PARTIDO DEMOCRÁTICO SOCIAL (PDS)

PARTIDO DEMOCRÁTICO SOCIAL (PDS)

 

Partido político nacional fundado em janeiro de 1980 para suceder à Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido governista extinto com o fim do bipartidarismo em 29 de novembro de 1979. Fundiu-se em abril de 1993 com o Partido Democrata Cristão (PDC), dando origem ao Partido Progressista Reformador (PPR).

 

Origem: o legado da Arena

Sucessor direto da Arena, o PDS foi o destino das principais lideranças que apoiavam o regime militar. Nasceu governista e majoritário nas duas casas do Congresso Nacional e foi o principal sustentáculo político do presidente João Figueiredo (1979-1985), que a ele se filiou. O mesmo fizeram os mais importantes ministros de Estado da época, como Antônio Delfim Neto (Economia), Golberi do Couto e Silva (Gabinete Civil), César Cals (Minas e Energia), Eliseu Resende (Transportes), Jair Soares (Previdência), Mário Andreazza (Interior) e lbrahim Abi-Ackel (Justiça). Em fevereiro de 1980, o partido já contava com 42 senadores, entre os quais José Sarney, seu primeiro presidente, e 222 deputados federais. Jarbas Passarinho e Nélson Marchezan foram os primeiros líderes pedessistas do governo no Senado e na Câmara, respectivamente.

Ao contrário do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que herdou do extinto Movimento Democrático Brasileiro (MDB) lideranças oriundas sobretudo do Senado, o PDS contou com forte presença de governadores de estado, como Paulo Maluf, de São Paulo; Francelino Pereira, de Minas Gerais; Antônio Carlos Magalhães, da Bahia; Marco Maciel, de Pernambuco; Jorge Bornhausen, de Santa Catarina; Nei Braga, do Paraná; Virgílio Távora, do Ceará; e Alacid Nunes, do Pará. Isso fez com que, na sua origem, fosse considerado um partido de governadores. Foram eles o núcleo constitutivo básico, cuja influência foi decisiva para a organização do partido.

Apesar de seus vínculos com o regime militar, o PDS se autodefinia, em seu manifesto de lançamento, como o “partido da reforma e da transformação” e propunha a implantação de uma “democracia social” no Brasil. O manifesto defendia o voto direto para a eleição de governadores e prefeitos, em consonância com o processo de abertura desencadeado durante o governo Figueiredo. “O PDS propõe fidelidade às instituições republicanas e federativas, baseadas na separação e harmonia dos poderes, e autonomia dos estados e municípios, cujos prefeitos e governadores devem ser eleitos pelo voto direto”, ressaltava o quarto compromisso doutrinário do texto.

Considerado à época menos conservador do que as proposições tradicionais da Arena, o manifesto é sintomático da tentativa do PDS de atrair, além da majoritária base arenista, algumas lideranças que haviam militado na oposição ao regime militar. Nomes como o do senador Amaral Peixoto, ex-líder do MDB no Senado, integraram o grupo que migrou para o PDS na sua fundação.

A convivência desde a origem de facções rivais no PDS precipitou numerosas crises ao longo de sua história. Grupos políticos concorrentes, com raízes na antiga União Democrática Nacional (UDN) ou no Partido Social Democrático (PSD), disputaram o controle regional de muitas seções do partido. Em Minas Gerais, por exemplo, logo nos primeiros anos, políticos de linhagem pessedista, como o ministro Ibrahim Abi-Ackel, opuseram-se a ex-udenistas, como o vice-presidente Aureliano Chaves. Disputas regionais antigas — como o embate no Pará entre os grupos do senador Jarbas Passarinho e do governador Alacid Nunes — explodiram em diversos estados da Federação.

 

O primeiro teste: as eleições de 1982

Nas eleições de 1982, o PDS elegeu a maioria dos governadores de estado, dos deputados federais e dos senadores. Apesar da derrota para a oposição em estados importantes como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraná, o partido venceu a disputa pelos governos do Rio Grande do Sul (Jair Soares), Santa Catarina (Esperidião Amin), Bahia (João Durval), Pernambuco (Roberto Magalhães), Ceará (Luís Gonzaga Mota), Paraíba (Wilson Braga), Piauí (Hugo Napoleão), Alagoas (Divaldo Suruagi), Rio Grande do Norte (José Agripino Maia), Maranhão (Luís Rocha), Sergipe (João Alves Filho) e Mato Grosso (Júlio Campos). Hegemônico na região Nordeste, onde conquistou todos os nove governos, e com bom desempenho na região Sul, perdeu no entanto o controle sobre unidades federativas correspondentes a quase 60% do território e responsáveis por quase 80% do Produto Interno Bruto.

Com 235 deputados federais (49,1% do total) e 15 senadores eleitos (60% do total), o PDS tinha a perspectiva de que a sucessão presidencial seria decidida a seu favor na eleição a ser realizada pelo Colégio Eleitoral em 1985. A vitória de 1982 chegou mesmo a ser combustível para um malsucedido movimento pela reeleição do presidente João Figueiredo, que, apesar de oficialmente rechaçar a proposta, deixou que a idéia fosse defendida até por seus ministros — como fez César Cals em 1983. De toda forma, desde logo os potenciais candidatos do partido à presidência começaram suas articulações visando o Colégio Eleitoral.

 

A dissidência da Frente Liberal

As indicações de que o PDS teria dificuldades para manter-se unido começaram a se tornar nítidas na eleição para o diretório nacional, em 10 de julho de 1983, quando a chapa dissidente Participação alcançou 35% dos votos. Esse resultado demonstrou a dificuldade do governo e das lideranças oficiais para controlar o partido, que já discutia o nome a ser apresentado à sucessão presidencial. O afastamento do presidente João Figueiredo da coordenação do processo de escolha do candidato, anunciada em pronunciamento na TV no final daquele ano, acabou por estimular a disputa interna, acirrada sobretudo em torno das candidaturas de Paulo Maluf e Mário Andreazza, que se sobressaíam entre outros potenciais pré-candidatos.

Após a malograda tentativa da oposição de aprovar a emenda Dante de Oliveira (que instituía eleições presidenciais diretas e não obteve o número de votos necessário para aprovação no Congresso no dia 25 de abril de 1984), a certeza de que a disputa se daria no Colégio Eleitoral precipitou a guerra de bastidores no PDS. Num crescente clima de agressões mútuas entre os grupos adversários, o presidente João Figueiredo decidiu, em 10 de julho de 1984, não realizar as prévias para a escolha do candidato governista.

A versão predominante sobre o episódio do cancelamento das prévias é a de que o presidente Figueiredo queria prejudicar o vice-presidente Aureliano Chaves, possível beneficiário da consulta. Figueiredo teria declarado a vários interlocutores que o único nome para a sua sucessão com o qual não concordaria seria o de Aureliano, que, no exercício interino da presidência durante suas viagens, teria desagradado o círculo mais próximo do presidente.

A decisão de Figueiredo sobre as prévias provocou a renúncia de José Sarney à presidência do PDS, no dia 11 de julho, e marcou o início do rompimento do grupo que desejava a realização da consulta. A dissidência reuniu nomes de expressão no partido, todos contrários à candidatura de Paulo Maluf, como os senadores Marco Maciel, Jorge Bornhausen e Guilherme Palmeira, agregando, em seguida, lideranças como o vice-presidente Aureliano Chaves. Esse foi o embrião da Frente Liberal, que se mostrava disposto a apoiar o candidato do PMDB à presidência, Tancredo Neves. A relutância inicial de Aureliano em apoiar Tancredo dissipou-se diante do compromisso deste de dar representação a todas as forças que o sustentassem. No fim de julho de 1984, a Frente Liberal oficializou seu apoio ao candidato da oposição.

Enquanto se formava a Aliança Democrática entre a Frente Liberal e o PMDB, com a candidatura de José Sarney à vice-presidência na chapa de Tancredo, o PDS caminhava para sua convenção. Em 11 de agosto de 1984, Paulo Maluf derrotou Mário Andreazza, cujos seguidores aderiram à dissidência da Frente Liberal. O ex-governador baiano Antônio Carlos Magalhães foi o principal articulador do apoio dos “andreazzistas” ao candidato do PMDB. O resultado da eleição no Colégio Eleitoral não foi surpreendente: no dia 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves, com 480 votos (166 de parlamentares oriundos do PDS), derrotou Paulo Maluf, com 180.

Ao PDS, restou reunir as forças remanescentes. Desde o lançamento do Partido da Frente Liberal (PFL), em 19 de dezembro de 1984, seguido de sua fundação, em 25 de janeiro de 1985, iniciou-se um período de contínuo esvaziamento do até então partido do governo. Dezenas de parlamentares abandonaram o PDS nos anos seguintes, temendo as dificuldades eleitorais que enfrentariam caso permanecessem na legenda. Entre os que deixaram o PDS ainda em 1985 estavam importantes lideranças, como o deputado Prisco Viana, que havia sido um dos coordenadores da campanha de Paulo Maluf. O esvaziamento pode ser comprovado pelos números: dos 235 deputados federais do início da legislatura, em 1983, o partido conservava 158 em 1985, 95 em 1986, 33 em 1987, 30 em 1988, 32 em 1989 e 29 em 1990.

 

O esvaziamento

Em 1986, as eleições foram marcadas pelo impacto do Plano Cruzado, que levou os candidatos do PMDB à vitória em 22 estados. O PDS, então partido de oposição ao governo Sarney, não elegeu sequer um governador nessas eleições, as primeiras após o racha no partido. A queda foi sentida em todos os níveis. Se em 1982 o partido elegera 476 deputados estaduais no país inteiro (50,3% do total), em 1986 elegeu apenas 80 (8,5%); o número de deputados federais, como foi visto, despencou para 33 (7%), e o de senadores para dois (4,1%). Paulo Maluf, a principal liderança que permaneceu no PDS, foi derrotado na eleição para o governo do estado de São Paulo, ficando com a terceira colocação na disputa vencida por Orestes Quércia, do PMDB.

Na Assembléia Nacional Constituinte, os parlamentares eleitos pelo PDS em 1986 atuaram, majoritariamente, alinhados com as propostas do Centrão, bloco conservador que se formou durante os trabalhos constituintes. Embora não tenha havido votações uniformes e em bloco (muitos parlamentares pedessistas tiveram posições distintas daquelas preconizadas pelas lideranças do partido), a maioria dos deputados e senadores votou contra propostas de limitações à propriedade privada, contra a instituição de novos direitos trabalhistas e contra a nacionalização e a estatização de setores da economia.

O fraco desempenho do partido nas urnas em 1986 repetiu-se nas eleições municipais de 1988, nas quais o PDS elegeu prefeitos em apenas duas capitais —Esperidião Amin, em Florianópolis, e Jorge Kalume, em Rio Branco — e foi novamente derrotado em sua principal base: Paulo Maluf, candidato à prefeitura paulistana, foi ultrapassado na reta final por Luísa Erundina, do Partido dos Trabalhadores (PT). Beneficiada pela crise provocada pela morte de operários na greve da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda, a candidata petista virou os prognósticos das pesquisas, que até poucos dias antes do pleito indicavam vantagem de Maluf.

Mais uma vez Paulo Maluf apresentou-se como candidato do PDS na eleição para a presidência da República em 1989. Seu programa de governo, entre outras medidas, propunha a privatização das estatais, a demissão de duzentos mil funcionários públicos e a livre negociação de salários. Sua campanha ficou marcada por declaração da qual chegou à imprensa trecho em que o candidato, ao falar da violência em apresentação pública, teria dito a frase: “Estupra, mas não mata.” Os adversários utilizaram a frase contra Maluf durante a campanha. No primeiro turno da eleição, Maluf ficou em quinto lugar, com 5.986.575 votos (8,28% do total).

Após a derrota, o PDS apoiou a candidatura de Fernando Collor de Melo, lançada pelo Partido da Reconstrução Nacional (PRN), vitoriosa no segundo turno. Collor, que em 1982 havia sido eleito deputado federal por Alagoas na legenda do PDS e tinha votado em Maluf no Colégio Eleitoral em 1985, contou com a participação do partido em sua base de sustentação no Congresso e em contrapartida incluiu em seu ministério nomes como o de Jarbas Passarinho, ministro da Justiça. O interesse do governo na manutenção do apoio do PDS levou-o a participar ativamente da disputa interna pela vice-liderança do partido na Câmara. Com o apoio do governo Collor, o deputado José Lourenço derrotou o deputado Vítor Faccioni e foi um dos maiores defensores do presidente.

Nas eleições de 1990, o desempenho do PDS manteve-se fraco. O partido elegeu apenas um governador — Edmundo Pinto, no Acre, que foi assassinado em maio de 1992, sendo substituído pelo vice Romildo Magalhães —, dois senadores (6,1% do total) — Esperidião Amin, por Santa Catarina, e Lucídio Portela, pelo Piauí —, 44 deputados federais (8,7%) e 81 deputados estaduais (7,7%). Apesar do apoio que dava ao governo federal naquele momento, a proximidade não redundou em melhoria significativa nos resultados eleitorais.

Mesmo participando do governo, em 1992 o PDS não garantiu seus votos contra a abertura do processo de impeachment de Collor, em função de denúncias de corrupção. Em 23 de agosto, no programa de TV do partido em São Paulo, foi anunciada sua posição favorável ao impeachment. A maioria pedessista votou de fato contra Collor, e alguns desses votos ganharam destaque na mídia. O mais destacado foi o de Roberto Campos, que, com crise de diabetes, viajou em jatinho acompanhado de médicos e enfermeiras para, numa cadeira de rodas, votar contra o presidente no plenário da Câmara.

O PDS deu sinais de recuperação nas eleições municipais de 1992, quando duas prefeituras de capital foram conquistadas: a de Boa Vista, Roraima, com Maria Teresa Saenz Jucá, e a de São Paulo, onde Paulo Maluf interrompeu uma série de cinco derrotas eleitorais consecutivas e saiu vitorioso. Maluf tornou-se assim, novamente, uma liderança de peso na política nacional.

Meses após a vitória de Maluf, porém, o PDS concluiu negociações para fundir-se com o PDC. Consumada em abril de 1993, a fusão resultou no PPR, que passou a deter imediatamente a terceira maior bancada do Congresso, com 72 deputados e dez senadores, além de um governador e 865 prefeitos em todo o país.

Paulo Figueira

 

FONTES: KINZO, M. Radiografia; NICOLAU, J. Dados; NICOLAU, J. Multipartidarismo; MONTEIRO, B. & OLIVEIRA, C. Partidos.