional anticomunismo. Ao contrário de sua perspectiva dos anos 1920, 1930 e parte dos 1940, ele assinala agora, como essência da crise do direito, aquilo que antes significava uma tendência natural e necessária”, ou seja, nas palavras do próprio Campos, “um movimento progressivo, em escala gigantesca, de absorção ou de usurpação pelo direito público de extensas zonas até então reservadas ao império do direito privado”.
No ano seguinte, discursando num congresso de pecuaristas, condenou o processo inflacionário brasileiro (no qual a cidade estava “esmagando o campo”) e defendeu os interesses da agricultura e da pecuária. Passara, como observou Jarbas Medeiros, a uma posição “ruralizante, anticosmopolita e tradicionalista”, posição visível em trechos como este: “A vida rural ou o campo representam para a nau do Estado o que é o lastro para o navio.”
Em 1953, foi convidado pelo governador mineiro Juscelino Kubitschek a discursar em Ouro Preto (MG) nas comemorações da morte de Tiradentes. Na ocasião, assim definiu seu neoliberalismo: “Não me refiro a entendimentos e conchavos políticos, ou à extinção das condições essenciais a uma vida pública decente, que só poderá manter-se em uma atmosfera de choques e de controvérsias políticas por ser da natureza da opinião pública o não ser monolítica ou maciça, mas de se compor da variedade, da diversidade e da multiplicidade das correntes de opiniões individuais, de grupos e de partidos... Esta é uma condição essencial ao funcionamento do regime democrático.” Em seu discurso, sobre “os problemas cruciais da economia brasileira”, propôs como solução para os nossos problemas econômicos a “decisão heróica de restaurar a agricultura” e o “restabelecimento do principio da livre empresa e da livre concorrência”.
É ainda de Jarbas Medeiros esta síntese de seu pensamento no período posterior a 1945: “Tanto sua produção jurídica quanto seus textos políticos desta fase enfatizam favoravelmente o liberalismo econômico e político, o constitucionalismo democrático-liberal, a liberdade de imprensa, a autolimitação, no tempo, dos períodos de exceção constitucional etc. Manifesta-se contrário à reforma agrária, a qualquer necessidade de uma política especificamente voltada para a distribuição da renda, nega qualquer processo espoliativo do capital estrangeiro entre nós, assinalando, ao contrário, sua contribuição histórica positiva para o nosso país, procura mostrar que o abuso do poder econômico era, de fato, exercido pelo Estado, ataca o monopólio do petróleo justamente porque estatal, e vê na inflação o verdadeiro processo espoliativo e desarticulador de nossa economia e de nossas finanças”, atribuindo-a, em suas próprias palavras, “à ignorância, à preguiça, à leviandade, ao delírio de grandeza, à irresponsabilidade dos nossos homens públicos”. No início da década de 1960, fez parte de uma comissão encarregada de elaborar um projeto de novo Código Civil.
Logo após o plebiscito de 6 de janeiro de 1963, que determinou o fim do parlamentarismo, os ministros militares do governo Jânio Quadros (marechal Odílio Denis, almirante Sílvio Heck e brigadeiro Gabriel Grün Moss) começaram a conspirar contra o governo de João Goulart no presidencialismo restaurado. Segundo Hélio Silva, a conspiração militar teve como iniciador e chefe o marechal Denis, em cuja residência se realizaram as primeiras reuniões. Prosseguiu em Petrópolis (RJ), no edifício Centenário, onde tinham apartamentos de veraneio o próprio marechal, o brigadeiro Eduardo Gomes, Francisco Campos e Antônio Néder (que seria depois ministro do Supremo Tribunal Federal). Sílvio Heck e Grün Moss também tinham residência secundária em Petrópolis, para onde se dirigiam, ainda, os generais Osvaldo Cordeiro de Farias e Nélson de Melo. Ao longo de 1963 e no início de 1964, a preparação do golpe de Estado ampliou-se e diversificou-se em vários núcleos conspirativos.
Vitorioso o movimento, em 1º de abril de 1964, Artur da Costa e Silva, o mais antigo general em serviço, assumiu as funções de “comandante-em-chefe do Exército Nacional”. No dia 4 de abril, o presidente da República em exercício, Pascoal Ranieri Mazzilli, homologou formalmente uma situação de fato, nomeando Costa e Silva ministro da Guerra. Nomeou também, para os ministérios da Marinha e da Aeronáutica, o almirante Augusto Rademaker e o brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo.
Durante a crise do início de abril, o Congresso Nacional evitou formalizar a saída de João Goulart da presidência da República. “Muitos políticos, mormente no PSD (Partido Social Democrático) e na ala moderada da UDN (União Democrática Nacional), tentaram proceder como se 1964 estivesse fadado a ser pouco diferente das crises anteriores de 1954, 1955 e 1961”, escreveu Thomas Skidmore. Mas “os militares extremistas, logo conhecidos como a ‘linha dura’, estavam agora ansiosos para ganhar o controle da política brasileira”.
Afonso Arinos de Melo Franco, que era na época senador, narrou em entrevista à TV Globo (10/8/1981) que, logo após a derrubada do governo, elaborou uma proposta de ato de emergência do Congresso dando aos três ministros militares, o autodenominado Comando Supremo da Revolução, plenos poderes para agir. Assim, seria reconhecida de fato a preeminência da hierarquia militar na condução dos destinos do país, mas seria juridicamente preservada a faculdade do Congresso de retirar os poderes que estaria concedendo. O senador João Agripino, seu colega de bancada da UDN, trouxe a proposta de Brasília para o Rio.
Entretanto, os chefes militares já haviam encomendado a Francisco Campos e Carlos Medeiros Silva (que seria depois ministro da justiça) a redação da uma legislação revolucionária. Era o Ato Institucional, que mais tarde passou a ser numerado como o primeiro de uma série. Foi assinado pelos três ministros militares no dia 9 de abril de 1964.
Segundo Clóvis Ramalhete, em artigo no Digesto Econômico, “no Ato Institucional de 1964 ergue-se em substância, ainda uma vez, o teórico do Estado e não o constitucionalista. Nas linhas introdutórias, rabiscadas a lápis e de um jato, condensa-se completa a teoria da revolução, entendida como fonte de direito. Francisco Campos despreza a conceituação clássica, rousseauniana, da origem do poder político, e nesta página admite o poder constituinte por imposição, e justifica a preservação do Legislativo e do Judiciário, mas por legitimação renovada, originária do fato revolucionário, e não do mandato primitivo, que foi surpreendido, em meio, pela Revolução, que o legitimou”.
Com efeito, o preâmbulo do AI-1 afirmava: “O que houve e continuará a haver neste momento… é uma autêntica revolução... A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como o Poder Constituinte, se legitima a si mesma.”
“Os processos constitucionais”, prosseguia o preâmbulo redigido por Francisco Campos, “não funcionaram para destituir o governo, que deliberadamente se dispunha a bolchevizar o país”. Entretanto, “para demonstrar que não pretendemos radicalizar o processo revolucionário, decidimos manter a Constituição de 1946, limitando-nos a modificá-la, apenas, na parte relativa aos poderes do presidente da República, a fim de que este possa cumprir a missão de restaurar no Brasil a ordem econômica e financeira e tomar as urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista, cuja purulência já se havia infiltrado não só na cúpula do governo como nas suas dependências administrativas”.
Os três signatários do ato resolviam também manter o Congresso Nacional, “para reduzir ainda mais os plenos poderes de que se acha investida a revolução vitoriosa”. Mas faziam questão de deixar bem claro que “a revolução não procura legitimar-se através do Congresso. Este é que recebe deste Ato Institucional, resultante do exercício do Poder Constituinte, inerente a todas as revoluções, a sua legitimação”.
O ato tinha 11 artigos e permaneceria em vigor até 31 de janeiro de 1966, quando expirariam os mandatos do presidente e do vice-presidente da República, os quais deveriam ser eleitos dentro de 48 horas pelo Congresso. Eliminava todas as inelegibilidades, de modo a permitir a eleição de um militar da ativa. Dava ao futuro presidente uma série de poderes, notadamente os direitos de iniciativa em matéria de emendas constitucionais e projetos de lei e de iniciativa exclusiva na legislação referente à criação ou aumento das despesas públicas.
Suprimia ainda as garantias constitucionais ou legais de inamovibilidade e estabilidade de emprego. Finalmente, seu artigo 10 rezava: “No interesse da paz e da honra nacional, e sem as limitações previstas na Constituição, os comandantes-em-chefe, que editam o presente ato, poderão suspender os direitos políticos pelo prazo de dez anos e cassar mandatos legislativos federais, estaduais e municipais, excluída a apreciação judicial desses atos.” E o parágrafo único do mesmo artigo dava 60 dias de prazo para que, “empossado o presidente da República, este, por indicação do Conselho de Segurança Nacional”, pudesse praticar os atos previstos no artigo.
Na época, escreveu o cronista Rubem Braga: “Toda vez que o sr. Francisco Campos acende sua luz há um curto-circuito nas instalações democráticas brasileiras.”
Já no dia 10, o Comando Supremo da Revolução suspendeu os direitos políticos de cem pessoas e cassou os mandatos de 40 membros do Congresso Nacional, medidas a que se seguiram transferências para a reserva de 145 oficiais das três armas e novas suspensões de direitos políticos, inclusive de 37 oficiais. No dia 11 de abril, o general Humberto Castelo Branco, até então chefe do Estado-Maior do Exército, foi eleito presidente da República pelo Congresso.
Ainda em abril de 1964, Francisco Campos afirmou que “a pressa de normalizar é a perdição de todas as nossas revoluções”. Posteriormente, voltou a ocupar a presidência da Comissão Jurídica Interamericana, cargo que exerceu até falecer (seu substituto foi Vicente Rao, ex-ministro da Justiça). Colaborou, também na elaboração do Ato Institucional nº 2, editado por Castelo Branco em 27 de outubro de 1965. Segundo Luís Viana Filho, Campos considerou o AI-2 “fraco”, em sua versão final. Em novembro de 1966, enviou a Castelo Branco sugestões de cunho autoritário para a elaboração da Constituição que viria a ser promulgada em março de 1967.
Seu último parecer jurídico, datado de 6 de setembro de 1968, foi pedido pela Associação dos Fornecedores de Cana do Estado de Pernambuco. Nele, afirmava ser inconstitucional um decreto de outubro de 1965 estabelecendo a concessão a título gratuito ao trabalhador rural da lavoura canavieira com mais de um ano de serviço, de uma área de terra de até dois hectares, próxima de sua moradia, para seu sustento e o de sua família. O decreto seria inconstitucional “em face das normas constitucionais vigentes especialmente da que garante o direito de propriedade”.
Faleceu em Belo Horizonte no dia 1º de novembro de 1968.
Foi casado com Lavínia Ferreira da Silva, com quem teve duas filhas. Posteriormente, a doença mental de sua esposa levou-o à separação. Passou então a viver com Margarida Leite.
Escreveu A doutrina da população (1916), Introdução crítica à filosofia do direito (1918), Opiniões e debates (1921), Pela civilização mineira (1930), Ciclo de Helena (poesia, 1932), Pareceres (1ª e 2ª séries, 1933 e 1936, republicados com acréscimos em 1956, em dois volumes, sob o título Direito constitucional) Educação e cultura (coletânea, 1940), O Estado nacional (coletânea, 1940), Antecipações à reforma política (coletânea, 1940), Atualidade de Dom Quixote (ensaio, 1967) e Francisco Campos, discursos parlamentares (1979), além de numerosos outros discursos parlamentares e oficiais, exposições de motivos, mensagens, pareceres e artigos sobre matéria jurídica não reunidos em livro. Nos primeiros anos do Estado Novo, o DIP publicou, em opúsculos, diversos discursos de sua autoria e entrevistas que concedeu à imprensa.
Mauro Malin
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